Título: Dilma nega escolha de ministro da Saúde
Autor: Lyra, Paulo de Tarso ; Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 02/12/2010, Politica, p. A12

A presidente eleita Dilma Rousseff disse ontem que ainda não escolheu o ministro da Saúde de seu governo, ao contrário do que antecipara, na véspera, o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB). Pouco antes, o vice-presidente eleito e presidente do PMDB, Michel Temer, que não foi consultado sobre a indicação de Cabral, disse que se o médico Sérgio Côrtes for confirmado, não deve ser contado na cota do partido. Ele avisou que o PMDB reivindica cinco ministérios no novo governo, além da Defesa, no qual deve permanecer o ministro Nelson Jobim, e da Saúde. O que à primeira vista parece ser uma desautorização explícita de Cabral, no entanto, pode ser apenas um recuo tático da presidente, enquanto o PMDB resolve suas disputas internas, que não são poucas. O nome do médico Sérgio Côrtes, indicado por Cabral, não foi descartado por Dilma, mas o aparecimento de denúncias contra o afilhado do governador levaram aliados a recomendar mais cautela na efetivação do nome indicado.

Dilma fez a declaração durante uma reunião temática com representantes do setor de saúde. Escolhido como porta-voz do encontro, o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), integrante da equipe de transição e provável ministro da Justiça do governo Dilma, afirmou ao final: "A presidente eleita afirmou que ainda está analisando os nomes para a Pasta e disse que o indicado terá que aliar conhecimentos técnicos com capacidade de gestão". De acordo com o Cardozo, não foram cogitados nomes durante o encontro, apesar da presença de um dos cotados para o cargo, o cardiologista Adib Jatene.

Cabral ligou ontem para Temer para dar explicações. Afirmou não ter submetido o nome de Côrtes ao partido porque Dilma teria dito a ele que quer um técnico para a Pasta e aprecia o trabalho do secretário. Além disso, a nomeação seria "na cota pessoal da presidente Dilma".

Temer considerou "muito justo" que a nomeação seja na cota pessoal de Dilma, "como, naturalmente, entrou a Defesa: na cota pessoal da presidente".

O vice-presidente admitiu estar havendo "desconforto", "agitação" e "preocupação" no partido, nesse momento de formação de governo, por parte de setores que querem mais cargos. Pediu "calma" e disse que o PMDB terá "espaço compatível com o seu tamanho". Esse espaço, no entanto, ainda não estaria definido. Ao ser perguntado se o PMDB abriu mão do Ministério das Comunicações para o ministro Paulo Bernardo, disse que as conversas ainda estão ocorrendo e isso "depende de como se dará essa substituição por outro ministério".

Temer disse que o PMDB reivindica cinco ministérios, "o que é mais ou menos o que existe hoje". As Pastas da Saúde e da Defesa não entrariam nessa conta. Temer confirmou que a bancada do PMDB na Câmara indicará dois ministro e a do Senado outros dois. O quinto ministério reivindicado iria para a cota pessoal do próprio Temer, caso ele venha a ter esse direito. "Se eu tiver cota pessoal, eu indico um nome", disse.

Segundo Temer, as questões devem estar resolvidas no partido até a semana que vem, para que Dilma bata o martelo. "A conversa é em torno de cinco, mas sou também vice-presidente. Claro que represento os interesses do PMDB, mas tenho que compatibilizar com os interesses do governo. E os partidos todos querem ministério", disse.

O deputado considerou "manifestação momentânea" as declarações de Moreira Franco, publicadas ontem no jornal "O Globo", de que Temer está com suas funções esvaziadas na composição do governo. Segundo o presidente do PMDB, tanto Moreira, quanto o presidente do Senado, José Sarney (AP), e o líder da bancada no Senado, Renan Calheiros (AL), têm a mesma preocupação: "Não se pode correr o risco de esvaziar aquele que é interlocutor do PMDB". Com relação à sua indicação para que Wagner Rossi permaneça no Ministério da Agricultura, o dirigente pemedebista disse que o nome "é muito bem recebido" pela bancada da Câmara e bem avaliado pelo governo. Com esse raciocínio, caberia à bancada da Câmara a indicação de apenas um nome para a Esplanada.

O encontro de Dilma com representantes do setor saúde, no Centro Cultural Banco do Brasil, estava marcado para as 14h30. O evento começou na hora certa, sem a presença da presidente eleita nem de Michel Temer, que comandava uma reunião com a bancada do partido na Câmara. Os dois chegaram juntos ao CCBB, por volta das 16h30. Dilma aguardou a entrada de fotógrafos e cinegrafistas para afirmar aos presentes que não havia escolhido seu ministro da Saúde.

Participaram da reunião 35 especialistas do setor, dentre médicos, donos de hospitais e prestadores de serviço. De acordo com um dos presentes, "Dilma está bastante afiada sobre o assunto", embora mais tenha ouvido do que falado durante o encontro. Ela afirmou que a saúde brasileira sofre com dois grandes problemas: subfinanciamento e a subgestão.

Prometeu, no entanto, que na primeira parte de seu mandato vai dedicar-se à melhoria na gestão do setor. Diagnósticos levados à presidente mostram que falta pessoal e leitos em todo o país. Dilma também disse que vai buscar fontes de financiamento para suprir a falta de recursos para o setor, mas não defendeu, em nenhum momento, a recriação da CPMF. "A presidente eleita afirmou que é preciso encontrar novas fontes, mas não se comprometeu a criar novos tributos", disse Cardozo.

Após a vitória na eleição presidencial, Dilma e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomaram a discussão sobre a recriação da CPMF, extinta pelo Congresso em dezembro de 2007. Eles disseram que a saúde tinha um déficit de R$ 40 bilhões provocado pela oposição e que havia um movimento de governadores e prefeitos para ressuscitar o imposto do cheque. Após críticas de todos os lados, os governadores, principalmente do PSB, recuaram da ideia, o que levou Dilma a abandonar o assunto.

No Congresso existe uma emenda parlamentar propondo a criação da Contribuição Social da Saúde (CSS). A proposta tramita junto com a Emenda 29, que define percentuais de gastos da União, Estados e municípios com a saúde, impedindo que os administradores utilizem essas verbas para obras de saneamento e educação, por exemplo.