Título: Com 21 projetos, fundo de inovação do BNDES vende primeira empresa
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2010, Brasil, p. A2

Criado em 2007 com o objetivo de estimular o crescimento de empresas inovadoras nascentes, o Fundo Criatec, cujo capital é 80% do BNDES e 20% do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), acaba de fechar o primeiro ciclo de investimento em uma empresa, a cearense Usix Technology. A maioridade da empresa, do ramo de tecnologia da informação (TI) para o setor de seguros, foi ao mesmo tempo seu ocaso, vendida para a a gigante internacional Ebix (valor de mercado de aproximadamente US$ 600 milhões), de origem indiana. "Foi uma grande dúvida decidir pela venda a uma empresa estrangeira, mas era um grande negócio e não havia como impedir", disse Everton Chaves Correia, gerente-executivo da área de gestão de risco do BNB. O valor do negócio não foi revelado, mas Correia disse que foi de várias vezes o valor do investimento inicial feito na empresa cearense.

"Pela liquidez, não é tão fácil vender uma empresa no Brasil", justificou Marcelo Sena, um dos sócios na Usix, durante evento realizado no BNDES para fazer um balanço e aproximar as 21 empresas que até hoje receberam investimentos do Criatec. Ele disse que a negociação com a companhia indiana durou três meses.

Segundo Eduardo Sá, chefe do Departamento de Investimento em Fundos do BNDES, a empresa conquistou uma clientela formada pelas maiores seguradoras do país e seguirá atuando com o nome Usix. Os cinco sócios brasileiros terão que ficar por pelo menos mais três anos à frente do negócio.

"O ótimo é inimigo do bom", resumiu Sá, admitindo que o ideal seria que todas a empresas apoiadas pelo Criatec crescessem e um dia fossem a mercado. "Só que isso é hipotético. Lá fora poucas chegam a abrir o capital. Dessas 21 (que receberam investimento do fundo), talvez nenhuma chegue a abrir", disse o técnico do BNDES, justificando a decisão dos gestores do Criatec de concordar com a desnacionalização da empresa recém-amadurecida.

"Bloquear a venda poderia prejudicar o empreendedor", disse Sá. Para ele, não há frustração no desfecho da Usix, porque os empreendedores, todos voltados para inovação, pretendem partir para novos negócios quando encerrarem seus compromissos com a empresa compradora. "O importante é que a Usix vai continuar gerando emprego qualificado no Brasil", afirmou Sá, acrescentando que o movimento de fusões e aquisições é normal e que se tentasse fazer diferente o Criatec poderia "durar 40 anos e não atingir seu objetivo".

Na abertura do evento do Criatec, Eduardo Rath Fingerl, diretor das áreas de Capital Empreendedor e Meio Ambiente de Mercado de Capitais do BNDES, principal idealizador do programa, citou entre as motivações da ideia a perspectiva de fazer com que a sociedade brasileira "usufrua" da inteligência formada nas universidades do país, sem que haja "evasão de cérebros".

"Estamos há quase um século fazendo o desenvolvimento dos outros", disse Rath Fingerl, após enfatizar a esperança de que surjam no país "novos Gerdaus, novos Ermírios de Moraes", alusão às famílias que criaram e comandam dois dos maiores grupos de capital nacional do país.

O Criatec foi aprovado na última reunião de diretoria do BNDES de 2006 e seu edital foi publicado em fevereiro de 2007. O objetivo do fundo é tornar-se sócio de empresas inovadoras nascentes (capital semente) e ajudá-las a crescer, seja com capital, seja levando para dentro delas regras e conceitos de governança que assegurem a boa gestão dos empreendimentos.

Com participação média entre 30% e 40% do capital da empresa, segundo Sá (a participação exata e o valor do investimento não são informados para evitar a precificação do negócio para o mercado), o fundo partiu de 1.475 propostas recebidas, totalizando cerca de R$ 2 bilhões de demanda, para selecionar 29, das quais 21 receberam investimentos.

O objetivo é investir R$ 100 milhões até o fim do próximo ano quando termina a fase de investimentos do fundo, passível de prorrogação. As 21 empresas até agora contempladas, quase todas nascidas em incubadoras de universidades, têm como característica comum a tentativa de crescer oferecendo ao mercado produtos diferenciados, desenvolvidos a partir de pesquisas locais.

Entre elas está, por exemplo, a CVD Vale, fundada pelo pesquisador Vladimir Jesus Trava Airoldi, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com passagem pela Nasa, que desenvolveu um tipo de diamante sintético capaz de revestir, e não ser acoplado como é normal, uma ponta de metal.

Isso permite a criação de brocas mais eficientes e inofensivas a tecidos moles, que podem revolucionar atividades tão díspares, como o tratamento dentário - já existem cerca de 3 mil dentistas no Brasil utilizando o equipamento da CVD - e a perfuração de poços de petróleo na área do pré-sal.

A Petrobras está testando uma broca feita com a tecnologia da empresa de São José dos Campos. Com a associação ao Criatec, a empresa pode, por exemplo, contratar um presidente-executivo, deixando ao cientista a tarefa de mergulhar na pesquisa e desenvolvimento.