Título: PT e PSDB aumentam assédio a Marina
Autor: Agostine , Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 15/10/2010, Política, p. A7

A dois dias da plenária que vai definir qual o rumo que o Partido Verde irá tomar e conhecer a decisão da ex-candidata à Presidência Marina Silva, o flerte do PSDB e do PT aos 20 milhões de votos da terceira candidata na disputa se intensificou. Já aconteceu uma conversa entre representantes do PV e o coordenador do programa de governo de Dilma Rousseff, Marco Aurélio Garcia. Hoje um encontro similar deve se repetir com o interlocutor designado pelo candidato José Serra, o senador eleito pelo PSDB por São Paulo Aloysio Nunes Ferreira.

O tema da conversa gira em torno das dúvidas em relação às propostas da "Agenda por um Brasil Justo e Sustentável" que o PV divulgou há uma semana. Marina quer garantir o compromisso dos candidatos com os tópicos que considera prioritários para o desenvolvimento sustentável do país. São dez itens que abordam desde a reforma eleitoral e a transparência nos gastos públicos à principal bandeira do PV, que é um modelo de desenvolvimento calcado no uso consciente dos recursos naturais.

"A manifestação do PT e do PSDB sobre as propostas de governo do PV são uma indicação importante do nível do interesse deles em cima dos temas tidos como relevantes para o PV", diz um assessor da campanha de Marina. Na plenária do PV no domingo deve ser feito um relato dessas conversas aos convencionais que vão votar qual o caminho a seguir: apoiar a candidata do PT, o candidato do PSDB ou nenhuma das alternativas anteriores - que até este momento parece ser a opção pessoal de Marina.

A campanha de Dilma pretendia encaminhar ontem à noite uma carta formalizando a Marina e ao PV que está de acordo com muitas das propostas apresentadas. Na terça, pela manhã, Dilma telefonou a Marina manifestando interesse de conversar. Ontem, em Brasília, Marco Aurélio Garcia encontrou-se com o vice-presidente nacional do PV e recém-eleito deputado federal Alfredo Sirkis e Bazileu Alves Margarido, membro da executiva nacional do PV e assessor de Marina. Na pauta, Garcia pedia esclarecimentos sobre os pontos costurados pelo PV.

Um deles foi sobre a proposta de moratória de novas usinas nucleares ainda não autorizadas pelo Congresso Nacional. O PT tem uma visão diferente sobre o tema e prevê novas usinas como "alternativa a situações emergenciais". Governadores do Nordeste demonstraram interesse explícito em ter essas obras em seus territórios. Garcia procurou minimizar as arestas com seus interlocutores. "O PV demonstrou preocupação mais em relação ao destino do lixo do que sobre a segurança das usinas", comentou.

Outro pedido de esclarecimentos foi em relação à proposta de "desmatamento zero de vegetação nativa primária e secundária, em estágio avançado de regeneração, em todos os biomas". O coordenador da campanha de Dilma lembrou que este contexto foi iniciado no governo Lula, com Marina como ministra do Meio Ambiente. "O que não está claro nessa proposta é se não vai haver confronto com áreas de manejo florestal, em que pode haver desmatamento e reflorestamento", pontuou.

Sobre o futuro da hidrelétrica de Belo Monte, um ponto delicado entre ambientalistas e governo, não houve fortes divergências, segundo Garcia. O texto elaborado pela campanha de Marina ressalta a necessidade de "cumprimento das condicionantes socioambientais" previstas no licenciamento de Belo Monte. Os movimentos sociais de Altamira, onde a hidrelétrica deve ser construída, têm alertado para o risco de o rito não ser cumprido. Garcia argumenta: "As preocupações de Marina em relação a Belo Monte são de ordem ambiental e social. As nossas preocupações são as mesmas".

Sobre outro nó da proposta, a revisão do Código Florestal, que tramita no Congresso, Garcia afirmou que há consenso nos temas centrais como o veto à anistia a desmatadores. "Há um nível de concordância bastante grande", disse. "Nosso amigos do PV deixaram claro que não era um ultimato, mas sim que eles queriam o nosso posicionamento sobre um conjunto de posições", afirmou, ressaltando a expressão "nossos amigos". Embora quase toda a trajetória política de Marina tenha sido construída no PT, não é segredo que foram as rusgas com a então ministra da Casa Civil Dilma Rousseff que a fizeram sair do governo.

Além da agenda ambiental, no catálogo de propostas do PV abordam-se também temas que mexem diretamente com o caixa do governo, como o limite da expansão dos gastos de custeio do governo federal à metade do crescimento do PIB e a supressão do IPI sobre a fabricação de veículos elétricos e híbridos. Segundo Garcia, não houve atrito nesses pontos.

No domingo, na plenária de São Paulo, devem votar 150 convencionais. "Decidimos nos abrir para um processo moderno", explica Maurício Brusadin, presidente do PV do Estado de São Paulo. "Todo mundo vestiu a camisa desta campanha, não fomos só nós, do PV". Isto explica porque o Movimento Marina Silva, que agrupa em rede na internet cerca de 50 mil pessoas, terá direito a cinco delegados - e cinco votos. O mesmo irá acontecer com o grupo de intelectuais que elaborou a plataforma da campanha - outros cinco delegados. Finalmente serão contemplados também os religiosos, com outros cinco delegados. A eles se somam os 57 votos da Executiva nacional do partido, os votos dos 11 candidatos a governos estaduais e dos 17 candidatos aos Senado.

O Valor entrou em contato com a campanha de Serra ontem, ao longo do dia, em busca de informações sobre a posição da candidatura em relação às propostas apresentadas por Marina, mas não obteve resposta. Procurado, o coordenador do programa de governo informou por meio de sua assessoria que o assunto "é uma questão política" e que não gostaria de se pronunciar. A assessoria direta de Serra foi contactada e até o fechamento desta edição não se pronunciou sobre as questões levantadas.