Título: Mercado vê alta da Selic em janeiro
Autor: Pinto, Lucinda ; Bittencourt, Angela
Fonte: Valor Econômico, 02/12/2010, Financas, p. C1

Alta dos preços das commodities, já capturadas pelos índices de inflação; emprego, renda e crédito vigorosos; preocupação com a evolução dos gastos públicos; e dúvidas sobre a autonomia do Banco Central no próximo governo. Esses elementos compõem o cenário da maioria dos analistas e justificam a aposta em aumento de juros no curto prazo. Dentre 32 economistas ouvidos pelo Valor, dois já esperam o início do aperto monetário na reunião do Copom da próxima semana. A grande maioria, 27 dos consultados, acredita que o aperto monetário terá início em janeiro. Apenas cinco trabalham com estabilidade da Selic ao longo de 2011.

O Bradesco está no grupo que representa a minoria da pesquisa e projeta, no cenário básico, estabilidade da Selic em 10,75% até dezembro de 2011, com a possibilidade de implementação de medidas na área de crédito, resultado fiscal que seja "supreendentemente" positivo e volta dos preços dos alimentos, além da manutenção das preocupações globais com o agravamento da situação europeia. "Concedemos o benefício da dúvida ao esforço fiscal sinalizado pelo governo e acreditamos que medidas macroprudenciais poderão ser implementadas na área do crédito. A confirmação dos R$ 540 de salário mínimo nos parece decisiva como sinalização para os juros", afirma Octavio de Barros, diretor do Departamento de Pesquisas Econômicas do Bradesco. Ele diz que, se os sinais forem outros, sobretudo no plano fiscal, há um cenário alternativo, de aumento de 0,50 ponto percentual a partir de janeiro em um total de 1,25 ponto, combinado com medidas prudenciais na área de crédito.

O Tony Volpon, estrategista para América Latina do Nomura Securities, também está entre os que apostam em estabilidade da Selic no próximo ano, embora reconheça que haja um "grande risco de estar errado". Ele lembra que o BC já declarou estar perseguindo a meta de inflação em horizontes mais longos. "O horizonte mais longo dá ao BC tempo para que esses choques se acomodem, sem que ele precise subir os juros", afirma. Além disso, Volpon trabalha com o cenário de que o governo irá cumprir o compromisso com a meta fiscal. "O regime de metas amadureceu e isso dará mais espaço ao BC para ignorar os choques primários de preços, que abatem outros bancos centrais no mundo também", afirma.

A maioria dos economistas, entretanto, considera que há uma deterioração importante das expectativas de inflação - base do sistema de metas -, o que justifica o início imediato do aperto monetário. E há quem diga que o BC já demorou para reagir a esse ambiente, o que pode tornar ainda mais caro o próximo ciclo. É o caso do diretor da Tandem Partners, Paulo Vieira da Cunha, que espera uma alta de 0,5 ponto da Selic em janeiro e um ciclo total de aperto de dois pontos percentuais. "O BC chegou atrasado e, assim, seria bom que a nova presidência deixasse claro o compromisso com a meta e já começasse a subir os juros na primeira reunião do ano", afirma.

Na mesma linha, está o Itaú Unibanco, que antecipou a projeção de retomada do ciclo de alta da Selic de abril para janeiro de 2011, contemplando um ajuste total de dois pontos percentuais, com a taxa alcançando 12,75% em dezembro de 2011. Em relatório, Ilan Goldfajn, economista-chefe da instituição, explica que a decisão foi tomada devido à deterioração adicional na perspectiva de inflação e da necessidade de controlar o processo de piora nas expectativas. "Reiniciar o ciclo apenas em abril resultaria em uma projeção ainda mais elevada para a inflação de 2011".

O Santanderprojeta, para dezembro de 2011, Selic a 13%, resultado de quatro elevações de 0,50 ponto e uma de 0,25 ponto. Tatiana Pinheiro, economista da instituição, pondera que o banco esperava que o ciclo de aperto monetário, iniciado em abril, fosse concluído neste ano [portanto seria maior do que 2 pontos percentuais confirmados]. Mas a inflação praticamente zero em junho, julho e agosto e as dúvidas do BC sobre o ambiente externo e os seus efeitos no Brasil levaram o Copom a encerrar o ciclo mais cedo do que esperava o Santander. "Continuamos, contudo, com a ideia forte de que havia pressão inflacionária não trivial que levaria a inflação à alta ainda maior neste ano. As indicações já estavam aí: estoque de crédito e concessões em expansão, mercado de trabalho apertado e taxa de desemprego abaixo da natural, além de reajustes salariais acima da inflação. A retomada da trajetória dos índices era questão de tempo, considerando as pressões desses fatores domésticos amplificados pelo juro real de 6%, além da política fiscal expansionista. Para nós, esse juro está abaixo do neutro que estimamos entre 7% e 8%", explica a economista.