Título: FMI busca papel de liderança na recuperação econômica
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Fonte: Valor Econômico, 08/10/2010, Opinião, p. A10

Há pouco mais de três anos, o Fundo Monetário Internacional (FMI) parecia com os dias contados. As economias avançadas iam de vento em popa. Os mercados emergentes esbanjavam vitalidade. Ninguém mais falava em dívida externa, que havia sido durante muito tempo a principal razão de ser do FMI. A crise existencial era a única que organismo, criado no acordo de Bretton Woods, em 1944, enfrentava.

Essa tranquilidade se mostrou totalmente infundada com o estouro da bolha imobiliária americana, em 2007. O FMI demorou a responder a altura. No primeiro momento, os governos reagiram individualmente para apagar os incêndios em seus quintais. Depois houve alguma articulação de países no âmbito do G-20, com o FMI em um papel secundário.

Agora, a dinâmica parece estar mudando. Com os governos desesperados com a letargia de suas economias e lutando para garantir vantagens competitivas em relação a outros países em manobras que lembram o protecionismo, o FMI tenta assumir a posição de árbitro, que pretende consolidar na reunião que vai acontecer neste fim de semana, em Washington.

Pontos a discutir é que não faltam. Um dos mais quentes no momento é a guerra das moedas, a principal arma que os países estão usando para melhorar suas vantagens competitivas no mercado internacional e dar um gás na economia. O Brasil assumiu um papel relevante nesse campo de batalha ao tomar medidas para reduzir o fluxo de capital externo especulativo para o país e conter a desvalorização do real. O Banco Central (BC) acaba de dobrar para 4% o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre investimentos estrangeiros em renda fixa e fundos de ações.

Surpreendentemente, o FMI não combateu a medida como faria anos atrás com qualquer interferência direta no livre mercado. Para o diretor do Departamento de Pesquisa do Fundo, o conselheiro econômico Olivier Blanchard, controles podem ser criados para dirigir o capital a investimentos mais desejáveis para que não produzam distorções como bolhas de crédito. O diretor de mercado de capitais do FMI, José Viñals, reforçou o tom ao dizer que controles de capital podem ser usados, desde que de forma parcimoniosa.

Os representantes do Fundo baseiam-se em estudo do próprio organismo, segundo o qual um terço dos episódios de grandes fluxos de capitais entre 1987 e 1996 terminaram com uma parada súbita e consequente crise cambial. De acordo com o mesmo estudo, a elevação do IOF em 2009 foi ineficaz para deter o fluxo de capital externo para investimentos em renda fixa no país, mas teve algum impacto nas aplicações direcionadas à renda variável.

A guerra cambial é um dos pontos mais graves do desequilíbrio externo, que existia de modo latente, mas foi agravada pela crise internacional. Para recuperar o equilíbrio externo, avalia o FMI, economias avançadas como os Estados Unidos, que sempre dependeram da demanda interna, precisam agora ampliar as exportações; e mercados emergentes como a China, que sempre contaram com as exportações para impulsionar suas economias, devem desenvolver a demanda doméstica. Recuperar o equilíbrio externo vai implicar a apreciação das moedas de vários mercados emergentes.

Outro desafio à frente do planeta é recuperar o equilíbrio interno, perdido quando os governos lançaram mão dos estímulos fiscais para reativar a demanda doméstica. Quando as condições permitirem e a demanda for forte o suficiente para sustentar o crescimento, os países precisarão fazer o ajuste fiscal.

Para o FMI, a recuperação está sendo lenta. Por isso, reduziu as previsões para a economia no próximo ano. O crescimento médio esperado para o mundo foi reduzido em 0,1 ponto percentual para 4,2%, abaixo dos 4,8% esperados para este ano. O recuo será puxado pelos países mais avançados, que devem crescer 2,2% (0,2 ponto abaixo do esperado anteriormente) em comparação com 6,4% dos países emergentes.

Uma das razões da letargia econômica nas economias avançadas é o estado ainda vulnerável do sistema financeiro, com balanços não totalmente sanados - campo em que o FMI também tem propostas, sobrepondo-se aos esforços do Banco para Compensações Internacionais (BIS).

Para assumir um papel importante na reconstrução do espírito global de cooperação não basta, porém, o FMI fazer diagnósticos inteligentes. É preciso apresentar propostas factíveis e, acima de tudo, conseguir o apoio do G-20, grupo de países que efetivamente faz diferença na balança global.