Título: Em setembro, ingresso de recursos e intervenção do BC marcam recordes
Autor: Travaglini , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2010, Finanças, p. C2

As compras de moeda estrangeira no mercado à vista feitas pelo Banco Central somaram US$ 10,757 bilhões em setembro, volume mensal recorde. Nos últimos meses, BC retirou todo o excesso de dólares que ingressou no país, mas as maciças intervenções não têm sido suficientes para frear a apreciação do real frente ao dólar.

O movimento de valorização do real segue tendência global de depreciação do dólar frente às outras moedas, agravada pelas operações especulativas que se aproveitam do diferencial de juros entre o Brasil e o resto do mundo feitas tanto por investidores estrangeiros quanto pelos bancos brasileiros.

Além disso, o mês de setembro registrou um volume recorde de entrada de dividas no Brasil. O fluxo de operações financeiras fechou o mês positivo em US$ 16,7 bilhões, maior valor da série histórica iniciada em 1982. O valor, expressivo, é praticamente o mesmo de todo o ano passado (US$ 18 bilhões). As compras de moeda estrangeira (entradas) somaram US$ 49 bilhões, em setembro, contra US$ 32,5 bilhões em vendas de divisas (saídas) no mesmo período. O primeiro dia de outubro, com saldo positivo de US$ 1,3 bilhão, indica que a tendência se mantém.

Segundo Jorge Knauer, diretor de Tesouraria do Banco Prosper, as recentes medidas anunciadas pelo governo não devem alterar a tendência de longo prazo da moeda, que ainda é de apreciação, mas podem trazer certa volatilidade no curto prazo. "Hoje, mesmo com dólar caindo em relação ao euro e a uma cesta de moedas lá fora, a moeda americana subiu em relação ao real".

Para Knauer, o governo deve fazer o que for possível para tentar conter a valorização. "É o momento de usar todas as ferramentas para conseguir trazer um pouco de volatilidade ao mercado, que em tese traz equilíbrio das forças. Com esse equilíbrio, o preço tende pelo menos a ficar estável", diz. Mas ele ressalta que contra a arbitragem, o único remédio é a redução de juros, decorrente de um ajuste fiscal.

Além das medidas anunciadas pelo Ministério da Fazenda, o Banco Central também intensificou as compras nos últimos meses, como forma de recolher o excesso de moeda estrangeira. As intervenções da autoridade monetária no mercado à vista, no entanto, somaram US$ 29,5 bilhões no ano, mais do que suficientes para retirar toda sobra de divisas, que foi de US$ US$ 18 bilhões entre janeiro e setembro, sem que a queda do dólar tenha sido amenizada.

A explicação, segundo Sidnei Moura Nehme, diretor-executivo da NGO Corretora de Câmbio, é que o BC comprou acima do fluxo e, com isso, patrocinou a chamada posição "vendida" dos bancos brasileiros, que fechou setembro em US$ 12,5 bilhões, ligeira redução em relação aos US$ 13,7 bilhões de agosto.

Segundo Nehma, a posição vendida das instituições financeiras, que revela a aposta na apreciação do real, só pôde ser constituída pelo apetite do BC em comprar as dividas que ingressam no país. Sabendo dessa diretriz, os bancos captam dólares no exterior, pagando taxas bastante reduzidas e trazem a moeda americana para aplicar em títulos no país, recebendo a remuneração da Selic, afirma.

Nehme explica que para a operação ser ainda mais atrativa, o ideal é que haja valorização do real, pois dessa forma os bancos ganham a variação da moeda no período. "Os bancos operam apreciando o real, transformando a variação cambial positiva para eles a ponto de anular o custo financeiro das linhas. Como essas posições "vendidas" são fomentadas pelo BC, a autoridade monetária induz os bancos a apreciar o real", diz.

Hoje, portanto, há duas pressões sobre o câmbio: os investidores estrangeiros trazendo recursos em busca dos maiores juros do mundo e os bancos brasileiros "vendidos" no mercado à vista e ganhando com a apreciação do real. "As medidas adotadas até agora são paliativas. Se desejar mudar o cenário, o governo deverá atuar normativamente elevando bruscamente margens das operações no mercado futuro e limitando os percentuais de exposição em transações de variação cambial do sistema financeiro", diz Nehme.