Título: Lei nos EUA busca evitar o uso de 'minerais de conflito' do Congo
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Fonte: Valor Econômico, 19/08/2010, Internacional, p. A15

Fabricantes de celulares e de eletrônicos pelo mundo podem estar alimentando uma guerra e irrigando com recursos uma rede de corrupção na República Democrática do Congo. Rico em minérios usados pelo setor, o país se tornou no mês passado o principal alvo de uma lei aprovada sem muita divulgação nos EUA que forçará as empresas a divulgar se suas matérias-primas saíram de minas congolesas. O objetivo é barrar o uso de minerais vindos de zonas de conflito.

A medida foi muito elogiada por organizações de direitos humanos que organizaram campanhas contra os "minerais de conflito" do Congo. Mas enfrenta a resistência de empresas, que dizem que será muito caro rastrear a origem dos minérios e se eles têm ligação com conflitos e que isso poderá reduzir o interesse das companhias em comprar minérios da região. Em última análise, a medida pode elevar preços de eletrônicos.

A República Democrática do Congo (antigo Zaire) é palco de um das guerras mais sangrentas da África. Mais de 3 milhões de pessoas morreram nos conflitos entre 1998 e 2007. Muitos grupos rebeldes ainda atuam em zonas ricas em minérios no leste do país, e a venda de minérios serve muitas vezes para enriquecer e armar esses grupos e financiar conflitos que ainda persistem na área.

Segundo o jornal britânico "Financial Times", milhares de empresas serão afetadas. A emenda Dodd-Frank não proíbe as empresas de usarem os minerais de conflito, mas as obriga a rastrear e divulgar suas cadeias de fornecimento, sob pena de multa. Ela poderá abrir caminho para sanções mais duras. A medida afeta não só empresas com sede nos EUA, mas qualquer uma que atue no mercado americano ou que tenha ações listadas em bolsas no país.

O jornal britânico lembra que a região do Congo é uma das principais fontes de metais e minerais importantes para a indústria eletrônica, como tântalo, cobre, ouro, magnésio e cobalto. Esses e outros minerais, como a columbita-tantalita e cassiterita, estão na lista. O tântalo, por exemplo, é empregado em componentes eletrônicos, como os condensadores - que estão presentes em celulares, computadores e até em automóveis.

A restrição aos minerais do conflito foi aprovada na forma de uma emenda incluída no pacote de reforma do setor financeiro dos EUA. O pacote teve aprovação final no Senado dos EUA em 15 de julho. A comissão de valores mobiliários dos EUA (a SEC) tem nove meses para regulamentar a medida e detalhar de que forma as empresas deverão dizer se seus minerais vieram ou não do Congo. A expectativa é que só no início de 2012 as regras entrem em vigor. Entidades do setor industrial americano fazem lobby na SEC para que as regras não sejam muito duras.

Para a ONG americana Enough Project, o "mundo ficou mais perto de garantir que cadeias de suprimento de nossos laptops e celulares não financiam a violência no leste do Congo".

"Ninguém quer prover fundos para minas pertencentes a pessoas que estão matando pessoas", diz Chuck Mulloy, porta-voz da Intel. Mas, acrescenta: "Neste momento não podemos dizer que não usamos materiais de conflitos" e "ninguém do setor pode". (Com Financial Times)