Título: Incertezas travam giro de títulos públicos
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2010, Finanças, p. C8
O mercado de títulos públicos no Brasil está travado ante a demonstração do governo brasileiro de que usará todas as armas para conter a apreciação do real, a constatação de que as coletas mais recentes de preços estão supreendendo para cima e a perspectiva de nova rodada de afrouxamento monetário pelo Federal Reserve (banco central americano) a partir da semana que vem. Mais dinheiro em circulação nos EUA deveria animar os negócios domésticos e até provocar a queda de rentabilidade dos papéis públicos. Mas não é isso o que está acontecendo no momento. As operações estão emperradas. Embora o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tenha negado ontem rumores de que o governo pretende retornar com a cobrança do Imposto de Renda sobre os investimentos de estrangeiros na compra de títulos, o mercado segue com o pé atrás, inclusive, porque o ministro continua indicando que pretende deslocar as ordens de compra de títulos para o exterior.
Cotações indicativas mostram, por exemplo, que as taxas das Notas do Tesouro Nacional da série B (NTN-B) - títulos atrelados à inflação disputados por estrangeiros e investidores institucionais domésticos- estão flertando com o patamar de 6% ao ano após romperem esse suporte há uma semana. A prefixada NTN-F com vencimento em 2021, que chegou a ser negociada durante o mês a 11,70% ao ano, já avançou a 12,15% ao ano na sexta-feira e, ontem, a 12,30% ao ano, sem negócios.
"O mercado vem travando desde a semana passada, quando o Banco Central fechou as brechas que poderiam dar algum alívio ao aumento na tributação de investidores estrangeiros pelo Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O humor do estrangeiro mudou. Ele está ressabiado", explica Marianna Costa, economista-chefe da Link Investimentos que destaca o fato desse investidor não gostar de mudança de regra no meio do jogo.
Marianna comenta que não está havendo fuga de capital, mas lembra que o dinheiro aplicado aqui "vale ouro", tanto que não se observa interesse de venda de NTN-B nos leilões de recompra promovidos pelo Tesouro. "Quem está com o papel quer ficar com ele, mas o fluxo de dólares para aplicação aqui já está prejudicado. Os investidores preferem aplicar em NDF (Non Deliverable Forward). Está claro que a ação do governo não foi refletida de maneira importante na taxa de câmbio, mas atingiu em cheio a curva [de juros] dos títulos públicos", pondera.
Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, considera que o mercado travado é transitório, mas pondera que a melhora do cenário depende de resposta a duas questões: quando o BC começará a ajustar a política monetária à inflação mais alta e até onde a Fazenda pretende conter a valorização do real. "Se ocorrer um ajuste na política monetária, maior deverá ser a ação da Fazenda com foco na moeda", diz Velho que alerta para o comportamento da inflação. "A curva de juros também vem sendo afetada pela surpresa com as novas coletas de preços que estão apresentando índices de 0,50% a 0,70%, quando a expectativa do mercado era de variações mensais de 0,30% a 0,35% até o fim do ano. Diante disso, o mercado quer prêmio maior para aplicar em reais."