Título: Sob pressão, governo deve adiar leilão do trem-bala
Autor: Borges, André; Bitencourt, Rafael
Fonte: Valor Econômico, 26/11/2010, Brasil, p. A5

O governo federal deve adiar a realização do leilão do trem-bala, marcado para acontecer na próxima segunda-feira. A decisão será anunciada hoje pelo ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos. A pressão para que a data de recebimento de propostas seja prorrogada deixou o governo acuado. Nos bastidores, avalia-se o peso político de levar adiante o projeto sem que mais discussões sejam realizadas. O que se teme é que a fuga generalizada dos consórcios interessados e a apresentação de um único grupo interessado - o consórcio sul-coreano - possam gerar um saldo negativo para o fim do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A grita é geral. As empresas, que são as maiores interessadas no negócio avaliado em R$ 34 bilhões, fizeram coro para pedir o adiamento, com exceção do consórcio coreano, único disposto a apresentar uma proposta. As associações que representam o setor e que apoiam o projeto pediram a prorrogação do leilão.

O Ministério Público Federal no Distrito Federal também enviou recomendação à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para que suspenda, imediatamente, a licitação. Hélio Mauro França, superintendente-executivo da agência, disse que o órgão regulador recebeu ontem mais dois pedidos de impugnação do edital do trem-bala.

"Houve duas manifestações que chegaram à ANTT com razões distintas solicitando que fosse suspenso o edital e que fossem corrigidos determinados aspectos", afirmou França, que alegou não poder revelar os interessados e suas motivações. Entretanto, ressaltou que o pedido não partiu dos consórcios competidores, mas de representantes da sociedade.

A obra, afirma a procuradora da República Raquel Branquinho, está minada de deficiências técnicas e não possui um projeto básico que apresente elementos suficientes para garantir a sua viabilidade. Em sua recomendação, o MPF afirma que o Tribunal de Contas da União (TCU) - que numa primeira etapa aprovou, com ressalvas, o edital - não analisou questões essenciais da obra, como custo e demanda. "Estamos certos do que pedimos e temos esperança de sermos atendidos, mas se for necessário levaremos o caso à Justiça", disse a procuradora.

No Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Ellen Gracie é a relatora da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) apresentada pelo PPS contra a Medida Provisória 511, que garantiu o repasse de financiamento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) à empresa que vencer o contrato do trem de alta velocidade (TAV).

"Do jeito que está, o projeto é um absurdo, não tem condições de ir para frente sem que seja exaustivamente discutido ", diz o deputado federal Raul Jungmann (PPS-PE), que assina a Adin. Segundo Jungmann, o governo será chamado pelo STF para dar explicações sobre o financiamento de R$ 20 bilhões que o BNDES deve repassar para o consórcio vencedor.

Ontem, o presidente da ANTT, Bernardo Figueiredo, recebeu em Brasília representantes da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer). A associação pede que o leilão seja adiado em seis meses. Principal entusiasta e defensor do projeto, Figueiredo também discutiu o assunto no Palácio da Alvorada com o presidente Lula da Silva e o ministro dos Transportes. Para o presidente da Abifer, Vicente Abate, o governo recebeu bem as demandas do setor. "Tivemos uma boa conversa e acreditamos que nosso pedido será atendido", disse o executivo.