Título: Dilma já tem embrião de núcleo político
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Fonte: Valor Econômico, 09/09/2010, Especial, p. A14

Assim como seu mentor, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, já tem o seu núcleo político. Ele é integrado pelo presidente do PT, José Eduardo Dutra, pelo ex-ministro Antonio Palocci e pelo deputado José Eduardo Cardozo. Os três abriram mão de disputar cargos eletivos para se dedicar exclusivamente à campanha de Dilma. Se ela vencer a disputa, serão nomes fortes do governo a partir de janeiro.

Fora da campanha, além do presidente Lula, o principal interlocutor de Dilma é o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins. Cotado para continuar em caso de vitória da petista, Martins tem jurado a seus amigos que não ficará no cargo. Seu nome vem sendo cogitado para a Pasta das Comunicações, que crescerá de importância na gestão Dilma, com o Projeto Nacional de Banda Larga e o renascimento da Telebrás. A intenção do ministro, no entanto, é sair, mas, antes, sugerir pelo menos três nomes a Dilma nessa área.

O núcleo político da candidata reúne-se periodicamente em Brasília, no Palácio da Alvorada, em encontros comandados pelo presidente Lula. Na quarta-feira da semana passada, de forma discreta, Lula, Dilma, Dutra, Palocci e Cardozo tomaram café da manhã para tratar do andamento da campanha, especialmente da crise provocada pela quebra do sigilo fiscal da filha do candidato da oposição à Presidência, José Serra (PSDB).

Além de atuar nos bastidores da campanha, o presidente Lula terá um papel importante nos primeiros seis meses de uma possível gestão Dilma. "Nesse período, Dilma vai falar pelo menos uma vez por semana com o Lula", assegura um aliado da candidata.

Dos integrantes do núcleo da campanha de Dilma, apenas um não deverá ser ministro - José Eduardo Dutra. Embora tenha aumentado seu prestígio junto à candidata nos últimos meses, Dutra deve permanecer na presidência do PT. "Alguém precisa cuidar "do" lojinha", brinca um conselheiro da candidata.

Originária do PDT de Leonel Brizola, tendo se filiado ao PT há apenas dez anos, Dilma não tem ligação com as correntes que dominam a legenda. Mesmo aclamada hoje pelos militantes do partido, seu nome foi imposto por Lula. Por essa razão, explica um integrante da campanha, existe a necessidade de ela ter um nome de sua confiança para controlar o PT.

Antonio Palocci, que no passado teve embates com Dilma, é hoje seu principal operador político. É o interlocutor da candidata junto a representantes do sistema financeiro e do empresariado. Discreto, tem conversado também com empresas de comunicação e dialogado com os chefes políticos de todos os partidos. Quem o aproximou de Dilma para a campanha foi o presidente Lula.

No ano passado, quando já tinha claro que a então ministra da Casa Civil seria sua candidata, Lula chamou Palocci para uma conversa em Brasília. No encontro, propôs que ele se lançasse à presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). A ideia era aproveitar o desgaste do atual presidente da instituição, o colombiano Luis Alberto Moreno, com o governo Barack Obama, para emplacar um brasileiro. Palocci declinou da oferta. Lula pediu, então, que ele se engajasse na campanha de Dilma.

A participação foi selada numa conversa demorada entre Lula, Dilma e Palocci. Desde então, a candidata e o ex-ministro da Fazenda ficaram muito próximos. "Palocci é jeitoso e hábil. Dilma o tem hoje em alta conta", conta um amigo dos dois. Curiosamente, foi Palocci quem, em 2002, ao chefiar a equipe de transição de governo, sugeriu o nome de Dilma para a primeira equipe ministerial de Lula.

Palocci ficara impressionado, durante aquela campanha, com a desenvoltura de Dilma durante um debate sobre o setor elétrico em evento promovido pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). No primeiro momento, Lula não chegou a se entusiasmar com a indicação de Palocci, mas, depois de se reunir a sós com Dilma, teve certeza de que deveria ser ela a ministra de Minas e Energia.

Se Dilma for eleita, Palocci deverá ser seu ministro da Casa Civil, mas tudo vai depender do perfil que a Pasta tiver. A tendência é que ela opte por uma Casa Civil mais voltada para a articulação política, uma área com a qual tem pouco intimidade. Neste caso, Palocci reúne os pré-requisitos - é do PT, tem trânsito na oposição e já vem atuando como operador de Dilma. Se optar por uma Casa Civil no molde atual, ou seja, com perfil de coordenação das ações administrativas, a candidata deve manter a ministra Erenice Guerra no posto.

Nos últimos dias, surgiram especulações dando conta de que Palocci iria para o Ministério da Saúde numa possível gestão Dilma. Os rumores são atribuídos a desafetos do ex-ministro no seu partido e mesmo na campanha. A ideia faria sentido se Palocci desejasse, como fez Serra no governo Fernando Henrique Cardoso, usar essa plataforma para voltar à disputa político-eleitoral em 2014 - a ambição seria o governo de São Paulo -, mas ele não quer.

O deputado José Eduardo Cardozo aproximou-se da candidata apenas durante a campanha, mas já conquistou seu espaço. Procurador do município de São Paulo, Cardozo pode ir, num governo Dilma, tanto para o Supremo Tribunal Federal (STF), na vaga deixada por Eros Grau, quanto para o Ministério da Justiça. A opção do Supremo lhe cairia bem caso ele estivesse cansado da política, como chegou a anunciar em março, mas um aliado garante: "Isso não existe. O Cardozo nunca esteve tão engajado na política quanto agora". Sendo assim, ele deve mesmo ir para a Pasta da Justiça.

Ex-prefeito de Belo Horizonte e candidato ao Senado por Minas Gerais, Fernando Pimentel é, além de Dutra, Palocci e Cardozo, um nome dado como certo num possível ministério Dilma. É verdade que Pimentel, asseguram dois expoentes da campanha, já teve mais prestígio junto à candidata, de quem é amigo há 40 anos. O ex-prefeito afastou-se para cuidar de sua campanha, mas não foi isso que o desgastou.

A candidata não teria apreciado o comportamento recente de Pimentel. "Ele passava a ideia de que era o "dono" da Dilma e isso a irritou", conta um conselheiro da ministra. O ex-prefeito teria perdido pontos também por causa das fissuras abertas em Minas com o PT e o PMDB. Teria pesado negativamente também a sua associação com um dos próceres da oposição, o ex-governador Aécio Neves (PSDB). "Pimentel é muito amigo da Dilma, mas nunca foi seu operador político", observou uma fonte. "Eleito ou não para o Senado, ele deve ser ministro, mas não da Casa Civil", assegurou um amigo da candidata.

Num modelo ainda preliminar de ministério - a candidata não gosta de falar do tema para evitar o clima de "já-ganhou" predominante em sua campanha -, Dilma deve promover Miriam Belchior, atual coordenadora-geral do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), para o comando do Ministério do Planejamento. Há quase seis anos no cargo, o atual ministro - Paulo Bernardo - deixará a Pasta, mas assumirá outro cargo importante no primeiro escalão.

Se eleita, Dilma pretende ter maior presença feminina em sua equipe. Sua grande amiga - Maria das Graças Foster, diretora de Gás e Energia da Petrobras - deve ser ministra, embora ainda não se saiba de qual Pasta. Isabela Teixeira, ministra do Meio Ambiente, é cotada para permanecer onde está.

Outro nome cogitado para uma possível gestão Dilma é o do senador Aloizio Mercadante (PT). Se perder a disputa para o governo paulista, ele poderá ir, por exemplo, para o Ministério da Ciência e Tecnologia. Para o Banco Central (BC), a tendência é nomear um funcionário da Casa - possivelmente, Alexandre Tombini, hoje diretor de Normas -, caso o atual presidente, Henrique Meirelles, não queira permanecer na função.

Para o Ministério da Fazenda, o sonho da candidata do PT é o presidente do BNDES, Luciano Coutinho. A eleição ainda nem ocorreu e esse tema já é considerado delicado por participantes da campanha. Ao ver especulações em torno de seu emprego, Guido Mantega, atual ocupante do cargo, começou a trabalhar para ficar. O primeiro movimento nessa direção foi ordenar a seus assessores que espalhassem a informação de que ele não pretende deixar o ministério.

A estratégia pode funcionar. Um ministro muito próximo de Dilma diz que, se Mantega quiser ficar, ela se sentirá constrangida em substitui-lo. Outra hipótese é Lula pedir a ela que o mantenha. "Um pedido do Lula terá muito peso", admitiu um interlocutor da candidata. Dilma considera, no entanto, que Coutinho, que foi seu professor na Unicamp, tem o perfil mais adequado para enfrentar os principais desafios da economia brasileira nos próximos anos.

Pelo menos um grupo tradicional do PT - o dos sindicalistas ligados ao setor bancário - terá menos influência numa gestão Dilma. Esse grupo, a quem se atribui desgaste por causa de atividades suspeitas, como a fabricação de dossiês para desestabilizar adversários dentro e fora do governo, já vinha perdendo força dentro da gestão Lula. Perdeu, por exemplo, todos os cargos importantes que possuía no Banco do Brasil - a única exceção é Sérgio Rosa, ex-presidente da Previ (fundo de pensão dos funcionários do BB) que assumiu recentemente a Brasilprev, o braço de previdência aberta do banco.