Título: Alta do IOF atinge private equity
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2010, Finanças, p. C1

O aumento da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), de 2% para 4%, no ingresso dos recursos externos vai atingir inclusive o investimento, na forma de capital, em participação em projetos de infraestrutura ou do setor imobiliário. O dólar que vem ao Brasil para compra de fatia em empresas nos chamados fundos de "private equity" também passará a ser tributado em 4%.

"Essa medida é um desastre. É um problema porque eu imaginava que teria um valor para investir e agora vou ter menos dinheiro para comprar os ativos", afirma Luciano Lewandowski, sócio da Prosperitas, com foco em fundos de "private equity" imobiliários. A gestora ainda tem no exterior R$ 300 milhões do fundo Prosperitas II de R$ 1 bilhão levantado em 2007. Pelas regras anteriores, o IOF comeria R$ 6 milhões do ingresso. Agora, serão R$ 12 milhões.

Embora o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tenha dito inicialmente que o imposto maior só recairia sobre transações de renda fixa, o investimento em fundos de ações e multimercados também será afetado. O ingresso de dólares para compra de debêntures e outros títulos privados e públicos de renda fixa paga 4%.

Essa é a interpretação dos escritórios de advocacia, bancos e fundos do decreto sobre o IOF, que foi republicado anteontem, na calada da noite, em edição especial do "Diário Oficial" ao qual o mercado só teve acesso na manhã de ontem. A primeira versão do decreto era completamente outra e trouxe muitas dúvidas.

O aumento do tributo para os investimentos em Fundos de Investimento em Participações (FIP), os fundos de private equity, e para Fundos de Investimento Imobiliário (FIP) vai no sentido contrário do que o governo vinha propagando, de reduzir a tributação para investimentos de mais longo prazo para financiar infraestrutura.

O mercado financeiro e integrantes de suas principais entidades não acreditam mais que o pacote para estimular o investimento de longo prazo no país saia tão cedo, pelo menos no que diz respeito ao investidor externo. Medidas como a desoneração do Imposto de Renda de 15% para a compra pelo estrangeiro de papéis privados de renda fixa, como debêntures, que chegaram a ser cogitada pelo governo, se torna cada vez mais improváveis, visto que a ordem do dia é tributar cada vez mais o dinheiro externo que entra no Brasil.

Economista de banco estrangeiro que preferiu não se identificar acredita que o governo poderia mesmo vir a voltar a aumentar o IOF, se o dólar continuar a derreter. E aposta até mesmo na volta do Imposto de Renda sobre o rendimento para títulos públicos.

Segundo Andrea Bazzo, sócia do escritório Mattos Filho, só continuará a ser tributado com 2% de IOF o ingresso de recursos para a compra pelo estrangeiro de ações no mercado primário ou secundário em bolsa. Cotas de fundos negociadas em bolsa também continuam pagando 2%. Transações de derivativos negociadas em bolsa, segundo ela, também serão tributadas com 2%, excluindo "operações que resultem em rendimentos predeterminados", que pagam 4%, explica ela. Isso significa que transações de derivativos de juros e câmbio pagam 2%, quando não resultarem em "rendimento predeterminado", diz Andrea Bazzo.

No caso dos Fundos de Investimento em Participações (FIPs), a mudança no pagamento do IOF atinge não apenas a captação de novos fundos, mas também daqueles que já foram levantados. Isso porque em "private equity" os aportes são feitos conforme as oportunidades de investimento.

O dinheiro para FIPs não vem todo na largada. Por isso, quem já captou um fundo vai ter de trabalhar muito mais para conseguir gerar a rentabilidade antes prometida, diz o executivo de uma gestora que só capta recursos do exterior.

Ontem, o Valor conversou com seis gestoras de fundos de "private equity". Entre todas elas há pelo menos dois pontos de consenso. O primeiro é que gerar a rentabilidade esperada para esse tipo de investimento se tornou bem mais difícil e o segundo, que o aumento da alíquota em si pode não afugentar o investidor, mas a insegurança que ela traz em relação a novas medidas do governo pode trazer esse efeito. Isso traz um fator insegurança para o mercado, diz um gestor.

A avaliação do advogado tributarista Renato Coelho, associado do escritório Souza, Cescon, é que o governo acabou atingindo com a medida algo bem diferente do capital especulativo. "Fundos de participações não são investimentos de curto prazo. E mais, eles são direcionados para o setor produtivo, investem em indústrias por muitos anos."

Para Marcelo Michaluá, da RB Capital, o que vai amenizar o efeito do novo IOF nos fundos imobiliários e de participações é o fato de essa ser uma classe de ativo que tende a ter retornos mais altos do que o investimento em títulos de renda fixa, já que também embutem um risco maior. "Isso faz com que o reflexo do imposto não seja tão grande para essas classes de ativo", diz .

Segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários, só neste ano, foram levantados R$ 2,3 bilhões em fundos de investimento em participações, considerando recursos de brasileiros e estrangeiros. Outros R$ 513 milhões ainda estão em análise pela autarquia. Em fundos imobiliários, foram R$ 4,2 bilhões, com outros R$ 5 bilhões em fase de captação.

Segundo Andrea Bazzo, os novos fundos de private equity vão repensar sua estratégia e passar a ingressar no país na forma de uma nova empresa, um investimento externo direto, que paga IOF de 0,38% e Imposto de Renda de 15% na hora da saída, mas só sobre o ganho efetivo. "Abrir um fundo custa mais do que abrir uma empresa", completa.