Título: Planos incluem viagens, palestras e reforma política
Autor: Basile , Juliano ; Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2010, Politica, p. A12

Iniciar um debate sobre a reforma política, viajar pelo Brasil e exterior fazendo palestras ou divulgando o que considera os êxitos de sua gestão em fóruns sociais e empresariais. Essas são algumas sinalizações de assessores do presidente de como será o futuro de Luiz Inácio Lula da Silva após deixar o cargo, por volta das 17 horas do dia 1º de janeiro de 2011. Apenas sinalizações, porque o presidente ainda não assimilou a ideia de que os oito anos estão próximos de chegar ao fim. "Um dia, a ficha vai cair", disse ele a um ministro com gabinete no Palácio do Planalto.

Em pelo menos quatro oportunidades, na semana passada, Lula chorou ao afirmar que seu governo está acabando. Em uma festa de aniversário organizada pela militância petista na frente do Palácio da Alvorada, na quarta-feira, 27 de outubro, disse que, a partir de janeiro, "veria o país pelos olhos da militância, ouviria as queixas do país pelos ouvidos da militância e caminharia pelo país com as pernas da militância". Para um servidor que acompanhou o presidente nesses oito anos, a transição será dolorosa. "Ele não tem gosto pelo poder. Ele tem vício."

Depois de um período de descanso em São Bernardo do Campo, "para tomar uísque", com a mulher Marisa Letícia, os filhos e os netos, Lula pretende retomar as viagens pelo Brasil e exterior. Vai difundir os programas sociais adotados na sua gestão e que considera eficazes na inclusão social dos menos favorecidos.

Como ex-presidente, também deve receber convites para dar palestras e participar de conferências e seminários. O que Lula deixou claro é que não pretende dar palestras pagas, numa crítica indireta ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. "Lula não quer ser sustentado por empresários", afirmou um ministro próximo do presidente.

Lula sempre defendeu que os ex-presidentes recebessem, de maneira vitalícia, o salário que tinham quando estavam no cargo. Mas que deveriam abrir mão dessa pensão em caso de retorno à vida pública. A pensão vitalícia é paga nos Estados Unidos, na França e no Reino Unido. Aqui, o benefício foi extinto em 1988. Ex-presidentes têm direito a dois carros oficiais com motorista e despesas pagas, quatro servidores para trabalhar em sua segurança e apoio, e dois assessores com salário de R$ 9 mil cada um.

Quanto ao instituto que pretende criar após deixar o cargo para guardar seu legado e seus presentes, o presidente não deu sinais claros de quando pretende vê-lo em funcionamento. "Tem gente cuidando disso para ele, mas Lula guarda segredo sobre o assunto", disse um auxiliar.

Como grande bandeira, Lula pretende trabalhar pela reforma política. Na visão de Lula, um presidente não pode tratar desse tema, "porque está preocupado com a governabilidade". Por isso, a discussão tem que ser feita por fora, para buscar consensos. "Mas com muito cuidado para não constranger quem estiver no Planalto", confidenciou o ministro.

O mesmo cuidado Lula terá para deixar a sucessora, Dilma Rousseff, com espaço para governar. "Ela foi eleita, é ela quem vai tomar as decisões, comemorar os acertos e assimilar os erros. Afinal, um presidente também tem o direito de errar", afirmou Lula a um de seus conselheiros.

Apesar de ter indicado Dilma como candidata a presidente sem submeter sua escolha ao crivo do PT e ter sido seu maior cabo eleitoral, os petistas afirmam que Lula será um conselheiro privilegiado, mas não tutelará Dilma quando ela assumir o cargo. "Quem tem a caneta na mão jamais é ofuscado", resumiu um ministro político. Mesmo tendo dito em sua coluna semanal "O presidente responde" do dia 26 de outubro que também se dedicaria a debater a reforma tributária, auxiliares próximos do presidente veem isso como mero exercício de retórica. "É um assunto de varejo, técnico, que implica discussão direta com empresários. Lula não tem paciência para isso, nunca teve". (PTL)