Título: Nascimento apela ao interior para reverter desvantagem
Autor: Máximo , Luciano
Fonte: Valor Econômico, 27/08/2010, Especial, p. A12

À sombra dos cinquentenários oitizeiros da Avenida Getúlio Vargas, uma das vias mais movimentadas da região central de Manaus, a ausência de militantes com bandeiras ou distribuindo santinhos chama a atenção. A polarização na disputa ao governo do Amazonas entre o atual governador Omar Aziz (PMN) e o senador Alfredo Nascimento (PR) transferiu a movimentação política da capital para o interior do Estado nos primeiros 50 dias de campanha.

Pouco mais de 45% dos 2 milhões de eleitores amazonenses estão no interior. Apesar dos 200 mil votos a mais na capital, os dois principais candidatos estão convencidos que precisam fortalecer a imagem nos rincões do Estado e reforçar os apoios políticos. Atualmente, as duas principais chapas intensificam a agenda no interior para minimizar problemas com os chamados "prefeitos rebeldes", que fazem campanha para adversários de seus próprios grupos políticos.

Pesquisa de intenção de voto divulgada nesta semana pela consultoria local Perspectiva traz Aziz com 49% contra 34,1% de Nascimento. Os outros candidatos somam 4,2%. Fora de Manaus, o candidato do PMN perde terreno e empata: 42,7% ante 41%. "O interior é muito volúvel em termos eleitorais, depende muito de lideranças locais, de portas de entrada", afirma o candidato Alfredo Nascimento, da coligação "O Amazonas melhor para todos" (PR, PSB, PT, PDT, PSL, PSDC e PTdoB).

Em meio a traições de aliados - como o caso da colega de partido Eliete Cunha, prefeita de Santa Izabel do Rio Negro, que vai apoiar Omar Aziz -, Nascimento busca outros canais para ganhar votos fora da capital, geralmente pessoas com alguma influência nas comunidades. No município de Iranduba, a 30 km de Manaus, o empresário Ednor Pacheco, filiado ao PCdoB, apoia Nascimento para o governo e José Serra para a Presidência. "Não podemos só depender do partido para tomar decisão", raciocina. "Quando os prefeitos deixam os candidatos majoritários na mão, é normal eles recorrerem a ONGs, líderes religiosos, empresários e até adversários políticos. É uma bagunça", explica Aloysio Nogueira, professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

O PR avalia que as eleições serão decididas no interior, assim como vem acontecendo desde 1982. Mas as estatísticas mostram que Nascimento corre risco se descuidar da capital. Pesquisa o coloca bem atrás de Aziz em Manaus: 53% contra 29%. O trunfo do senador para mudar o quadro será associar cada vez mais seu nome ao do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O candidato também vai destacar o asfaltamento de "metade da BR-319", que liga Manaus a Porto Velho, a construção de portos, os projetos sociais implementados na capital quando era prefeito, além de reclamar para si a responsabilidade de ter vencido Belém na disputa para sediar jogos da Copa do Mundo de 2014: "Um ministro de Estado tem mais força que um governador. Se eu não tivesse entrado na briga, Belém estaria se preparando para a Copa agora."

Raramente visto em Manaus desde o início da campanha, o governador Omar Aziz navega nos rios do Amazonas e também na popularidade de Eduardo Braga (PMDB), que, após dois mandatos, deixou o governo em suas mãos para concorrer ao Senado - ele deverá ser, proporcionalmente, o político mais bem votado do país: atualmente tem mais de 85% das intenções de voto: "O homem do interior valoriza mais o olho no olho. Na capital, aos eleitores basta o horário gratuito na TV e no rádio para conhecer as propostas dos candidatos."

A construção de uma ponte de 3,5 km sobre o rio Negro, entre Manaus e Iranduba que facilita o acesso ao sul do Estado, simboliza o debate sobre a interiorização do desenvolvimento. Mesmo inacabada e com a inauguração atrasada em mais de seis meses, trata-se de uma das principais bandeiras da campanha de Aziz. A maioria da população e as candidaturas rivais são favoráveis, mas o governador não será poupado de questionamentos sobre a demora na inauguração e o aumento do custo da obra, cujo valor passou de R$ 506 milhões para R$ 811 milhões, em razão de mudanças nas técnicas de construção. O candidato ao Senado pelo PSDB, Arthur Virgílio, critica o financiamento do projeto. "São 70% de recursos do BNDES, é um alto custo que prejudica a capacidade de endividamento do Estado."

Aziz está confortavelmente acomodado na máquina do governo, tem apoio de empresários, da mídia local e de boa parte da população, satisfeitos com o governo de Braga. Conta também com amplo leque de alianças na chapa "Avança Amazonas" (PMN, PMDB, PCdoB, PP, PTB, PSC, PRTB, PHS, DEM, PTN, PTC, PRP e PRB). Com o discurso da continuidade, o candidato dividirá com o principal rival o palanque da presidenciável petista Dilma Rousseff. Além do governador e da dupla de senadores, a ambição da coligação é eleger até seis dos oito deputados federais que representam o Amazonas.

Nascimento já sofreu uma derrota para o grupo de Braga. Em 2006, quando era ministro dos Transportes, ele foi convencido por Lula a não disputar o governo com Braga e ainda apoiou Aziz, que foi seu vice-prefeito entre 1996 e 2004, na eleição municipal de 2008. A contrapartida seria o apoio de Braga e Aziz na corrida estadual deste ano, mas Nascimento ficou na mão. "Nosso grupo ficou muito grande, era impossível não chamar o meu vice-governador para continuar o nosso projeto de Amazonas", justifica Braga.

Além de colar em Lula, Nascimento tem optado por preservar Braga e centrar as críticas diretamente em Aziz, mas sempre com um discurso de continuidade. "Não sou louco de parar o Prosamin", ilustra o senador, em referência ao Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus, uma das vedetes do governo Braga. O programa transformou regiões de favelas de palafitas em áreas urbanizadas, com saneamento e construção de 30 mil moradias populares.

O vendedor Samuel Costa saiu de um barraco suspenso sobre um igarapé para uma nova casa perto do centro. "A vida era muito difícil, criávamos gatos para evitar que os ratos tomassem conta da casa", lembra. Ele prefere não declarar seu voto, mas os cartazes com os rostos de Braga e Aziz espalhados pelo bairro denunciam a preferência dos moradores. "Voto eu não comento, mas aqui é todo mundo Eduardo", diz Samuel, com um sorriso maroto no rosto.

A poucos quilômetros dali, no Igarapé de São Vicente, perto do porto central de Manaus, Keila Magalhães Resende, de 33 anos, reclama das condições de vida. Desempregada e com cinco filhos, ela conta que a maior dificuldade de viver nas palafitas suspensas sobre o rio é quando chove. "É um corre-corre, fica um cheiro muito forte de lixo e a água sobe muito. Temos que fazer maromba para subir as coisas e proteger as crianças, se não perdemos tudo e elas ficam doentes", relata.

Keila conta os dias para o Prosamin chegar a sua comunidade. "Fizeram um mapeamento e colaram esse selo na parede tem três meses. Dizem que é um número que reserva uma casa do programa de urbanização, mas até agora nada." Ela diz que vai votar pela continuidade. "O Prosamin não chegou, mas teve um empurrão. Agora estamos esperando o Omar fazer a parte dele." (LM)