Título: Emprego cresce só entre trabalhadores de maior escolaridade
Autor: Santos , Chico
Fonte: Valor Econômico, 22/10/2010, Brasil, p. A3

O mercado de trabalho favorável e a elevação consistente da escolaridade da população brasileira - a escolaridade média passou de 6,6 anos em 2004 para 7,2 anos em 2009, segundo o IBGE - estão fazendo com que as pessoas com maior grau de instrução ocupem cada vez mais espaço no mercado de trabalho, enquanto cai a fatia ocupada pelos menos instruídos. Os números divulgados ontem pelo IBGE juntamente com a taxa de desemprego de 6,2% em setembro (6,7% em agosto), a mais baixa da série iniciada em março de 2002, mostram que o aumento do número de pessoas ocupadas com 11 ou mais anos de instrução nas regiões pesquisadas foi maior do que o próprio crescimento do total de pessoas ocupadas.

De acordo com os dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE, o número de pessoas ocupadas nas regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre passou de 17,275 milhões em março de 2002 para 22,282 milhões em setembro deste ano, um aumento de 29%, ou de 5,007 milhões em termos absolutos. No mesmo período, o total de trabalhadores com 11 ou mais anos de instrução (pelo menos o ensino médio completo) passou de 7,669 milhões para 13,276 milhões, um aumento de 5,607 milhões em termos absolutos, ou 73,11% em números relativos.

Paralelamente, houve queda do pessoal ocupado nos estratos populacionais com níveis de instrução abaixo de oito anos de estudos. Na camada com no máximo um ano de instrução o número de pessoas ocupadas caiu de 580 mil para 363 mil ao longo da série histórica da PME. Na faixa que vai de um a três anos de instrução, os chamados analfabetos funcionais (menos de quatro anos de estudos), o número de ocupados caiu de 1,189 milhão para 815 mil.

E entre aqueles com quatro a sete anos de escolaridade, o total de ocupados passou de 4,383 milhões para 3,905 milhões, número praticamente igual ao de pessoas com oito a dez anos de estudos, cujo total cresceu de 3,419 milhões para 3,903 milhões.

Tanto para o economista Roberto Gonzalez, técnico em Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) quanto para Cimar Azevedo, gerente da PME, o fenômeno decorre do aumento da escolaridade da população e da situação favorável do mercado de trabalho. Para Gonzalez, o aumento da ocupação decorrente da maior oferta de vagas "faz com que as pessoas tenham acesso a mais empregos com qualificação superior".

Nessas condições favoráveis, segundo ele, tanto as empresas estão dispostas a pagar salários mais altos como os trabalhadores têm maior poder de barganha para reivindicar melhor remuneração. Os dados do IBGE mostram que na conjuntura atual o crescimento da ocupação para os mais qualificados vem acompanhado do aumento do rendimento médio, que em setembro atingiu R$ 1.499, também o maior valor da série do IBGE.

O pesquisador do Ipea ressalta que a combinação de aumento da escolaridade com o mercado favorável faz com que haja crescimento da presença de pessoas com maior grau de instrução tanto ocupadas como procurando emprego, o que as define tecnicamente como desempregadas. Os dados do IBGE mostram que entre a população desocupada de 1,480 milhão de pessoas em setembro deste ano, 828 mil (56%) eram pessoas com 11 anos ou mais de escolaridade, número que não fica muito longe dos 952 mil de março de 2002, quando o total de desocupados era de 2,566 milhões.

Entre as pessoas com menos de oito anos de instrução, a queda no número de desempregados no mesmo período foi drástica, passando de 911 mil (35,5% do total) para 286 mil (19,3% do total). Na população entre oito e dez anos de estudos, a queda do número de desempregado ao longo da série histórica do IBGE foi de 703 mil (27,4%) para 366 mil (24,7% do total).

Parte desse fenômeno, segundo os analistas do IBGE e do Ipea, é explicado pela forte presença dos jovens de 18 a 24 anos entre o contingente de desempregados. Mais escolarizados, mas inexperientes, os jovens demoram mais para conseguir colocação no mercado de trabalho. Tanto que a taxa de desemprego nessa faixa etária é, de longe, a mais elevada. Em setembro ela foi de 14,1%, mesmo tendo caído (foi de 15% em agosto), diante de 5,4% na população de 25 a 49 anos de idade. O jovem, segundo Azevedo, do IBGE, quando não é arrimo de família, tem mais condições de ficar mais tempo desempregado, sustentado pela família.

Gonzalez, do Ipea, disse ainda que o momento favorável do mercado de trabalho, com o desemprego no seu nível mais baixo, mascara distorções entre grupos. Uma delas é a de gênero. Enquanto a taxa de desemprego dos homens já está abaixo de 5% (4,8%), entre as mulheres ela ainda ficou em 7,9% em setembro, mais de três pontos percentual do que a do sexo masculino.

Apesar de, no conjunto, os números da PME de setembro terem sido favoráveis, ficou uma interrogação que, segundo o gerente da pesquisa, precisa ser observada com mais atenção de agora em diante: em setembro, pelo segundo mês consecutivo, houve redução no número de trabalhadores na indústria da região metropolitana de São Paulo. O total caiu de 1,952 milhões em julho para 1,932 em agosto e 1,898 em setembro.

Os dados do IBGE mostraram que a menor taxa de desemprego em setembro entre as regiões pesquisadas foi em Porto Alegre (4,1%) e a maior, 10,3%, ficou com Salvador. Recife, cuja taxa ficou em 8,8%, registrou a menor queda do desemprego entre as regiões metropolitanas, recuando apenas 0,2 ponto percentual.