Título: TV digital pública vai usar recursos parados no BNDES
Autor: Borges , André
Fonte: Valor Econômico, 06/08/2010, Empresas, p. B2

A digitalização da rede pública de TV do governo federal vai fazer uso de financiamentos do BNDES que, até agora, não atraíram as emissoras privadas. Nos próximos dias, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), estatal ligada à Secretaria de Comunicação da União, divulga o edital para compra da infraestrutura de TV digital do governo. O projeto, estimado em R$ 2,8 bilhões, tem apoio do BNDES, que poderá financiar até 70% das obras. A meta do governo é levar o sinal a todas as capitais e cidades com mais de 100 mil habitantes. Pelos cálculos da EBC, a rede atingirá 1.012 cidades, alcançando 63% da população.

A parceria público-privada (PPP), que tem prazo de 20 anos, fará uso de um pacote de incentivos criado pelo BNDES há três anos, mas que não deslanchou. O Programa de Apoio à Implementação do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (ProTVD) tem validade até 2013 e soma recursos de R$ 1 bilhão para financiar, a juro baixo, a transição das emissoras para a infraestrutura digital. O pacote pode até ser ampliado caso haja necessidade. Desde 2007, no entanto, o BNDES emprestou apenas R$ 40 milhões do ProTVD. Três emissoras tiveram seus financiamentos aprovados pelo banco: SBT (R$ 10 milhões), Fundação João Paulo II (R$ 10 milhões) e TV Integração (R$ 20 milhões).

"Esse projeto vai acelerar a TV digital no Brasil usando linhas de financiamento que não têm sido aproveitadas", diz José Roberto Garcez, diretor de serviços da EBC.

É com a participação do BNDES que o governo quer garantir a entrada de fabricantes nacionais, já que seu financiamento está atrelado a iniciativas de produção local. A rede pública de TV digital, que passou por duas audiências públicas, passou a ser encarada como um "eldorado" para os fabricantes brasileiros, diz Dante Conti, diretor executivo da Trans-tel, empresa de Campinas (SP) que monta antenas de transmissão. "As emissoras das grandes cidades já instalaram suas redes, mas no interior do país não está acontecendo quase nada", comenta.

Hoje há cerca de 120 antenas de transmissão digital - em operação ou em fase de instalação - em todo o país. Para se ter uma ideia, a meta do governo com suas TVs públicas é por para funcionar 256 torres de transmissão. Cada uma delas carrega, em média, quatro transmissores de sinal. Isso significa que serão comprado mais de mil transmissores.

Até hoje, a fabricante Telavo, vendeu 25 transmissores digitais, diz José Napoleão Corrêa, engenheiro de sistemas da empresa baseada em São Paulo. A STB, de Minas Gerais, despachou só oito equipamentos, enquanto a Linear, também mineira, vendeu 80 transmissores. "A demanda está muito baixa, estamos numa fase de ter que baratear mais o produto para tentar vender", diz Armando Lemes, diretor comercial da STB.

Apesar da fraca procura do setor privado, a realidade é que os fabricantes nacionais não têm estrutura para atender o governo. Multinacionais como a japonesa Marubeni e a sueca Ericsson acompanham de perto o projeto desde o ano passado. Fabricantes como Harris, Hitachi e NEC também estão entre os interessados. A tendência é que essas empresas disputem a licitação por meio de consórcios com fabricantes nacionais de equipamentos e empresas de construção civil. A Comsat, de Porto Alegre, selou um acordo com a italiana DB Electronics para montar transmissores. A mineira Linear está com a Marubeni. Recentemente, os italianos da Screen Service também montaram uma fábrica no país. Mais consórcios devem ser firmados nos próximos dias.

A rede digital de TV pública do governo engloba TV Brasil, TV Senado, TV Câmara e TV Justiça, além dos futuros Canal da Cidadania e Canal da Educação.

A despeito do projeto do governo, o mercado espera a reação do setor privado para a transição do sinal analógico para o digital. Só de repetidoras de sinal, há mais de 10 mil empresas no país que, até 2013, terão de ter suas estruturas preparadas para o sistema digital. Segundo a Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abert), o setor mobiliza cerca de 300 mil profissionais e soma custos anuais de R$ 4 bilhões.