Título: Bancos privados tiram fatia do BNDES e ampliam crédito para as empresas
Autor: Travaglini , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2010, Finanças, p. C3

Os empréstimos para as empresas com recursos próprios dos bancos tiveram recuperação no mês de setembro, substituindo parte da oferta de crédito direcionado do BNDES que foi o que mais supriu a demanda por financiamentos no primeiro semestre do ano. O estoque de linhas de crédito com recursos livres para as pessoas jurídicas cresceu 2,6% no mês, ritmo superior ao aumento do crédito direcionado (0,9%) e ao do crédito para o consumo (1,4%). A normalização dos empréstimos com recursos próprios das instituições era o que faltava para reestabelecer as condições financeiras do período anterior à crise de 2008.

O chefe do Departamento Econômico do Banco Central (BC), Altamir Lopes, acredita que esse movimento pode ser visto como uma "tendência" para os próximos meses, o que permitirá uma "acomodação" das liberações do BNDES. Ele salientou que "o crescimento do crédito em setembro se deu de forma equivalente em todas as modalidades. O direcionado apresenta uma taxa um pouco mais baixa (em relação a meses anteriores). Um ritmo mais normal".

O aumento do estoque de financiamentos para as empresas - de R$ 469,2 bilhões em agosto para R$ 481,4 bilhões em setembro -só não foi maior por causa da apreciação cambial, que nesse período foi de 3,5% . Pouco mais de 10% do estoque de empréstimos às empresas com recursos livres está atrelado ao dólar, o que leva a uma expansão menor do saldo das carteiras. Caso ao real tivesse ficado estável em relação ao dólar no mês, o avanço de 2,6% teria sido de 3%.

Lopes avalia que parte da recuperação do crédito para pessoas jurídicas se deve a própria demanda por capital de giro, decorrente de uma atividade econômica mais aquecida sazonalmente no fim de ano. O saldo das operações de capital de giro chegou a R$ 249,088 bilhões em setembro, avanço de 2,8% no mês e de 24,5% em doze meses sobre igual período do ano passado.

A procura por crédito com recursos dos bancos estava fraca em parte pela abundância de recursos do BNDES, mas também porque muitas companhias, especialmente do comércio, fizeram estoques no início do ano levadas por certa euforia com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, expectativa que não se confirmou dada a desaceleração da atividade no segundo e terceiro trimestres. Houve, ainda, uma importante substituição dos bens de consumo nacionais por produtos importados ao longo do ano, o que esfriou a demanda das indústrias por capital de giro.

Os bancos privados também aceleraram a oferta de crédito e cresceram mais do que as instituições públicas no mês, mantendo tendência dos dois meses anteriores. Os nacionais viram seu estoque de linhas avançar 2,3%, contra 1,7% dos estrangeiras e 1,3% dos públicos. Nos últimos três meses, os bancos nacionais cresceram 6,3%, contra 5,3 dos estrangeiros e 4,7% dos públicos. No ano, a variação já é bem próxima: 15,1% de expansão dos bancos estatais e 14,9% das instituições privadas nacionais.

De acordo com análise do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), "os dados divulgados pelo BC dão a indicação mais segura, até aqui disponível, que de fato o crescimento do crédito dos bancos públicos durante a crise teve determinante anticíclico e não corresponde a uma elevação estrutural da participação dessas instituições no crédito global".

Segundo o instituto, "o melhor desempenho do crédito privado na margem se traduziu no distanciamento menor entre a evolução do crédito do setor público e do setor privado na comparação com o mesmo mês do ano anterior, que se abriu na crise e tende a ser fechar nos próximos meses, já que o comportamento dos bancos privados é pró-cíclico".