Título: Chávez e Santos dão passo inicial para normalização
Autor: Moura , Marcos
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2010, Internacional, p. A13

Os presidentes da Colômbia e Venezuela se reúnem hoje para iniciar um processo de normalização das relações diplomáticas e econômicas. As negociações devem envolver o cumprimento de condições de ambos os lados. Analistas, porém, não acreditam na possibilidade de um anúncio hoje de retomada do comércio bilateral. A reunião está marcada para cidade colombiana de Santa Marta.

Desde julho de 2009, a Venezuela mantém um regime de forte restrição às importações de produtos colombianos. No último ano em que o comércio fluiu normalmente, em 2008, a Colômbia exportou US$ 6 bilhões para o vizinho. Este ano, a previsão é que fique em torno de US$ 1 bilhão.

A Venezuela vinha sendo o principal mercado de produtos de maior valor agregado da Colômbia. Em julho, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, aprofundou o afastamento ao anunciar a suspensão total das relações diplomáticas com o vizinho.

As duas medidas foram anunciadas por Caracas como reação a um polêmico acordo fechado pela Colômbia com os EUA para ampliar presença de tropas americanas no país e, depois, à uma acusação de Bogotá na Organização dos Estados Americanos (OEA) de que Chávez estava dando abrigo a guerrilheiros colombianos na região de fronteira. As disputas ocorreram durante o governo do ex-presidente colombiano Álvaro Uribe, antecessor de Santos, com quem Chávez mantinha uma relação conflituosa.

Antes de assumir a Presidência, no sábado, Santos já manifestara interesse em melhorar a relação com o vizinho. Embora não tenha ido à posse, Chávez se disse otimista com o novo presidente.

Parecia improvável a analistas que os dois anunciem hoje mesmo o restabelecimento dos laços diplomáticos e econômicos. Mas havia um consenso de que existe disposição para um novo impulso nas relações bilaterais. Para isso, no entanto, deverá haver alguns compromissos.

"Eu diria que eles chegarão à reunião não com condições, isso seria muito forte para esse estágio das conversações. Mas certamente apresentarão expectativas em relação ao que o outro deve fazer", afirmou Cláudia Dangond, diretora da Faculdade de Ciências Políticas e Relações Internacionais da Universidad Javeriana em Bogotá. No caso de Santos, a "expectativa" seria que Chávez não fizesse mais declarações públicas sobre questões internas da Colômbia - como ocorria sob o governo Uribe.

Santos quer, por exemplo, o fim das críticas públicas de Chávez às bases americanas na Colômbia.

No caso de Chávez, espera-se uma garantia de Santos de que não haverá ataques a eventuais acampamentos das Farc em território venezuelano. Em 2008, a Colômbia atacou um acampamento da guerrilha colombiana em território do Equador. A operação foi comandada por Santos, então ministro da Defesa da Colômbia. No domingo, Chávez fez críticas às Farc. Disse que não vê sentido em o grupo manter reféns e que ele deveria se comprometer com a paz.

Para a acadêmica venezuelana Natalia Brandler, coordenadora do programa de Ciência Política da Universidad Simón Bolívar, em Caracas, outra condição ou expectativa de Chávez é que Santos não o acuse em fóruns internacionais de estar acobertando guerrilheiros - como fez Uribe dias antes de deixar a Presidência. Internamente, Colômbia e Venezuela vêm sofrendo pressões para encerrar a crise: empresários colombianos (que apoiaram em peso a candidatura de Santos) querem de volta o mercado venezuelano; e, para Chávez, que enfrenta eleições legislativas em setembro, não haveria nenhuma vantagem em chegar à disputa com uma disputa em aberto com um parceiro tão importante como a Colômbia, diz Brandler.

A Venezuela tem procurado substituir importações que antes vinham da Colômbia. Alguns alimentos passaram a ser comprados do Brasil e da Argentina, mas a um custo maior e em quantidades que não suprem o fluxo que antes era enviado da Colômbia por estrada e em questão de horas.