Título: Maior risco para Petrobras é político
Autor: Tan , Edward
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2010, Investimentos, p. D4

A versão mais recente do prospecto da oferta de US$ 65 bilhões em ações ordinárias e preferenciais da Petrobras ressalta os riscos das operações de perfuração em águas profundas que esse novo capital vai financiar. O maior risco, no entanto, pode ser o político.

O filão principal de petróleo ao longo da costa brasileira ameaça reintroduzir a política na gestão da gigante petrolífera, que é controlada pelo governo brasileiro, mas vinha sendo administrada habilmente de modo comercial, ou seja, visando à obtenção de lucros.

O prospecto destaca que 53% dos investimentos de US$ 224 bilhões até 2014 que a empresa colocou em seu orçamento serão destinados à exploração e produção, que estão concentradas na perfuração em águas profundas. A Petrobras é a maior petrolífera do mundo em águas profundas, tendo exibido 22% da produção mundial nesse segmento em 2008, bem à frente dos 14% da vice-líder Exxon Mobil. A Petrobras terá de perfurar a profundidades maiores que a de qualquer poço atual, portanto, obter o petróleo será bastante difícil e os riscos de acidentes e vazamentos podem ser significativos.

Embora o governo detenha cerca de 30% do capital da empresa e 55% de suas ações com direito a voto, a Petrobras opera em grande medida de forma independente, especialmente desde 2002, sendo que a lei brasileira tornou-se mais flexível para permitir parcerias com petrolíferas estrangeiras.

A perspectiva de um fluxo enorme de receitas - com mais de 14 bilhões de barris de óleo equivalente (BOE) de reservas comprovadas e potencial de até 35 bilhões de BOE - pode levar a empresa a voltar a ficar sob controle político mais estrito.

Em primeiro lugar, como ressalta o prospecto, o Congresso brasileiro estuda aprovar leis de exploração e produção de petróleo e gás que podem tornar a Petrobras a operadora exclusiva de todas as áreas pré-sal não licenciadas - áreas de rochas sob depósitos espessos de sal - abrangendo 10,7 milhões de hectares. Isso contempla que a Petrobras assumiria participação em torno a 30% em qualquer oferta pública por tais licenças, com o que teria posição de destaque em qualquer atividade de perfuração.

A empresa, contudo, alerta para a possibilidade de que quaisquer novas leis, assim como o acordo pelo qual a empresa ganha direito a 5 bilhões de barris em reservas em águas profundas em troca da emissão de US$ 42,5 bilhões em ações para o governo, podem ser contestadas pelos tribunais brasileiros - um ponto de interrogação na avaliação da empresa. Alguns investidores reclamaram que a empresa está pagando demais pelos campos.

Além disso, o imposto do Estado do Rio de Janeiro sobre atividades de exploração e produção - aprovado em 2003, mas não colocado em vigor - poderia obrigar a Petrobras a pagar ao Estado cerca de US$ 6 bilhões por ano.

As eleições presidenciais brasileiras em outubro trarão outra incerteza. A candidata na liderança das pesquisas, Dilma Rousseff, é amplamente vista como uma política com visões mais esquerdistas que o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, embora ela tenha seu apoio.

Os riscos políticos não se limitam ao Brasil. Embora a maioria dos investimentos da empresa seja no país, 44% de sua produção e reservas internacionais estão na Argentina, cujos impostos de exportação sobre as vendas de petróleo e gás vêm prejudicando suas operações. Outros 20% de seus investimentos internacionais estão na Bolívia, que em 2009 proibiu a propriedade privada das reservas de petróleo e gás no país, complicando o valor dos investimentos da Petrobras no país.

À medida que a Petrobras é cada vez mais usada como instrumento de política nacional, seja por concepção ou evolução econômica, a empresa encaminha-se a ficar mais politizada. O perigo é tornar-se mais parecida à Pemex e à PDVSA, estatais petrolíferas do México e Venezuela, que vêm sendo usadas para promover várias causas sociais.

Embora as ações da Petrobras recentemente tenham apresentado bom desempenho em relação às grandes concorrentes do setor, suas oscilações vão tornar-se cada vez mais voláteis por operar essencialmente apenas com petróleo, pelos possíveis riscos em suas novas atividades de produção e exploração em águas profundas e pelo risco maior, de que o comportamento financeiro e filosofia operacional independentes da empresa possam ser alterados pela política.