Título: Vitória republicana nos EUA deixa incerto futuro de negociação climática
Autor: Chiaretti, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 05/11/2010, Especial, p. A16

De São Paulo

"Há uma sombra pairando sobre tudo isso agora", diz uma autoridade do governo brasileiro referindo-se às negociações internacionais por um tratado climático depois da impressionante vitória republicana nos Estados Unidos. "A pergunta que está no ar, e que certamente estará no ar em Cancún, é: e agora? Vai-se adiante ou não com o acordo?".

A retumbante vitória republicana e a consequente retração da agenda climática (e talvez também ambiental) nos EUA, joga uma pá de cal na combalida contribuição americana ao processo. "A Europa talvez tope continuar. Mas será que o Japão topa? O Canadá topa?" questiona o brasileiro.

Imaginava-se que o Executivo dos EUA poderia cumprir a meta proposta pelo presidente Barack Obama em Copenhague - reduzir as emissões em 17% em 2020, sobre os níveis de 2005 - e que o Senado americano não deixou passar. Os cortes de emissões poderiam ser feitos via regulamentação da EPA, a agência ambiental americana, por exemplo, ou pelo esforço de investir mais em energias renováveis para o país ficar menos dependente do petróleo. "Mas a parte do financiamento, dos recursos prometidos para a adaptação à mudança climática, isto, sem o Congresso, não dá", preocupa-se o político brasileiro.

Em Copenhague, a secretária de Estado Hillary Clinton disse que os EUA ajudariam no esforço de investir US$ 100 bilhões ao ano, a partir de 2020, para mitigação e adaptação aos efeitos da mudança climática. O compromisso também está no Acordo de Copenhague, o polêmico documento que saiu da conferência e que foi referendado por cerca de 140 países, incluindo os EUA e os países do Basic - Brasil, Índia, China e África do Sul.

Um horizonte mais positivo para o acordo do clima pode surgir do relatório proposto por um grupo gabaritado de especialistas que trabalhou este ano em sugerir fontes de onde os recursos para o fundo de US$ 100 bilhões poderiam vir. O resultado seria divulgado hoje pela manhã em Nova York ao secretário-geral das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon. São 35 páginas produzidas por gente como o megainvestidor George Soros ou o economista britânico Nicholas Stern. O Brasil foi representado pelo embaixador Pedro Luiz Carneiro de Mendonça, negociador do Brasil no G-20, o grupo das maiores economias.

O estudo elenca fontes diversas. Um mecanismo propõe reduzir as emissões da aviação internacional e do transporte marítimo. Dependendo do preço da tonelada de carbono, o setor poderia responder por US$ 25 bilhões anuais. "Um percentual sobre o leilão de licenças para emitir seria outra fonte possível. Se o preço do carbono chegar no futuro a US$ 50 a tonelada, poderiam vir daí até US$ 70 bilhões", diz Mark Lutes, coordenador de política de finanças para clima do WWF.

"Uma análise do relatório mostra que é possível e factível mobilizar US$ 100 bilhões anuais em dinheiro público", diz. O relatório também indica como alavancar recursos privados adicionais, aponta Lutes. Um mecanismo discutido - mas ainda não aprovado - é uma taxação sobre operações financeiras internacionais. "Dependendo de qual transação seria incluída, este imposto poderia gerar centenas de bilhões de dólares para desenvolvimento e clima", diz Lutes. (DC)