Título: Parecer sobre a autonomia operacional do BC chega à CAE
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2010, Politica, p. A7

As incertezas em relação à autonomia operacional do Banco Central, que voltaram à tona recentemente com a notícia da transição de Henrique Meirelles para Alexandre Tombini na presidência da autarquia, deixarão de ser problema para o sucessor de Dilma Rousseff, caso seja aprovado substitutivo do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), apresentado na sexta-feira, dia 3, à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Dornelles cria o arcabouço para garantir a autonomia operacional do BC em lei, que entrariam em vigor somente a partir de março de 2015, início da gestão do presidente a ser eleito em 2014. Dessa forma, ficam preservadas as prerrogativas de Dilma. "Se estivéssemos propondo uma autonomia para entrar em vigor agora, poderíamos dar a impressão de estarmos jogando uma aura de desconfiança na presidente eleita, o que não queremos fazer", diz ele, que preside um partido da base governista.

Pelo projeto, o presidente do Banco Central será nomeado pelo presidente da República e aprovado pelo Senado Federal (o que já ocorre hoje), mas para mandato fixo de seis anos, permitida uma recondução. Os primeiros diretores nomeados sob essa lei terão mandatos de duração escalonada, de um a seis anos, de forma que a cada ano termine o mandato de um deles e haja renovação da vaga.

O objetivo é acabar com a possibilidade de demissão pela simples vontade do presidente da República. Os casos em que os diretores perderão o mandatos são listados pelo projeto: renúncia, aposentadoria compulsória, condenação judicial transitada em julgado e demissão pelo presidente, desde que justificada e previamente aprovada pelo Senado, em votação secreta, nas hipóteses de gestão que traga "grave prejuízo à economia nacional" ou descumprimento de metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

"Existe hoje o consenso de que a autonomia - chamada na gíria de "independência" - dá a segurança de que a diretoria do BC não vai tomar decisões premidas por pressões políticas momentâneas. Nos últimos anos, o Lula respeitou a autonomia do Banco Central. Mas, como ela não é garantida legalmente, sempre fica aquela tensão no ar de que o presidente pode não respeitar", afirma Dornelles.

Em sua primeira entrevista como indicado à presidência do Banco Central, Tombini disse que a presidente eleita dará autonomia operacional total e afirmou a ele que não haverá "meia autonomia". O economista, atual diretor de Normas da autarquia, passará por sabatina na CAE do Senado amanhã. Depois, sua indicação será submetida à votação na comissão e no plenário. Não há mandato fixo e a demissão é possível.

No substitutivo que classifica como "conservador" e enxuto, Dornelles afirma estar alterando a lei 4.595, de 1964, apenas no que considera essencial para garantir a autonomia do BC. São definidos como objetivos principais da autarquia a estabilidade de preços e a solidez do sistema financeiro. Além disso, o BC passa a ter a competência formal de gerir (monitorar, prevenir e controlar) o risco sistêmico do sistema financeiro como um todo, considerando inclusive operações iniciadas em instituições não financeiras - como operações de derivativos e nos mercados de capitais em geral, de seguro e de previdência -, se houver risco de repercussão em instituições financeiras.

"Uma das lições da crise é que a supervisão dos sistemas financeiros deve ser feita de forma a considerar os riscos gerados em todos os mercados do sistema financeiro, ou seja, deve considerar as possibilidades de difusão de risco de um mercado para outro. (...) Uma seguradora com problemas de solvência, por exemplo, pode comprometer os ativos de um banco, caso ela seja a garantidora de derivativos de crédito detidos por ele", diz Dornelles em seu substitutivo.

São listados os mercados que compõem o sistema financeiro: financeiro, de capitais, de seguros, de capitalização e de previdência complementar. "A definição atual é na verdade um rol de instituições componentes. Um rol vago, impreciso e incompleto", diz o senador. Ele inclui entre as instituições financeiras as empresas atuantes no mercado de cartões de crédito e débito, que, assim, ficam sujeitas à fiscalização do BC.

A proposta deixa claro tratar-se de exclusividade do Banco Central a fiscalização das condições de concorrência no SFN - para que não haja dúvida de que elas não estão sujeitas ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

O parecer do senador fluminense foi elaborado a partir da análise de projetos que tramitam em conjunto, com o objetivo de reestruturar o Sistema Financeiro Nacional. A proposta precisa ser votada na CAE e no plenário do Senado. Depois, enviada à Câmara dos deputados. Esse processo só deve começar em 2011, dando à equipe de Dilma oportunidade para opinar.