Título: Cinco imperativos para o G-20
Autor: Metzl , Jamie F.
Fonte: Valor Econômico, 11/11/2010, Opinião, p. A13

Uma vez que Washington está menos capacitado para desempenhar o papel principal na gestão da economia mundial, a responsabilidade passou para o G-20. Se os líderes não aceitarem essa responsabilidade, o futuro poderá ficar sombrio.

Em todo o mundo, as economias estão cada vez mais interdependentes, mas nacionalismo econômico, protecionismo e atitudes do tipo "empobrecer o vizinho" estão ameaçando os laços de confiança e de cooperação que uma economia realmente globalizada exige.

Para evitar uma nova recessão, ou algo pior, os líderes dos 20 países mais ricos devem assumir ações agressivas na cúpula semianual do G-20 em Seul para desenvolver uma ampla agenda objetivando um crescimento mundial mais equilibrado, equitativo e sustentável - e para supervisionar sua rigorosa implementação.

Cinco princípios deveriam nortear seu pensamento. Em primeiro lugar, embora as diferenças sobre comércio e política econômica devam ser abordadas, o autointeresse míope tem de ser combatido de forma ativa. Superávits excessivos em alguns países e endividamento excessivo de outros, alimentados, respectivamente, por moedas subvalorizadas e gastos governamentais descontrolados, devem ser combatidos. Os países devem se comprometer em não sustar por razões políticas a exportação de recursos naturais essenciais e em fazer todo o possível para manter e incentivar a abertura dos mercados com base em princípios de reciprocidade e sustentabilidade a longo prazo.

Para que isso aconteça, todos os grandes atores devem permanecer comprometidos com o livre comércio no contexto de um sistema mundial justo e equitativo e devem comunicar esse compromisso, vigorosa e repetidamente a suas próprias sociedades. Por serem as duas mais importantes potências comerciais mundiais, os EUA e a China, em especial, devem combater as tendências, em seus próprios países, de erguer barreiras ocultas ou colocar em prática medidas inadequadas de retaliação destinadas a aplacar a opinião pública interna. Todas as economias precisam enfrentar as perturbações internas que podem acompanhar a abertura dos mercados.

Em segundo lugar, esforços muito mais vigorosos devem ser empreendidos para fazer progredir os acordos comerciais multilaterais, em particular completando a Rodada Doha de negociações comerciais. Embora a proliferação de acordos bilaterais de comércio em todo o mundo seja uma evolução positiva, a economia mundial sofrerá enormemente se esses acordos acabarem se efetivando em detrimento de acordos mundiais, que podem contribuir exponencialmente mais para impulsionar o crescimento mundial.

Em terceiro lugar, no contexto de uma economia mundial cada vez mais interdependente, as políticas monetária e fiscal devem ser melhor coordenadas em todos os países. O G-20 deve fazer muito mais para harmonizar as políticas econômicas e comerciais nos diferentes países e continentes para catalisar o crescimento mundial. Obstáculos desnecessários aos fluxos internacionais de capitais e ao investimento direto estrangeiro devem ser eliminados à medida que as economias vão se tornando mais fortes.

Analogamente, temos de avançar muito mais rapidamente, em todo o mundo, rumo a taxas de câmbio regidas pelo mercado e no sentido de resolver o enorme endividamento de muitos países desenvolvidos. O G-20 também pode desempenhar um papel mais importante no reforço das competências das entidades regulamentadoras num ambiente internacionalmente conectado e deveria desenvolver um referencial regulamentar mutuamente acordado para os mercados financeiros em evolução.

Em quarto lugar, muito mais precisa ser feito para deslanchar o enorme potencial humano e econômico de 1,4 bilhão de pessoas em todo o mundo que vivem em extrema pobreza e destituídas de oportunidades significativas. Nove milhões de crianças morrem anualmente antes de seu quinto aniversário, 69 milhões de crianças em idade escolar não estão na escola, 884 milhões de pessoas não têm acesso a água potável e 2,6 bilhões não dispõem de acesso a saneamento básico.

Educar e capacitar os grupos mais pobres e desfavorecidos em todo o mundo não é apenas um imperativo moral, é também um dos melhores investimentos em crescimento sustentável de longo prazo que os líderes mundiais podem fazer. Os países do G-20 devem assumir a liderança em tornar isso realidade.

Finalmente, deve ser incentivada a inovação como um gerador de crescimento no longo prazo. Isso exige fomentar investimentos mais eficazes em educação e em pesquisa e desenvolvimento, aumentando a proteção à propriedade intelectual e a promoção de novos esforços colaborativos internacionais, contribuindo para enfrentar os desafios comuns nos setores de energia, proteção ambiental, saúde e outras áreas.

A declaração de princípios divulgada em 23 de outubro pelos ministros das Finanças do G-20 traz muitas afirmações apropriadas sobre algumas dessas questões. Mas as palavras dos ministros cairão no vazio se, como aconteceu com afirmações semelhantes feitas nas cúpulas anteriores do G-20 em Londres e Toronto, os Estados membros não as traduzirem em ação.

Uma vez que os EUA estão menos capacitados para desempenhar o papel principal na gestão da economia mundial, de algumas maneiras, a responsabilidade passou agora para o G-20, com os EUA e a China na vanguarda, de definir um rumo de colaboração e coordenação, tanto em palavras como em ações, capazes de orientar o crescimento econômico mundial no século XXI.

Se os líderes do G-20 não aceitarem essa responsabilidade e em vez disso optarem pelo caminho do nacionalismo econômico, o futuro poderá ficar sombrio.

Jamie F. Metzl é membro do Conselho de Segurança Nacional do presidente Bill Clinton e vice-presidente executivo da Asia Society

Zachary Karabell é presidente da RiverTwice Research. Os dois atuaram, respectivamente, como coordenador de projeto e diretor de projeto da Asia Society Task Force para reequilíbrio econômico mundial. Copyright: Project Syndicate, 2010.