Título: Gasto com pessoal perto de R$ 200 bi
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 02/09/2010, Brasil, p. A2
A proposta orçamentária para 2011, encaminhada terça-feira pelo governo ao Congresso Nacional, apresenta um número impressionante. As despesas da União com pessoal e encargos sociais no próximo ano foi estimada em R$ 199,6 bilhões, se for computada a contribuição patronal da União para o Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos Federais (RPPS). Sem essa contribuição, os gastos caem para R$ 184,4 bilhões.
Esses gastos se referem ao pessoal civil ativo e inativo, pensionistas e militares, representando um aumento de 11,1% em relação à projeção atual dessas despesas para o exercício de 2010. A mensagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que acompanha a proposta orçamentária, diz, textualmente, que "o total que se projeta para a despesa de pessoal da União equivale a 36,56% da receita corrente líquida prevista para 2011".
A administração pública federal tem por hábito comparar o gasto com pessoal e o Produto Interno Bruto (PIB). Se isso for feito, como mostra a tabela abaixo, nota-se que essa despesa, tanto com ou sem a contribuição patronal ao RPPS, ficou em torno de 5% do PIB. Com base nisso, os administradores divulgam que não houve aumento da despesa com pessoal. Argumento que também é utilizado pelos numerosos e influentes sindicatos de servidores públicos.
Quem faz esse tipo de exercício esquece-se que somente as despesas da União com a saúde podem ser corrigidas, por determinação constitucional, pela variação nominal do PIB. Nenhuma outra despesa conta com esse benefício. Além do mais, esse tipo de exercício dá uma falsa impressão de que o gasto não aumentou. No caso da despesa com pessoal, ela aumentou e muito nos últimos anos.
Em 2002, as despesas da União com pessoal e encargos sociais ficaram em R$ 75 bilhões, com a contribuição patronal, ou em R$ 72,9 bilhões, sem a contribuição. Em 2009, os gastos foram de R$ 167,1 bilhões com a contribuição e de R$ 155,8 bilhões sem a contribuição, de acordo com a Secretaria de Orçamento Federal (SOF), do Ministério do Planejamento. No período de 2002 a 2009, houve um aumento nominal de 122,8% nas despesas com pessoal (com a contribuição patronal) ou de 113,7% (sem a contribuição).
De 2003 a 2009, a inflação medida pelo IPCA foi de 47,94%. Isto significa que houve uma elevação real dos gastos com pessoal (com contribuição) de 50,6% ou de 44,5% (sem a contribuição). Poucas despesas terão aumentado tanto, em termos reais, durante o governo Lula, quanto os gastos com pessoal. Dizer que essa despesa não cresceu pois se manteve na mesma proporção do PIB não expressa a realidade dos números, embora possa fazer sentido aos técnicos quando discutem os valores globais do Orçamento da União.
A razão para este gasto não ter aumentado em proporção ao PIB foi porque a economia brasileira cresceu bastante no governo Lula. A variação nominal acumulada do PIB entre 2003 e 2009 foi de 112,68%. Em termos reais, o PIB cresceu 27,67% no período considerado.
É bem verdade que o aumento real da despesa com pessoal não decorreu apenas dos generosos reajustes salariais concedidos pelo governo. A mensagem do presidente Lula informa que no período de 2003 a 2009, foram autorizadas 176.120 vagas para preenchimento por concurso público, que se reverteram no ingresso de 118.933 novos servidores, resultando em um aumento efetivo da força de trabalho de 67.152 indivíduos.
Só nos dois primeiros meses de 2010 ingressaram no serviço público 7.796 novos servidores. O presidente Lula informa ainda que em 2011 prosseguirá "o esforço para substituição integral do quadro de terceirizados irregulares, bem como a política de fortalecimento e de redefinição qualitativa do perfil do quadro de pessoal, além da expansão da capacidade dos órgãos e das entidades de setores estratégicos nas diversas áreas de atuação da administração pública federal". Nesse sentido, para 2011 está previsto o provimento de 21.988 cargos, sendo que, desse total, 12.651 serão alocados para substituição de terceirizados.
Todo esse aumento do número de servidores e da despesa com o pagamento de salários, aposentadorias e pensões não resultou em melhoria significativa dos serviços públicos oferecidos aos cidadãos, nas áreas de educação, segurança e saúde.
O contribuinte não é bem informado, portanto, quando se diz que o gasto com pessoal do governo federal está estável. É indispensável que, no futuro, a discussão sobre este tema seja feita em termos de aumento real da despesa com pessoal e que os sindicalistas parem de perseguir o crescimento do PIB.