Título: EUA se recuperam de forma mais lenta
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Fonte: Valor Econômico, 18/10/2010, Internacional, p. A11

Quando países sofrem crises financeiras, geralmente recuperam-se devido às suas exportações - é o que mostra a história. A moeda cai e as regiões do mundo que permaneceram imunes a crises financeiras os ajudam a sair de seu buraco, importando seus bens e serviços e devolvendo sua população ao trabalho.

Desta vez não será tão fácil. A crise financeira não foi sentida num só país. O ano passado foi o primeiro, desde a Grande Depressão, em que a produção econômica do mundo inteiro caiu. Além disso, os países que estão crescendo rapidamente agora, como a China, não estão dispostos a intensificar suas importações para estimular o crescimento nas economias mais debilitadas. A China e outros países estão efetivamente deprimindo suas moedas para incrementar ou manter uma quota desproporcionalmente grande da atrofiada demanda mundial.

O ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, advertiu em 27 de setembro para uma "guerra cambial". O problema é ser uma impossibilidade matemática que todos os países cresçam mantendo suas exportações altas e suas importações baixas.

"Não existe planeta para onde seja possível exportar", diz Paul Krugman, ganhador de um Prêmio Nobel, economista na Universidade Princeton e colunista do "New York Times".

E agora? Para os EUA, maior economia do mundo, a questão é: o que será necessário para restaurar um crescimento saudável, caso não seja o comércio. Economistas entrevistados pela "Bloomberg Businessweek" e pela Bloomberg News ofereceram uma interessante variedade de respostas - de tecnologia, passando pelo "espírito animal" (dos capitalistas), até a simples passagem do tempo. A maioria, entretanto, diz que a recuperação americana poderá permanecer fraca por vários anos, ainda, e há também a possibilidade de que o crescimento cesse por completo, levando a economia de volta a uma recessão.

Para complicar as coisas, o buraco do qual a economia americana precisa escapar é excepcional profundo. Como mostra o gráfico ao lado, em setembro o emprego ficou 5,6% abaixo do seu pico alcançado em dezembro de 2007. Em quatro das cinco recessões anteriores desde 1970, nesta fase, o emprego saltara de volta para novos picos. A única exceção foi na esteira da recessão de 2001, em que o emprego, nesta fase, ficou 1,8% abaixo do pico pré-recessão.

O risco é que a economia permaneça atolada. As empresas não contratam pessoal e não aumentam a produção porque não veem nenhuma demanda - e os consumidores não gastam porque as empresas não estão contratando e porque ainda estão tentando ampliar sua poupança para compensar a diminuição da riqueza das famílias durante a crise financeira. "Os efeitos de crises financeiras tendem a ser muito, muito prolongados", diz Krugman. "O Japão ainda é uma economia deprimida e frágil, 18 anos após sua crise bancária. Se compararmos onde estamos com os estágios iniciais da década perdida do Japão, concluiremos que estamos indo pior. Temos uma recessão mais profunda, maior desemprego e, de modo geral, uma reação mais débil em termos de políticas de governo", afirma.

Em 5 de outubro, o Goldman Sachs disse haver uma chance de aproximadamente 25% a 30% de que a economia mergulhará de volta em recessão. Jan Hatzius, economista-chefe do Goldman nos EUA, previu que a taxa de desemprego crescerá para 10% no início de 2011 e observou que, na economia americana do pós-guerra, "nunca vimos um aumento na taxa de desemprego [em termos de média móvel para três meses] superior a um terço de um ponto percentual que não coincidisse com, ou prenunciasse, uma recessão".

A inovação tecnológica é um salvador em potencial. Edmund S. Phelps, economista da Universidade Columbia e ganhador do Prêmio Nobel, diz haver "um reservatório crescente de novos e pouco desenvolvidos métodos nunca antes experimentados. Em algum momento, a barragem vai se romper". No cenário desenhado por Phelps, algum empreendedor tentará conseguir dar um salto à frente de seus concorrentes, investindo pesadamente em novas tecnologias. Os rivais serão obrigados a reagir para a evitar a perda de participação de mercado e uma espiral virtuosa terá início.

Ou talvez desgaste e obsolescência virão em socorro. As empresas não podem adiar para sempre a substituição de antigas estruturas e equipamentos, notam Phelps e Hatzius. A construção de moradias está tão lenta que "é quase matematicamente impossível ocorrer outra grande queda no setor", escreveu Hatzius em 5 de outubro.

O setor privado americano está, gradualmente, eliminando seu endividamento excessivo. Ricardo J. Caballero, economista do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, em inglês) e especialista em crises financeiras internacionais, escreveu, em uma troca de e-mails, que os danos causados pela crise financeira nos EUA "levarão algum tempo para serem reparados, talvez alguns anos, mas não uma década". Em contraste com o Japão, escreveu Caballero, os EUA têm empresas com lucros saudáveis e crescimento da produtividade, e não têm as empresas "zumbis" que minam o vigor de uma economia.

Talvez a salvação da economia americana seja uma calmaria. Isso, pelo menos, é o que Alan Greenspan, ex-presidente do Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA), disse em 7 de outubro na conferência FX10 Bloomberg, ao ser entrevistado no palco por Tom Keene, da Bloomberg. Greenspan disse ser inútil tentar estimular os espíritos animais dos executivos empresariais enquanto eles ainda estão com medo de outra calamidade financeira. O que é necessário, segundo ele, é um período de calma suficientemente longo para que recuperem sua confiança e comecem voltar a pensar em novas oportunidades. Em outras palavras, disse Greenspan: "calmaria".

(Tradução de Sergio Blum)