Título: Ciro é incorporado à campanha de Dilma
Autor: Lyra , Paulo de Tarso ; Borges , André
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2010, Politica, p. A7

Eleições: Aliados criticam excessiva concentração de petistas no comando e pressionam por participação

O deputado Ciro Gomes (PSB-CE) é o mais novo integrante da coordenação política da campanha de Dilma Rousseff à Presidência. O anúncio foi feito ontem pela própria candidata, após reunião com Ciro, os governadores eleitos do Ceará (Cid Gomes), de Sergipe (Marcelo Déda) e de Pernambuco (Eduardo Campos), e o senador eleito pelo Piauí, Wellington Dias. Na avaliação do comando da campanha e do governo, além de ter bom trânsito com parte do eleitorado de Marina Silva (PV), Ciro é experiente, leal a Dilma e exercerá papel essencial neste momento de polarização direta ao candidato do PSDB, José Serra. "Ciro já mordia o Serra, vai morder muito mais. Ele não pode falar as coisas sozinho, mas, em equipe, tem condições de oxigenar o discurso deste segundo turno", avaliou um ministro ouvido pelo Valor.

Além disso, o gesto representa uma recomposição política da base aliada, já que Ciro e Dilma se distanciaram após o PSB abrir mão da candidatura presidencial própria para apoiar o projeto do PT. "É um sinal de humildade do PT em fazer o convite, e de Ciro ao aceitar", completou um integrante da executiva do PSB.

O convite a Ciro foi reflexo direito da reunião ocorrida na manhã de ontem no Palácio da Alvorada, com Lula, governadores senadores vitoriosos no domingo. No encontro, apesar do otimismo sobre a nova disputa com o PSDB, houve diversas análises críticas ao desempenho no primeiro turno. Uma das conclusões foi a de que a campanha precisava deixar de se restringir ao PT e abrir mais a outros segmentos políticos.

O parlamentar cearense, que coordenou a reeleição do irmão, Cid Gomes ao governo do Ceará, é o único não-petista no grupo composto por José Eduardo Dutra, José Eduardo Cardozo e Antonio Pallocci. De acordo com pessoas próximas à Dilma, a excessiva concentração no PT foi baseada em uma avaliação equivocada, de que a vitória em primeiro turno estava assegurada, o que liberava os aliados - Ciro dentre eles - para se preocupar apenas com as questões pessoais e locais.

A reunião do Alvorada constatou também um problema na propaganda política de Dilma, que, sempre bem elaborada, muitas vezes chamava atenção mais pela grandiosidade estética do que pela apresentação de propostas. Lula cobrou que as peças de propaganda eleitoral, a partir de agora, sejam "menos superproduções e mais diretas" na polarização com o governo Fernando Henrique Cardoso.

Logo após o anúncio de Ciro, Dilma afirmou que o segundo turno é uma ótima oportunidade para o eleitor conhecê-la melhor. "Teremos mais condições de mostrar que representamos um programa que trouxe mudanças para o país e que meu adversário representa a volta ao passado". Ciro concorda com Dilma e acha que o recado do eleitor foi bastante explícito. "O segundo turno foi uma excelente decisão que o povo tomou. O que o povo quis dizer é que quer mais explicações, mais humildade", afirmou.

Dilma reforçou um tema que deu certo em 2006, no segundo turno entre Lula e Geraldo Alckmin: as privatizações. "Essa é a principal bandeira deles, enquanto a minha é proporcionar ao Brasil uma nova era de prosperidade, com mais emprego e crescimento econômico". Ela não se esquivou da polêmica sobre a defesa do aborto. "Sempre fui uma defensora da vida", insistiu, e garantiu respeitar todos os credos religiosos, embora de formação católica.

Mesmo sem se licenciar do cargo, Lula pretende manter intensa participação na campanha de Dilma. O governador de Sergipe, Marcelo Déda, considera natural a ausência de uma declaração pública do presidente após o primeiro turno das eleições presidenciais. "Ele é a nossa principal liderança política, mas sabe que a candidata é a Dilma, não ele", declarou Déda. Para o ministro da coordenação política, Alexandre Padilha, "o presidente vai se envolver integralmente na campanha de sua candidata e vai participar de toda a campanha, dentro daquilo que a lei permite", disse o ministro.

Não está descartada a possibilidade de Lula conversar diretamente com Marina Silva - algo que não acontece desde que ela deixou o Ministério do Meio Ambiente, em 2008 - para tratar da possível aliança do PV com a plataforma de Dilma. Segundo Padilha, a coordenação de campanha de Dilma já botou em prática a estratégia para buscar a aliança com Marina. A candidata verde já recebeu telefonemas de Dilma. A oposição também agiu, com um telefonema do ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso.

Questionado sobre a corrida do PSDB em busca de uma aliança com Marina, o ministro de relações institucionais, Alexandre Padilha, ironizou a atuação de Fernando Henrique como interlocutor entre os tucanos e o PV. "Toda vez que o Fernando Henrique entra na campanha a gente comemora", disse.

Para o comando da campanha, os votos dados à candidata do PV serão buscados mesmo sem um anúncio oficial de apoio por parte de Marina ."Estamos confiantes de que vamos colher o que plantamos nesses oito anos e que o povo brasileiro vai optar pela continuidade desse caminho", comentou Padilha.

A aproximação com os eleitores do PV será marcada pelo aumento de espaço dado às discussões ambientais dentro do programa de Dilma. Presente no encontro com Lula, o governador reeleito de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) afirmou que os eleitores de Marina "têm muito mais relação com valores que o presidente Lula incentiva", mas que eles quiseram dar "uma lição ao governo" para que houvesse mais discussão e espaço para o debate.

"Nós chegamos a 47% dos votos, faltam só 3%. O Brasil vem demonstrando que quer uma mulher como presidente e o eleitorado que votou em Marina tem muito mais identidade com nossa história", acredita Campos. O mais novo coordenador da campanha presidencial petista considera pequenas as chances de Marina declarar, pessoalmente, seu apoio a Dilma ou José Serra (PSDB).

O mais provável, segundo Ciro, é que Marina tome uma posição neutra em relação aos candidatos. Segundo o deputado, parte da cúpula do PV já foi cooptada por Serra. Em Estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, o PV tem mais proximidade com a bancada tucana do que com o PT.