Título: Marina e PV preparam terreno para divergências
Autor: Taquari , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2010, Política, p. A5

Em mais um sinal de que podem divergir sobre quem apoiar no segundo turno da disputa presidencial, Marina Silva e o seu partido, o PV, convocaram para ontem duas coletivas de imprensa. Os dois eventos ocorreram na capital paulista, mas em horários diferentes. Pela manhã, os dirigentes da sigla explicaram, sem a presença da senadora, como será o processo para definir se apoiarão Dilma Rousseff (PT) ou José Serra (PSDB). A neutralidade é a terceira opção em análise. À tarde e sozinha, Marina concedeu uma entrevista coletiva, onde não descartou a possibilidade de divergir do partido sobre a questão. "Obviamente, que quando vamos para uma discussão democrática, sempre há a possibilidade da diferença e há a possibilidade da convergência", disse a senadora. Segundo ela, o PV não está rachado em torno do tema porque a discussão interna ainda nem começou. Os verdes, no entanto, estão espalhados pelo país em acordos regionais com PT e PSDB.

A bancada no Congresso Nacional, por exemplo, está fechada com o governo Luiz Inácio Lula da Silva. Por outro lado, em São Paulo e no Rio de Janeiro, o partido é ligado ao PSDB. Algumas lideranças, como o deputado federal Fernando Gabeira e o presidente nacional da legenda, José Luiz Penna, já se manifestaram contra a ideia de permanecer neutro na disputa, tendência, na qual Marina dá sinais de que pode adotar.

Ao mesmo tempo em que inicia o debate, o PV reconhece a iniciativa de capitalizar os quase 20 milhões de votos recebidos por Marina no primeiro turno. "Estamos valorizando o dote", disse o deputado federal eleito Alfredo Sirkis (RJ) sobre a demora do partido em marcar posição.

A declaração expõe uma situação que pode se converter em uma tensão futura, já que a figura de Marina é maior do que a da legenda. Sua votação foi muito mais expressiva do que a obtida pelo PV nas urnas. Próximo da candidata derrotada e um dos coordenadores de sua campanha, João Paulo Capobianco fez um balanço das eleições e rejeitar a hipótese de negociar cargos em ministérios em troca do apoio político.

"Partimos de um pressuposto de que os votos não são os nossos votos [do PV], não são os votos da Marina, mas os votos para uma proposta. Então essa decisão passa longe de qualquer discussão de cargos, de ministérios, de qualquer discussão pragmática da formação de um governo", afirmou Capobianco. Penna também não escondia a satisfação com o resultado. "Esse é um momento maravilhoso para o partido e queremos impregnar o programa do futuro presidente", acrescentou.

O PV anunciará sua posição em relação ao segundo turno das eleições presidenciais em uma convenção que será realizada no dia 17 de outubro. Participarão do encontro cerca de 80 delegados com direito a voto, entre representantes da coordenação nacional, deputados federais eleitos e candidatos derrotados aos governos estaduais e ao Senado. Outras 15 vagas serão de religiosos, colaboradores da campanha e líderes do Movimento Marina Silva.

Desde o anúncio do resultado das eleições presidenciais no último domingo, há uma corrida entre o tucano e a petista para ver quem terá o apoio da senadora no segundo turno. Antes da convenção, Dilma e Serra vão receber um resumo do plano de governo de Marina, no qual o PV espera que seja incorporado aos programas dos concorrentes. Durante entrevista coletiva, os três dirigentes do partido também afirmaram que não negociam cargos políticos em troca de apoio e reiteraram que a discussão será exclusivamente programática.

De olho em evitar atritos com Marina, os três dirigentes do PV ainda ressaltaram que os integrantes do partido que discordarem da decisão majoritária poderão manifestar sua posição publicamente. A opinião individual, argumentou Sirkis, será respeitada e ninguém será punido.

"É claro que a decisão da convenção influenciará [Marina], porém, esse processo servirá para que ela também defenda o seu ponto de vista na convenção. A Marina tem cacife político para nos acompanhar, mas nós não temos essa ideia convencional de partido", frisou Capobianco.