Título: Lula celebra Dilma em evento oficial
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 14/07/2010, Política, p. 2

No lançamento do edital de licitação do Trem de Alta Velocidade entre Rio de Janeiro e São Paulo, presidente credita a obra à candidata petista ao Palácio do Planalto

Depois de seis multas por fazer propaganda eleitoral irregular em favor da petista Dilma Rousseff, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cometeu ontem novo deslize, e em pleno horário de trabalho. Em solenidade oficial da Presidência da República, creditou a construção do Trem de Alta Velocidade (TAV) que ligará o Rio de Janeiro a São Paulo à candidata. Na plateia, além de integrantes do governo, estavam presentes empresários do setor da construção e embaixadores de países interessados em explorar a concessão, que será iniciada a partir do fim deste ano.

¿Não posso deixar de dizer aqui que devemos o sucesso disso tudo que a gente está comemorando a uma mulher. Na verdade, eu nem poderia falar o nome dela, que pode ter processo eleitoral, mas a história a gente também não pode esconder por causa da eleição. A verdade é que a companheira Dilma Rousseff assumiu a responsabilidade de fazer esse TAV. E foi ela que brigou, junto com a Miriam Belchior (coordenadora do PAC), junto com a Erenice (Guerra, atual ministra da Casa Civil)¿, declarou.

O próprio presidente justificou a propaganda aberta em favor da candidata ao afirmar que não poderá esquecer os feitos de outros integrantes do governo, caso venham a concorrer a cargos eletivos. ¿Daqui a pouco, se o (ministro do Planejamento) Paulo Bernardo for candidato, eu não vou deixar de falar que ele fez uma coisa boa, que liberou uma medida provisória agora para resolver o problema do Nordeste brasileiro. Não podemos negar isso¿, afirmou.

Pesquisas As declarações foram feitas em discurso, poucas horas após Lula reiterar ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), sua disposição em fazer campanha para Dilma apenas fora do horário do seu expediente de trabalho na Presidência da República, sem ferir a legislação eleitoral. Lula, inclusive, já conversou com Dilma a respeito na última segunda-feira (leia ao lado). De acordo com Sarney, Lula afirmou, em conversa fechada, acreditar na vitória da candidata à corrida ao Palácio do Planalto, logo no primeiro turno.

O peemedebista disse que Lula tem ¿lido¿ os resultados das pesquisas de forma otimista, o que o faz acreditar na vitória de Dilma sobre o candidato José Serra (PSDB) sem a necessidade do segundo turno. ¿O alcance dos números que a ministra Dilma tem nesse momento assegura que ela está fazendo uma campanha ascendente, está na frente do seu concorrente. O presidente está bastante animado com os resultados das pesquisas sobre a ministra Dilma, crê que sua eleição se dá no primeiro turno¿, disse Sarney.

Integrante do diretório nacional do PMDB e aliado nacional do PT, Sarney disse que vai acompanhar atos de campanha de Dilma, como a inauguração do seu comitê central em Brasília, que ocorreu ontem. ¿Como membro e militante, eu tenho que ir¿, pontuou. O presidente da Câmara e candidato a vice na chapa petista, deputado Michel Temer (PMDB-SP), também está otimista: ¿Sabemos que não será fácil, mas onde há otimismo, eu também estou otimista¿, disse Temer, que ontem participou da inauguração do comitê de campanha que dividirá com Dilma.

O QUE É PROIBIDO » O artigo 73 da Lei Eleitoral, que trata das condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais, não é claro quanto aos limites de atuação de um agente. A lei, porém, estabelece a proibição de atos que afetem a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos. Para o Ministério Público, a campanha feita por um detentor de cargo eletivo no horário de expediente pode ser configurada como abuso de poder político, com potencial para desequilibrar eleições.

O número 17 de agosto Data de início da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão

Comitê inaugurado

Tiago Pariz Alana Rizzo Luísa Medeiros

A candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, inaugurou o comitê central da campanha, no Setor Comercial Sul, em um comício relâmpago recheado de políticos de peso de sua aliança e com poucos militantes, que esperaram mais de uma hora para o início do evento. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva preferiu não participar do ato e deixar para um ato grandioso sua estreia em comício ao lado de sua pupila.

O evento acabou marcado pela desorganização. Antes do início dos discursos, dois seguranças faziam o filtro de quem poderia entrar no comitê. Um dos ¿critérios¿ era ser conhecido da organização. O tumulto na porta dificultou a passagem de petistas e de aliados. O candidato a distrital Edivaldo Freitas (PMDB) tentou entrar e acabou barrado pelos seguranças. Segundo ele, um dos homens agarrou o pescoço dele no momento que tentava passar pelo afunilado corredor que dava acesso à porta principal do comitê, que é de vidro. Em seguida, o segurança teria jogado Edivaldo contra a porta, que ficou rachada. ¿Levei uma gravata do segurança só porque não estou vestindo gravata. Eu sou rodoviário, não uso gravata. Isso é uma palhaçada que a Dilma tá fazendo com a gente. Me barraram e nem perguntaram quem eu era. Não tenho mais candidato a presidente. Estou decepcionado com a Dilma¿, esbravejou o candidato.

Com a entrada um pouco mais controlada, o ato teve início com discursos do presidente do PT, José Eduardo Dutra, e do candidato a vice, deputado Michel Temer (PMDB-SP). Todos bastante comedidos nas palavras. Coube a Dilma usar a palavra por mais tempo. Sua fala durou exatos 15 minutos e serviu para convocar a militância a se engajar na campanha.

O ato serviu para mostrar o peso político da candidatura. No palanque, desfilaram o presidente do Senado, José Sarney (PMDB), lideranças de todas as legendas que dão apoio formal e informal, além de ministros e dirigentes partidários. ¿Estamos inaugurando a casa onde vamos organizar todos os partidos da coligação¿, afirmou Dilma em cima do palanque, que depois reuniu-se com parlamentares em jantar promovido por Temer na casa do deputado Eunício Oliveira (PMDB-CE). Ao final do encontro, o presidente do PT, José Eduardo Dutra, anunciou que a primeira aparição pública de Lula ao lado de Dilma na campanha será na sexta-feira em uma caminhada da Praça da Sé até a Candelária, em São Paulo.

Antes da inauguração do comitê, o candidato a governador do Distrito Federal pelo PT, Agnelo Queiroz, realizou uma caminhada com os militantes que deram quórum ao comício.

De olho nos comícios

Denise Rothenburg

A ausência do presidente Lula na inauguração do comitê de campanha de Dilma em Brasília foi combinada com a própria candidata na segunda-feira, quando os dois conversaram para acertar como deve ser a participação do presidente nos comícios. Apesar das pressões de alguns integrantes do PT para que ele não faltasse ao evento ¿ em especial, os candidatos do Distrito Federal, que queriam imagens ao lado do presidente ¿, Lula considerou que a festa de ontem era mais voltada aos militantes petistas e aos aliados. E não propriamente à população, onde a presença de Lula terá mais efeito em termos de conquista de votos.

Junto aos militantes, a ordem é deixar que Dilma brilhe sozinha ao lado do candidato a vice, Michel Temer (PMDB-SP), e outros petistas e aliados candidatos. Afinal, nessas festas partidárias voltadas para o público interno e políticos, avaliam muitos, não há riscos de dar algo errado, ou de as pessoas não comparecerem para prestigiar a candidata como o nome do PT à Presidência da República. A estratégia serve ainda como uma forma de contrapor a imagem de ventríloquo, que os tucanos tentam imputar à ex-ministra, como se ela não conseguisse dar um passo sem Lula do lado. O próprio Serra em algumas oportunidades já se referiu à petista como um boneco ventríloquo sem ideias próprias.

Triângulo dos votos Na hora de colocar Dilma cara a cara com o povo, será diferente. O PT não deixará de tentar, junto ao eleitor de todas as classes, em especial C, D e E , de tentar transferir ainda mais votos para Dilma. No encontro de segunda-feira, Lula combinou com a candidata que irá participar especialmente de eventos em grandes colégios eleitorais, como Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A menção desses estados como territórios marcados para uma agenda onde os dois estarão lado a lado, não é aleatória. São Paulo, Minas e Rio, nesta ordem, formam o que os políticos chamam de ¿triângulo dos votos¿, onde um candidato a presidente que se preze tem a obrigação de sair bem.

Desses quatro, José Serra, do PSDB, tem a vantagem no Rio Grande do Sul e em São Paulo. Na Região Sul como um todo, as últimas pesquisas apresentaram Serra com praticamente metade do eleitorado. Em São Paulo, os tucanos esperam uma vantagem de seis milhões de votos sobre o PT de Dilma. No Rio de Janeiro, Serra tem agora, o vice, Índio da Costa, o que pode, na avaliação de alguns petistas, despertar a atenção do carioca para a campanha tucana. Em Minas Gerais, Serra tem o ex-governador Aécio Neves, do PSDB, que essa semana ciceroneou o presidenciável em uma caminhada em Belo Horizonte.

É para reduzir essas vantagens de Serra que o PT pretende trabalhar mais a presença de Lula ao lado de Dilma. Os petistas avaliam que, no caso de Minas Gerais, por exemplo, o único nome capaz de bater o prestígio de Aécio é o do próprio Lula.