Título: Investidor teme riscos e papel do governo
Autor: Schüffner, Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 16/09/2010, Eu e Investimentos, p. D11

Financial Times, de São Paulo

É fácil ver o que os investidores pensam a respeito da emissão de ações da Petrobras que se aproxima. Quando os planos de exploração dos campos de petróleo no pré-sal foram anunciados, um ano atrás, as ações da Petrobras deram um salto por causa do entusiasmo com o potencial dos campos.

Mas depois que os investidores digeriram os planos do governo brasileiro, as ações caíram, perdendo cerca de um quarto de seu valor neste ano, enquanto o principal índice de ações brasileiro recuou apenas cerca de 2%.

"Não gostamos do processo desde o primeiro dia", afirma um gestor de um grande fundo de hedge dos Estados Unidos. "O governo está impondo sua vontade aos acionistas minoritários. A coisa toda não está sendo transparente."

No plano de capitalização, o governo venderá à Petrobras o direito de exploração de 5 bilhões de barris de petróleo do pré-sal ao preço médio de US$ 8,51 por barril, para um total de US$ 42,5 bilhões.

A Petrobras pagará pelos barris com a emissão de novas ações preferenciais (sem direito a voto) e ordinárias (com voto). Ela também vai oferecer os papéis aos acionistas minoritários, que, aos preços correntes, teriam que desembolsar cerca de US$ 32 bilhões para manter o porcentual de sua participação na empresa e evitar sua diluição pelo governo, que controla a maioria das ações ordinárias da Petrobras, mas menos de um terço de seu capital total.

Uma coisa que está preocupando os investidores é o papel dominante que a Petrobras terá no desenvolvimento dos campos do pré-sal. Um gestor de fundos diz: "Se isso funcionar, será muito proveitoso. Mas uma única companhia vai assumir todos os riscos e, do ponto de vista do gerenciamento de riscos, isso não faz sentido".

Gestores de fundos de hedge precisam cumprir metas anuais, de modo que é compreensível que eles estejam cautelosos com a Petrobras no curto prazo. Mas até mesmo os gestores de fundos que adotam uma visão de prazos mais longos estão com sérias dúvidas sobre o processo.

"A incerteza em torno da transação é enorme", diz Marcela Meirelles, da TCW, administradora de fundos de Los Angeles que atende investidores institucionais e investidores individuais ricos e está com a recomendação venda para as ações da Petrobras.

Ela menciona várias preocupações. Primeiro, há a incerteza sobre o preço com que os campos do pré-sal serão economicamente viáveis. "A Petrobras afirma que isso é possível a US$ 45. Espero que eles estejam certos, mas na verdade acho que eles não sabem."

Outra preocupação é a questão dos níveis de produção. Suposições a respeito foram usadas para decidir o preço médio dos 5 bilhões de barris a serem vendidos à Petrobras pelo governo. Poucas informações vêm sendo divulgadas sobre a base desse cálculo.

Muitos analistas também temem que a emissão de ações possa ser usada para aumentar o controle do governo sobre a Petrobras por razões políticas. Recentemente, o governo tornou possível a transferência de algumas de suas ações para bancos públicos como o BNDES e a Caixa Econômica Federal (CEF).

Qualquer receita que for para o governo durante a emissão de ações, como resultado dessas transferências, poderá ser lançada como receitas extraordinárias, permitindo a ele cumprir suas metas fiscais sem realizar cortes dolorosos nos gastos públicos.

"O governo está se engajando numa engenharia financeira para aumentar seu controle sobre a Petrobras e capitalizar os bancos públicos", afirma um corretor que pediu para não ser identificado.

Mesmo assim, os acionistas minoritários da estatal que não querem ver suas participações diluídas têm poucas opções a não ser participar da operação. Isso explica a alta do preço das ações da Petrobras no início deste mês, com os acionistas tomando posições para se qualificar para as alocações sob as regras de emissão.

O processo de formação de preço das ações na emissão ("bookbuilding") começou em 3 de setembro e prosseguirá até o dia 23. Os investidores qualificados deverão vender pesadamente as ações, num esforço para derrubar os preços da emissão.

Questionada se acredita no sucesso da emissão, Lilyanna Yang, analista do setor de petróleo do UBS em Nova York, disse que sucesso para o governo e a Petrobras é uma coisa, sucesso para os acionistas minoritários é outra.

"Acho que o governo e a Petrobras ficarão felizes com valor de US$ 15 bilhões a US$ 25 bilhões dos acionistas minoritários. Quanto maior a participação em dinheiro dos investidores, melhor será para os acionistas minoritários existentes, uma vez que a diluição será menor", disse ele. Yang prevê que o lucro por ação da Petrobras em 2011 será diluído em 26%.