Título: IPCA mostra inflação domada
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 10/09/2010, Brasil, p. A4

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto mostrou um panorama extremamente tranquilo para a inflação. O índice ficou próximo de zero, subindo apenas 0,04% . Em 12 meses, o IPCA passou a acumular alta de 4,49%, percentual quase idêntico ao centro da meta perseguida pelo Banco Central, de 4,5%, e a menor variação nessa base de comparação desde os 4,31% de dezembro de 2009.

Além de mais uma deflação do grupo alimentos e bebidas, que recuou 0,24%, os bens duráveis tiveram um comportamento favorável, com queda de 0,35%. Os núcleos do IPCA, que buscam excluir ou diminuir o peso dos itens mais voláteis, também mostraram variações modestas. O indicador calculado pela exclusão de dois tipos de combustíveis e dez itens de alimentação no domicílio subiu 0,12% em agosto, metade do 0,24% do mês anterior.

"O comportamentos dos núcleos nos últimos meses indica que a inflação baixa não se deveu apenas aos alimentos", diz o economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles. O núcleo por dupla ponderação, que reduz o peso dos itens mais voláteis, teve alta de 0,19% em agosto, próximo do 0,2% de julho.

Para o economista-chefe do Banco Safra de Investimento, Cristiano Oliveira, o comportamento dessas medidas, além de evidenciar que a perda de força da inflação não foi localizada, aponta para um cenário benigno para os preços nos próximos meses. "Os núcleos funcionam de modo eficiente para estimar a inflação futura."

Um outro sinal positivo do IPCA foi o comportamento do índice de difusão, que registra quantos itens do IPCA tiveram variação positiva. Em agosto, o indicador ficou em 52,6%, mais que os 48,7% de julho, mas bem abaixo dos 62,7% da média do primeiro semestre.

Também chamou a atenção dos analistas o comportamento dos preços dos bens duráveis (como automóveis e eletroeletrônicos). As cotações dos duráveis recuaram 0,35% em agosto, queda mais forte que o tombo de 0,17% de agosto. Números da Quest Investimentos mostram que os automóveis caíram 0,38% no mês passado, enquanto eletrodomésticos tiveram baixa de 1,83% e os produtos eletrônicos, 1,72%. Na contramão, móveis subiram 0,72%. Para Teles, o câmbio valorizado é importante para explicar o comportamento recente dos duráveis. Promoções de automóveis para desovar estoques elevados também jogaram os preços para baixo.

Todos esses números mostram que o resultado positivo da inflação não se limita aos alimentos, mas sem dúvida eles tiveram um papel relevante nesse processo. Entre junho e agosto, o IPCA acumulou alta de 0,05%, período em que o grupo alimentação e bebidas recuou 1,89%. A coordenadora de índices de preços do IBGE, Eulina Nunes dos Santos, ressalta que os alimentos apresentaram "influência muito expressiva" sobre a inflação em 2010. Nos primeiros cinco meses do ano, o grupo subiu 5,48%, puxado pelo efeito das chuvas excessivas sobre a safra. Desde então, seguidas deflações levaram o acumulado no ano a 3,49%.

As várias boas notícias do IPCA de agosto reforçaram as apostas de que o indicador poderá terminar o ano na casa de 5% ou até menos. Oliveira hoje estima 4,8% para o ano, depois de ter projetado um número na casa de 5,3%. Teles, que há alguns meses via um IPCA mais próximo de 5,5%, hoje considera mais provável um número na casa de 5%, ou até mais baixo.

Uma variação de 4,5% parece difícil de ser alcançada neste ano. Para isso, seria necessário que o IPCA tivesse uma variação mensal média de 0,33% entre setembro e dezembro. Para os próximos meses, a expectativa é de que haja alguma recuperação dos preços de alimentos, tornando improvável uma inflação de 4,5%.

Em conjunto com a divulgação de uma ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) extremamente otimista, o resultado do IPCA reforçou a expectativa de que o ciclo de alta da taxa Selic, interrompido na semana passada, não deverá ser retomado nos próximos meses. Tudo indica que os juros ficarão em 10,75% ao ano por um bom tempo. (Colaborou Rafael Rosas, do Rio)