Título: Emenda beneficia envolvida em escândalo do Orçamento
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2010, Política, p. A8

O relator-geral do Orçamento, senador Gim Argello (PTB-DF), apresentou uma emenda individual de R$ 250 mil no Orçamento deste ano para o Instituto Nacional do Turismo, cuja proprietária é a empresária Wilma Magalhães, que foi presa por seu envolvimento no escândalo dos anões do Orçamento, em 1993.

Wilma Magalhães foi acusada de utilizar, entre 1992 e 1995, sua agência de turismo para realizar operações suspeitas com dólar do então deputado João Alves (PFL-BA), que acabou renunciando ao mandato. Condenada a seis anos de prisão por crime contra o sistema financeiro, ela cumpriu seis meses de pena no presídio feminino do Gama.

Neste ano, ela foi convidada por Argello para se filiar ao partido e disputar uma vaga na Câmara Distrital. A Justiça, porém, enquadrou-a na Lei Ficha Limpa e barrou sua candidatura.

Ontem, ao Valor, ela disse que já avisou ao gabinete do senador que não quer mais os recursos da emenda. "Não quero mais emendas nem pintada de ouro. Não quero saber de dinheiro público. Não quero, não gosto, tenho raiva". Sobre sua prisão, ela diz que seu advogado provou "por A mais B" a sua inocência e que ela nada tinha a ver com o escândalo do Orçamento em 1993. "Agora tenho a ficha limpa", disse. Segundo ela, seu instituto de turismo foi criado há cinco anos e faz eventos periódicos, mas ele não é o carro-chefe dos seus negócios. Ela é proprietária ainda do "Jornal do DF" e da revista "WM".

Em outra emenda apresentada por Argello também neste ano, são remetidos R$ 650 mil para o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social e Cultural (Ibdesc), cujo endereço é inexistente em Brasília. Outra emenda compartilha R$ 1,5 milhão com o Ibdesc e com a Confederação Brasileira de Convention & Visitors Bureaux, cujo endereço, na emenda apresentada no fim de novembro, está desatualizado. Uma terceira emenda tem o objetivo de levar R$ 550 mil para o Instituto Alter Ego, situado em uma pequena sala em um prédio popular no centro de Brasília. De acordo com o secretário-geral do instituto, Cláudio Oliver, "a proposta do instituto são projetos de qualificação profissional" e, da emenda, "um projeto de turismo rural no Distrito Federal". Ele afirmou ainda que o site do instituto indicado em seu cartão de visita (www.alterego.org.br) está fora do ar. "Tô precisando pagar o domínio do site", justificou Oliver. Em todos esses casos, a unidade orçamentária de origem é o Fundo Nacional de Cultura.

Em outra frente, Argello utilizou sua cota de R$ 13 milhões em emendas para transferir recursos para o Judiciário e o Ministério Público. Para o Tribunal Regional de Trabalho da 10ª Região, foram recomendados R$ 100 mil para "a cobertura de despesas com a reforma do Centro de Processamento de Dados, reforma e modernização de elevadores do edifício-sede, serviço de mudança de foro de Taguatinga e locação do prédio onde funcionará o foro de Taguatinga". Para o MP, R$ 1,8 milhão "para melhor aparelhar a Promotoria de Justiça de Taguatinga".

No Senado, integrantes da oposição começaram ontem a cobrar um posicionamento de Argello sobre as suspeitas que vem sendo levantadas pela imprensa de irregularidades na destinação de emendas parlamentares. A suspeita recai também sobre outros parlamentares. O esquema seria semelhante ao dos anões do Orçamento, com a formação de empresas de fachada para receber recursos públicos.

O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) defendeu na tribuna o fim da comissão. "Há uma reincidência de desvios denunciados na Comissão de Orçamento. Por isso, nós achamos que não basta investigar e responsabilizar parlamentares por supostas irregularidades que ocorrem neste momento. É preciso adotar uma posição radical. Particularmente, defendo - e sei que é consenso no nosso partido - a extinção da Comissão de Orçamento", afirmou.

O PPS foi além e pediu o afastamento do senador do cargo do relator do Orçamento da União de 2011. "Diante das denúncias contra o senador, torna-se incompatível sua atuação como relator do Orçamento. Caso contrário, teremos de novo o Congresso envolvido com uma CPI do Orçamento", afirmou, em nota, o presidente nacional do PPS, deputado federal eleito Roberto Freire (SP). "Num governo sério, ele já estaria fora. Se isso não for feito de forma rápida, vamos colocar em xeque toda a credibilidade do Orçamento", reforçou Freire.

Argello divulgou uma nota em que atribui a responsabilidade aos órgãos de controle e aos ministérios. "Nenhum parlamentar pode ser responsabilizado por qualquer falha na execução de um convênio. Para isso há organismos com pessoal tecnicamente habilitado e bem preparado nos ministérios, prontos a apontar e apurar erros e responsabilidades, bem como o Tribunal de Contas da União que, ao longo do tempo, vem exercendo com muita competência a sua função fiscalizadora", disse.

Declarou também que "nenhum parlamentar está legalmente obrigado, nem possui meios para fiscalizar a idoneidade de entidades ou institutos que apresentam projetos, muito menos tem motivos para desconfiar dos mecanismos fiscalizadores do Poder Executivo". "Se dúvida existe em relação aos convênios celebrados, que se ouça o convenente, ou seja, os ministérios que, até prova em contrário, têm equipes e procedimentos de altíssima competência e honestidade, e merecem a confiança de todos nós", completou.

Uma eventual investigação contra Argello, contudo, deveria ser precedida por uma reconstituição do Conselho de Ética do Senado, que foi praticamente dissolvido após a retirada da oposição com os escândalos envolvendo o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). A outra esfera de apuração, a Corregedoria, está vaga desde o falecimento do senador Romeu Tuma (DEM-SP), no fim de outubro.