Título: Os desafios da banca latino-americana
Autor: Oscar Rivera
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2010, Opinião, p. A17

O ano de 2010 fecha com avanços significativos no setor bancário latino-americano. A Felaban estima que a carteira bancária cresça quase 7 pontos percentuais do PIB regional; a carteira vencida registre uma queda de 3,2% em dezembro de 2009 para 2,8% em agosto de 2010 e que o retorno sobre o patrimônio acumulado chegue a 10%.

Isso ocorre, entre outras razões, porque a economia recuperou-se rapidamente dos efeitos negativos da crise financeira de 2009. No início deste ano, esperava-se um crescimento anual do PIB regional da ordem de 3,8% e agora quase todas as projeções são de que a região crescerá 4,3% no ano. Assim, os investidores globais estão começando a ver a região como um investimento de mais longo prazo e não apenas como um lugar onde mantêm posições voláteis de curto prazo.

Os resultados são promissores e a região tem no sistema bancário um aliado para alavancar o crescimento econômico necessário nos próximos anos a fim de gerar mais emprego e reduzir os níveis de pobreza na região.

Para manter a boa saúde financeira do sistema bancário da região, espera-se que a política macroeconômica continue prudente e responsável. Isso vai exigir que se tomem medidas adequadas no que se refere a política monetária e gasto público eficiente e financiado, quando se trata de política fiscal. Como o setor bancário doméstico é um detentor de títulos do governo na região, manter as variáveis fiscais sob controle é imperativo para a estabilidade financeira.

A banca latino-americana tem dois desafios decisivos. Primeiro, crescer e internacionalizar-se. Segundo, assistir a grande parte da população que ainda carece de serviços financeiros profissionais. Crescer requer a busca de capital fresco. Nesse aspecto, junto com o crescimento da banca, mercados de capitais domésticos deram passos importantes para o crescimento dos bancos locais. Para citar dois exemplos, temos uma capitalização de mercado do Banco Santander no Brasil (US$ 7 bilhões), em 2009 e outra do Banco Davivienda na Colômbia (US$ 220 milhões), em 2010.

O mercado intrarregional também é uma forma de expansão dos negócios e de aumento da capitalização interna, e demonstra o interesse crescente dos agentes econômicos em participar na banca de negócios. Segundo a revista inglesa "The Banker" o volume de negócios intrar-regionais saltou de US$ 1 bilhão em 2001 para US$ 49 bilhões, entre os anos de 2006 e 2010.

O crescimento do comércio entre os países da região, a aridez dos mercados internacionais, a retirada estratégica de algumas instituições internacionais da região e o aumento do comercial bilateral e por blocos fazem com que os jogadores bancários se interessem por estar nos países vizinhos.

Nesse momento oportuno, Colômbia, Chile e Peru dão passos rápidos para integrar os seus mercados de ações. Os três países têm quase 500 emissores, número superior aos 390 emissores brasileiros e aos 407 mexicanos. Dessa forma, passam a oferecer mais instrumentos financeiros de forma integrada para os investidores domésticos e internacionais. Sua capitalização será de aproximadamente US$ 400 bilhões, colocando-a como a segunda maior bolsa de valores na América Latina, atrás apenas da do Brasil.

Surge no horizonte a necessidade de entidades com maior qualidade de seu capital bancário, como resultado das recomendações feitas pelo Comitê de Supervisão Bancária da Basileia. Dentre as recomendações fala-se que os níveis de maior liquidez de capital devem ocupar uma parte maior do capital do banco no futuro. Por outro lado, os instrumentos híbridos, ou a conhecida dívida subordinada, deve ter menos peso na composição de ativos dos bancos. Isso, sem esquecer que se fala de uma demanda contracíclica de capital, cuja dimensão seria variável e teria como objetivo economizar nos momentos de bonança e gastar em tempos de crises.

Até agora, essas propostas estão apenas começando a ser discutidas no contexto das leis de cada país. Certamente, serão discutidas nos Congressos, nos bancos centrais, nas superintendências e com a opinião em geral.

Sobre esses pontos, acreditamos que ao mesmo tempo em que a discussão é válida e legítima, ela deve também ser guiada pelo bom senso para não cairmos em uma regulamentação excessiva, que terminará sendo cara e certamente sufocará o crescimento. Nesse contexto, embora a banca latina já tenha hoje o capital exigido para o ano 2019, também temos razões suficientes para dizer que essas exigências irão requerer maior esforço por parte dos acionistas. Nem o excesso de regulação, ou a falta de proteção para a estabilidade financeira são cenários desejáveis para qualquer um dos nossos países e instituições.

Outro aspecto importante a mencionar é a bancarização. A cobertura do nosso setor bancário ainda está longe do que se vê nos países desenvolvidos. Os indicadores são de que apenas entre 40% e 50% da população têm acesso a serviços bancários, deixando um grande setor à mercê da inflação e à erosão das suas poupanças e às taxas de juros no setor informal. Vale ressaltar que o crescimento da banca anda de mãos dadas com a inclusão bancária.

Obviamente, para atingir esse objetivo é importante ter um ambiente regulatório que permita o florescimento da oferta de mercado, preços e demanda. Portanto, é importante rever questões como limites máximos das taxas de juros, controle de preços e intervenção sobre as tarifas. Isso não significa que devemos abrir mão do princípio da proteção financeira do consumidor. Ao contrário, o caminho para crescer está intimamente ligado à conquista do cliente. Isso é, portanto, parte do desafio de conseguir novos clientes ao mesmo tempo em que se preservam os seus direitos.

Oscar Rivera é presidente da Federação Latino-americana de Bancos (Felaban)