Título: O despertar do dragão
Autor: Monteiro, Luciana
Fonte: Valor Econômico, 01/12/2010, Investimentos, p. D1

O dragão da inflação voltou a entrar na conta do investidor. Poucas são as aplicações financeiras que conseguem ter retornos positivos no ano quando descontada a alta de preços medida pelo Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M). Em novembro, o indicador subiu de 1,45%, o que contribuiu para a deterioração nas expectativas para a inflação não apenas neste ano, mas também nas projeções para 2011. No acumulado do ano, a alta do IGP-M já chega a 10,56%.

Segundo estimativas da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), os fundos DI devem encerrar o mês com ganho nominal de 0,82%, acumulando no ano rentabilidade de 8,89%. Já carteiras de renda fixa devem ter rendimento médio de 1,02% em novembro e, no ano, de 10,51%. As duas aplicações, porém, perdem quando descontado o IGP-M. A poupança fica ainda mais para trás, com perda real de 3,93% em 2010.

Novembro foi marcado por muita volatilidade nos mercados, o que fez com que os investidores buscassem proteção no ouro, que subiu 6,25%, liderando as aplicações financeiras. O metal é o único a superar com folga a inflação. O ouro subiu 37,10% este ano. Descontada a variação do IGP-M, acumula alta de 24% em 2010. E, com a piora do humor, o dólar se valorizou 0,65%, embora no ano ainda registre queda nominal de 1,66%.

Os temores com o possível aperto monetário na China, por conta da inflação mais alta, e as preocupações com a solvência da Irlanda trouxeram perdas para a bolsa. O Índice Bovespa encerrou o mês em queda de 4,20%. Com isso, a bolsa teve o pior novembro da década. Em 2000, o tombo naquele mês foi de 10,63%. No acumulado do ano, a queda é de 1,29%. Levando em conta o juro real, ou seja, descontada a inflação, a perda é 10,71%.

A piora na inflação fez com que alguns analistas passassem a trabalhar com uma alta de juros ainda em dezembro, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne nos dias 7 e 8. As estimativas para o IGP-M deste ano, por exemplo, subiram de 10,89% para 11,01%, conforme o último boletim Focus. Para o próximo ano, a projeção é de 5,33%. Já para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) - que é o indicador oficial de inflação -, as expectativas subiram de 5,58% para 5,72%, configurando a 11ª alta consecutiva das projeções do mercado. Para 2011, a expectativa passa de 5,15% para 5,20%. Nos dois cenários, a inflação fica acima do centro da meta, de 4,5%.

Com isso, os papéis atrelados à inflação ganham terreno, ressalta Otávio Vieira, diretor de investimentos da Safdié Gestão de Patrimônio. Segundo dados do Tesouro Direto, as Notas do Tesouro Nacional série C (NTN-C) - que pagam juros além da variação do IGP-M - com vencimento em março de 2011 renderam 2,04%, sendo os papéis mais rentáveis em novembro, segundo o site do Tesouro Direto. Esses títulos, porém, não são mais vendidos. Já as NTN-Bs (ligadas ao IPCA) com vencimento em maio de 2011 renderam 1,11%.

A deterioração nas expectativas para a inflação fez com que a XP Investimentos alterasse suas projeções para a Selic para o ano que vem, conta Rossano Oltramari, analista-chefe. A instituição trabalhava com um cenário de manutenção da taxa básica de juros em 2011, nos atuais 10,75% ao ano. "Nossas expectativas estavam calcadas nas atas do Banco Central, que davam sinais de que a inflação iria convergir para a meta", explica ele. Com o repique inflacionário, a XP passou a acreditar em elevação de 1 ponto percentual, sendo 0,5 ponto em janeiro e 0,5 em março.