Título: Dutra recebe a missão de conter o PT no governo
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2010, Politica, p. A7
Um dos principais desafios ao PT, que assume em janeiro seu terceiro mandato presidencial, será como se conduzir na ampla coalizão de partidos que apoiaram a presidente eleita Dilma Rousseff. E sem Luiz Inácio Lula da Silva para mediar conflitos com o partido, tal como ocorreu até agora.
Durante esse período de transição, o presidente nacional do PT, José Eduardo Dutra, foi escalado para conter o ímpeto dos aliados, seu partido inclusive. "Esse é um trabalho técnico, que naturalmente tem uma supervisão política. A questão da composição de governo está sendo feita através de conversas minhas com os diversos partidos, e que depois quem vai definir essa questão será a presidente da República", disse.
Quarenta e oito horas depois de eleita pela coalizão de dez partidos - com o apoio informal de PP e PTB - Dilma começa a enfrentar os primeiros desgastes. O PMDB reclamou que, da primeira reunião de transição, realizada na manhã de segunda-feira, só participaram petistas. O líder do PP na Câmara, João Pizzolatti (SC), avisou que Dilma deverá levar em conta que 90% do partido a apoiou tanto no primeiro quanto no segundo turno.
O governador reeleito de Pernambuco e presidente nacional do PSB, Eduardo Campos, disse que jamais vai pressionar o governo Dilma em busca de cargos. Mas alertou para o crescimento de seu partido, que elegeu seis governadores, quatro senadores e aumentou de 27 para 34 o número de deputados, deixando claro que a relação com o PT terá de ser outra. "Governaremos 15% do eleitorado nacional, praticamente o mesmo percentual de eleitores que serão administrados pelo PT", afirmou Campos.
O governador eleito do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), concorda que o PT terá de se conter e perceber que é apenas mais um dentro do "condomínio que elegeu Dilma Rousseff". Quando era ministro da coordenação política, entre 2006 e 2007, Tarso Genro foi um dos responsáveis por levar o PMDB para o governo. "Lula é maior do que os partidos, Dilma, não. Ela foi eleita pela força da coalização. Todos os partidos, não apenas o PT, serão mais exigentes daqui para a frente", resumiu o governador eleito do Rio Grande do Sul.
Para o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, os primeiros anos do governo Lula foram fundamentais para o amadurecimento do PT. Apesar da força lulista, o partido manteve, em muitos momentos, posições duras contra o governo, especialmente quanto à manutenção da política econômica herdada de Fernando Henrique Cardoso. "Os dois primeiros anos de governo foram muito difíceis, o PT não sabia o que era ser governo. Mas essa questão hoje está superada", acredita Bernardo.
Mas o PT continua o mesmo e começa a se movimentar na esperança de não ser mais um na coalizão governista. Para um deputado reeleito pelo partido, as queixas e movimentações veladas ou explícitas feitas por militantes petistas não estão relacionadas à visão de que Dilma é mais forte ou mais fraca do que Lula. "É uma busca de espaço no governo. Quem falar mais alto agora tenderá a ter mais voz no futuro", afirmou esse petista.
Para esse deputado, Dilma pode até ser uma figura menor do que Lula, mas o ex-presidente será sempre seu fiador, e poderá intervir nos momentos em que o quadro começar a se deteriorar. "Imagine que vergonha uma reunião do PT convocada por Lula para nos dar bronca", disse.
Governador reeleito pela Bahia, Jaques Wagner disse que Lula terá uma presença forte, com base nos 80% de aprovação obtidos em seu governo e pela trajetória partidária que desempenhou desde a fundação do PT, em 1980. Dilma entrou no partido em 2001, egressa do PDT e só "assumirá a caneta e o cargo" a partir de janeiro. "Mas ela demonstrou muita força e competência em todos os papéis que assumiu. Conseguiu algo que não é fácil, angariar a simpatia de Lula. Talvez ela possa vir a se transformar em uma figura tão forte quanto ele", disse Wagner.
Ex-ministro da Casa Civil e ex-presidente do PT, José Dirceu causou polêmica durante a campanha ao afirmar que, em um governo Dilma, "o PT vai mandar mais do que mandava durante o governo Lula". A declaração foi feita durante reunião com sindicalistas baianos e provocou desconforto com o PMDB. Depois do primeiro discurso da presidente eleita, na noite de domingo, no Hotel Naoum, em Brasília, Dirceu negou que o PT vá levar problemas para a futura presidente. Mas lembrou que a legenda não pode ser avaliada pelo mesmo critério dos demais integrantes da coalizão, tem que ser diferente. E a voz de Dirceu é a voz da militância e da direção. "Elegemos 88 deputados, 11 senadores e cinco governadores de Estados importantes, como Bahia e Rio Grande do Sul", completou.