Título: Violência pauta sucessão no Espírito Santo
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Fonte: Valor Econômico, 13/08/2010, Especial, p. A14
Uma charge publicada no dia 3 deste mês pelo jornal "A Gazeta", de Vitória (ES), mostrando uma dona de casa a corrigir, ante um assustado recenseador do IBGE, o número de moradores da sua casa, ao atender o telefone e ser informada que "mais dois" foram assassinados, causou irritação no governo capixaba. Mas a última pesquisa eleitoral realizada pelo Ibope no Estado mostra que o cartunista (Amarildo) reproduziu o sentimento de insegurança de grande parte da população. A segurança pública, com 24% das respostas, perde apenas para a saúde (30%) como o problema que mais preocupa a população do Estado. É também o segmento com pior avaliação no atual governo (49% consideraram ruim e péssimo e 31%, regular).
"Ele (o cartunista) está brincando com coisa séria", disse contrariado o secretário de Segurança Pública do Estado, André de Albuquerque Garcia, embora admita que as estatísticas de homicídios no Estado, ainda que decrescentes nos últimos três meses, não são favoráveis. Desde 2006 o número absoluto de assassinatos cresce sem parar, saltando de 1,704 mil em 2005 para 2,034 mil no ano passado.
Em 2009, o Espírito Santo, um dos Estados do país que mais cresceram economicamente na primeira década deste século, ostentou a nada lisonjeira taxa de 58 homicídios por cem mil habitantes, inferior apenas à de 63,4 por cem mil de Alagoas, segundo dados apresentados ao Valor pelo secretário Garcia. Em 2007, segundo os mesmos dados, a taxa do Espírito Santo era de 54,1 homicídios por cem mil habitantes. O problema é tema central das campanhas dos dois candidatos mais cotados para suceder o governador Paulo Hartung (PMDB), o governista Renato Casagrande (PSB), favorito nas pesquisas, e o tucano Luiz Paulo Vellozo Lucas.
Casagrande propõe uma nova política de segurança pública com ênfase no "aperfeiçoamento institucional e gerencial", redefinindo as funções das secretarias de Justiça e de Segurança Pública. "É uma ação que o Estado tem que fazer diretamente, com o governador à frente", disse ao Valor. O candidato propõe um regime de colaboração entre os governos federal, estadual e municipal e a criação do Conselho Estadual de Segurança Pública além de um novo plano de segurança pública denominado Pacto pela Vida. Segundo analistas, sua postura crítica, ainda que reconhecendo avanços, especialmente quanto a investimentos feitos, tem causado irritação no Palácio Anchieta, sede do governo estadual.
Hartung patrocinou a candidatura de Casagrande, convencendo o vice-governador Ricardo Ferraço (PMDB) a optar pela disputa de uma cadeira no Senado. Tem 51% das intenções de voto, segundo a pesquisa estimulada do Ibope. Do outro lado, com apenas 18% na pesquisa realizada no fim de julho, Vellozo Lucas, que também cresceu politicamente sob a influência do governador, bate com mais força no papel de candidato oposicionista, mesmo reverenciando a origem: "No Espírito Santo quase tudo melhorou nos últimos oito anos. Só a segurança pública piorou."
O candidato do PSDB afirma, sem os cuidados do adversário, que Hartung "não chamou a si o problema da segurança, como fez com a economia" e promete "assumir pessoalmente a integração das instituições das áreas de segurança, justiça e municípios". Promete ainda "dobrar o contingente de policiamento ostensivo (Polícia Militar e Guarda Municipal)" e também "criar penas alternativas para agilizar os processos e e não misturar presos de pequenos delitos com criminosos de alta periculosidade". Vellozo Lucas diz que criará juizados especiais para julgar os casos mais leves em 72 horas.
O secretário Garcia, que era subsecretário e ascendeu em abril, quando o ex-secretário Rodney Miranda desincompatibilizou-se para disputar uma cadeira na Assembleia Legislativa do Estado, afirma que "o problema de segurança pública é uma questão por excelência em todos os locais" e que "o Espírito Santo não foge à regra". Ele defendeu a criação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), nos moldes do SUS da saúde e disse esperar que o debate político sobre o tema "não fique navegando na superfície como acontece em geral na abordagem dos candidatos".
Para Garcia, a tendência dos debates políticos é de "circunscrever (o tema) apenas à questão policial", mesmo sabendo que a polícia é importante, mas não é tudo. Sobre as estatísticas, o secretário não contestou os números nacionais, mas disse que há diferença de metodologias que às vezes mascaram os números. "O Espírito Santo paga o preço da transparência e da idoneidade dos seus números", afirmou.
O governador Hartung considera "bobagem" dizer que ele não tomou para si o problema da segurança pública no Estado. "O governo trabalha em todas as áreas, e com muito método", disse. Para ele, o tema "é tratado com muita superficialidade no Brasil", sendo "assunto que tem muitos sócios, muitos atores". E acrescentou: "Não depende só de nós, é preciso que se olhe o todo, senão de tempo em tempo se escolhe um boi de piranha e joga (no rio)", arrematou.