Título: Parecer da AGU congela R$ 6 bilhões
Autor: Fontes, Stella
Fonte: Valor Econômico, 18/11/2010, Empresas, p. B7
De São Paulo O parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que limita a compra de terras rurais por investidores estrangeiros e empresas com controle fora do país levou à suspensão de pelo menos R$ 6 bilhões em investimentos florestais no Brasil. A estimativa é da Associação Brasileira de Florestas Plantadas (Abraf) e leva em conta aportes congelados por fundos de investimento - somente um deles cancelou a aplicação de US$ 250 milhões -, de produtoras de celulose, papel e painéis de madeira e siderúrgicas, ou fornecedores dessas companhias, que investem em florestas plantadas para produção de carvão vegetal. "Entendemos a preocupação do governo, no sentido de proteger as propriedades nacionais. Mas é preciso diferenciar capital especulativo de investimento produtivo estrangeiro", afirmou o diretor executivo da Abraf, César Augusto dos Reis. O parecer, que entrou em vigor na segunda metade de agosto, é tratado como tema delicado no setor de celulose e papel e painéis de madeira. Para executivos das maiores companhias atuantes no país, a posição do governo federal é "compreensível, porém abrangente demais", e pode levar à transferência de futuros projetos para outros países. Aprovado pelo Presidente da República após dois anos de espera por conta da crise (veja texto ao lado), o parecer tem status legal de decreto e restabeleceu as limitações já previstas na Lei 5.709, de 1971. Dessa forma, empresas sob capital estrangeiro não estão mais autorizadas a adquirir no país imóveis rurais com área de 250 a 5 mil hectares (ou mais de 50 módulos de exploração indefinida), de acordo com a região. Além disso, as áreas pertencentes a essas companhias não poderão ultrapassar 25% da área do município.
Na International Paper (IP), uma das maiores produtoras mundiais de papel e dona de três fábricas no país, a medida teve repercussão negativa e levou à interrupção de estudos sobre novos investimentos na região. "Isso (o parecer) vai fazer com que o Brasil perca muitos investimentos", avaliou recentemente o principal executivo da companhia na América do Sul, Jean-Michel Ribieras.
A restrição ao investimento estrangeiro em terras rurais, conta o vice-presidente da Stora Enso América Latina, Otávio Pontes, também gerou inquietação no comando da companhia sueco-finlandesa, uma das maiores papeleiras europeias e sócia no Brasil da Fibria na Veracel, produtora de celulose branqueada de eucalipto instalada no sul da Bahia. "Investimentos futuros no país podem estar comprometidos", disse. Os projetos atuais da companhia na região, um de duplicação da capacidade da Veracel e outro no Uruguai - que envolve a compra de terras em região de fronteira -, não foram atingidos pelo parecer. Ainda assim, a mudança nas regras causou mal-estar. "O que falta mesmo é regulamentação", avaliou o executivo.
Para José Leal, principal executivo e um dos fundadores da Brazil Timber, o impacto do parecer é mais "psicológico" do que técnico. A gestora de fundos florestais administra hoje US$ 250 milhões e iria duplicar o tamanho da carteira ainda neste ano, não fosse a publicação do parecer. O contrato, de US$ 250 milhões com um fundo de pensão americano, já estava assinado, mas foi cancelado quando os estrangeiros souberam da medida. "Enquanto houver incerteza, eles não vão aplicar no país", contou.
Conforme Reis, da Abraf, fundos florestais foram justamente os mais atingidos pelo parecer. Dos R$ 6 bilhões em investimentos "congelados" após a decisão do governo, 40% correspondem a aportes desse tipo de investidor. "O problema é que o capital nacional nem sempre é suficiente para tocar todos os empreendimentos necessários para garantir oferta crescente de madeira", disse. A entidade já participou de audiências na Casa Civil e no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e solicitou outra, agora com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a fim de sensibilizar o governo federal sobre a questão. "Nossa postura não é beligerante. Reconhecemos que a preocupação do governo é legítima, mas o leque (da proibição) ficou amplo demais", explica Reis.