Título: Ao deixar Senado, Marina defende candidatura avulsa
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 17/12/2010, Politica, p. A10

A senadora Marina Silva (PV-AC) despediu-se ontem dos 16 anos de mandato no Senado - com a interrupção de cinco anos, cinco meses e 14 dias, período em que exerceu o cargo de ministra do Meio Ambiente do governo Luiz Inácio Lula da Silva - afirmando que pretende liderar o processo em defesa de uma lei que permita candidaturas avulsas no Brasil. "Da sociedade, a exemplo do Ficha Limpa, quero liderar esse processo, para que tenhamos candidaturas avulsas no Brasil, não como ação individual, mas a partir de uma lista representativa, com registro programático, para que a gente possa oxigenar esta Casa", disse, no discurso de despedida, durante o qual emocionou-se.

Marina lembrou ter se encontrado com Lula na véspera - pela primeira vez desde que deixou o PT -, no evento de balanço dos oito anos do governo, no Palácio do Planalto. "Foi muito bom estar ali para dizer que, muitas vezes, para ficarmos juntos, a gente tem de sair da casa, morar no mesmo bairro, na mesma vizinhança. Considero que estamos no mesmo bairro, na mesma vizinhança, sim. Em cima de princípios éticos e valores duradouros, podemos fazer alianças pontuais, que se dissolvem, porque ninguém pensa o tempo todo igual", afirmou.

Marina reafirmou ter deixado o governo quando perdeu apoio político para implantar as ações estruturantes e as diretrizes estabelecidas por ela. Sobre a saída do PT, disse ter sido uma decisão "difícil", tomada porque o partido não assumiu "o desafio da sustentabilidade econômica, social, ambiental, cultural, moral, ética e, principalmente, a sustentabilidade política".

A senadora disse ter se orientado pelos valores da ética e da moral, não "numa ética de circunstâncias, de conveniência", e criticou seu partido por ter "fechado as portas" para os novos desafios. "Às vezes, pelas muitas virtudes que temos, a gente acha que já patrimonializou a ética e que já sacralizou a nossa ação. E aí começa abrir muito o espaço para o pragmatismo, porque o pragmatismo acaba também nos levando para caminhos que, muitas vezes, podem nos deixar, no mínimo, muito incoerentes com aquele que fazemos, que pensamos."

Marina fez uma avaliação de sua candidatura a presidente da República, quando recebeu 19,3 milhões de votos, e não revelou seu projeto político para o futuro. "Esse discurso aqui é o do fechamento de um ciclo de 16 anos e o da abertura de uma caminhada que tem também à sua frente o imponderável, porque é assim que nos sentimos motivados para caminhar", disse.

A senadora contou ter assumido o Senado pelo PT do Acre aos 36 anos, após exercer os mandatos de vereadora e deputada estadual. Um desafio, especialmente para uma seringueira que foi alfabetizada aos 16 anos pelo Mobral e feito supletivo de 1º e 2º graus, com formação de História. Naquela época, estabeleceu três diretrizes para seu mandato no Senado: opinião, proposição e articulação.

Após lembrar projetos aprovados no Senado e ações realizadas no governo, Marina revelou a frustração de terminar o mandato sem ter conseguido aprovar a Lei de Acesso aos Recursos da Biodiversidade, primeira proposta que apresentou e que considera a mais importante delas. "Saio daqui com essa frustração, de que o Brasil não tem uma lei para proteger e usar, com sabedoria, os 22% de espécies vivas que estão no nosso domínio territorial".