Título: Como movimentar 1 bilhão de toneladas
Autor: Pires, Fernanda
Fonte: Valor Econômico, 17/11/2010, Especial, p. F4

Para o Valor, de Santos Mola mestra do comércio exterior brasileiro, o sistema portuário vive o desafio de trocar a roda com o carro andando. Ao mesmo tempo em que os portos tentam deslanchar obras para dar conta de um fluxo comercial que evoluiu de 506 milhões de toneladas, em 2001, para prováveis 760 milhões de toneladas neste ano, têm de se preparar para uma demanda futura de cargas que se calcula promissora. A Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP) estima que em quatro anos esse volume chegará a 1 bilhão de toneladas, turbinadas especialmente pelo crescimento do agronegócio e mineração. Mas a longo prazo o montante ainda é imensurável. Diante desse panorama, o governo desenvolve o Plano Nacional de Logística Portuária (PNLP), um diagnóstico com horizonte de 20 anos lastreado numa estimativa de crescimento anual da economia ainda não revelada, mas que deverá girar em torno de 5%.

O PNLP terá como principal subproduto, em 2012, o plano diretor dos 12 portos-chave do país: Rio Grande (RS), Itajaí (SC), Paranaguá (PR), Santos (SP), Rio de Janeiro, Itaguaí (RJ), Vitória (ES), Salvador, Aratu (BA), Suape (PE), Pecém (CE) e Vila do Conde (PA).

O trabalho, a cargo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), está sendo acompanhado de perto pelo porto de Roterdã, reconhecido pela expertise no desenvolvimento desse tipo de ferramenta, recentemente utilizada no porto de Sohar (Omã).

A primeira fase do PNLP trará a radiografia do atual sistema e será entregue no fim deste mês, seguido por um plano emergencial para os portos. A real dimensão da projeção de volumes virá somente em março de 2011.

"Queremos montar, a partir desse diagnóstico, quais as necessidades de investimentos públicos e privados. Não só dos portos, mas também de plataformas logísticas, ferrovias, rodovias, hidrovias, todas as alternativas necessárias para aumentar a eficiência", diz o ministro da Secretaria Especial de Portos (SEP), Pedro Brito. Ele inclui o estudo em uma visão sistêmica de cadeia logística. "O setor portuário é o elo que está em melhor condição de atender ao crescimento da economia", afirma, ao contrário do que as recentes filas de navios à espera para atracar e de caminhões nos acessos viários fazem supor.

"O que vimos no passado recente é que até 2003 a corrente de comércio brasileira estava estagnada na casa dos US$ 100 bilhões. Hoje, estamos perto de US$ 400 bilhões, e os portos estão dando conta do recado", pondera Brito.

Sem dúvida, houve avanços, dizem os especialistas. Mas ainda há muitas carências. Recente mapeamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou que o sistema portuário nacional necessita, na atualidade, de investimentos da ordem de R$ 42,88 bilhões para 265 obras. São R$ 2,78 bilhões para gargalos de dragagens e derrocamentos; R$ 17,29 bilhões para acessos terrestres (rodovias e ferrovias); R$ 20,46 bilhões para ampliação, recuperação e construção de portos públicos; e R$ 2,34 bilhões para demais obras de infraestrutura, como energia elétrica, esgoto, fornecimento de água e adequação a normas de segurança. "Com exceção de alguns investimentos privados em construção de novos portos e terminais, algo em torno de 90% dos investimentos estão na esfera pública", destaca o coordenador de infraestrutura econômica da instituição, Carlos Alvares da Silva Campos Neto.

O Programa de Aceleração do Crescimento (2007-2010) destacou R$ 2,7 bilhões aos portos brasileiros e a segunda etapa (2011-2014) promete R$ 5,1 bilhões. A carteira de projetos públicos já contratados soma R$ 4,5 bilhões, 57,6% do previsto para ser executado até o horizonte estabelecido pelo PAC 2.

Pouco mais de R$ 1,5 bilhão está destinado ao Programa Nacional de Dragagem (PND), que visa aprofundar 18 portos do país até 2012. Somente com essas obras a capacidade de movimentação dos complexos marítimos aumentará em 30%, calcula o governo.

"As dragagens têm atraído os investimentos privados do mundo inteiro para os portos brasileiros, reduzido os custos dos fretes marítimos para o Brasil e estimulado a expansão da cabotagem (navegação doméstica)", afirma Brito. Das 18 obras, 13 foram iniciadas e três estão concluídas (Recife, Rio Grande e Angra dos Reis).

Ao fim do PND, o Brasil contará com quatro portos concentradores, eleitos em termos de profundidade-zona de influência. São os casos de Santos, Rio Grande, Pecém e Suape. A partir deles, a carga poderá ser redirecionada em embarcações menores para os demais portos. Uma necessidade cada vez maior do país para reduzir a dependência do transporte rodoviário. Hoje, cerca de 60% da movimentação de mercadorias é feita sobre rodas, ante 13% do modal aquaviário.