Título: Cautela na previdência
Autor: Bellotto, Alessandra
Fonte: Valor Econômico, 17/12/2010, Investimentos, p. D1

Os fundos de previdência privada aberta, que recebem aplicações de PGBLs e VGBLs, atingiram captação líquida, já descontados os resgates, superior a R$ 18,6 bilhões no ano até novembro. O volume supera em 4,2% o total captado no mesmo período do ano passado, aponta estudo da consultoria NetQuant.

As carteiras sem renda variável mantêm a posição de destaque no período - na linha do que ocorreu em 2009 -, ao atrair quase 70% do valor total, ou R$ 13 bilhões. Os fundos de renda fixa abocanharam R$ 7,9 bilhões e os multimercados sem ações, R$ 5 bilhões.

á os fundos com alguma exposição em bolsa chegaram a iniciar o ano no topo da preferência do investidor, mas perderam o ritmo. No ano, até novembro, as entradas somaram R$ 5,7 bilhões. Nesse universo, as carteiras mais arriscadas, com até 49% em ações, lideraram as entradas, com R$ 2,7 bilhões.

Nos primeiros quatro meses do ano, os fundos compostos lideraram a captação, refletindo o desempenho excepcional da bolsa em 2009 - o Ibovespa subiu 82,66% no período e o IBrX, 72,41%. Mas a queda superior a 4% da bolsa em abril espantou os investidores das carteiras com ações a partir dali.

Em maio e junho, meses em que persistiu o desempenho ruim da bolsa, as carteiras com renda variável chegaram a ter mais resgates do que aplicações. Julho também foi negativo para as aplicações nesse segmento de fundos, mas não para a bolsa. Nesse mês, o Ibovespa bateu o recorde mensal de alta no ano: 10,80%. O IBrX 50 subiu 11,56% em julho.

Essa reação da bolsa acabou trazendo de volta o investidor para fundos compostos, ainda que de maneira tímida se comparada ao início do ano. No pano de fundo, está a velha história do investidor que escolhe sua aplicação olhando para o retrovisor, aponta o gerente comercial regional da Icatu Seguros e Previdência, Sérgio Prates. "Neste momento em que a bolsa está barata, tem bons fundamentos e o Brasil vai fechar com crescimento de 8%, os fundos com ações deveriam estar captando mais", diz.

Na previdência, alerta Prates, o investidor não deveria se preocupar em acertar o momento para aplicar em bolsa, mas buscar dividir seus recursos nas várias alternativas, já que o horizonte da aplicação é mais longo. "O setor tem feito um esforço grande de educação financeira, mas a maioria ainda olha o momento."

Mesmo na Icatu, seguradora que tem uma clientela menos avessa ao risco, foram os fundos de renda fixa que mais chamaram a atenção, em especial aqueles que aplicam em papéis atrelados à inflação. O forte crescimento econômico do país trouxe de volta a pressão de preços e, consequentemente, a preocupação do investidor. "Nós sempre recomendamos ter papéis indexados ao IPCA pois, dado o horizonte de longo prazo da previdência, faz sentido ter um seguro contra a inflação", explica.

Mas, assim como o investidor é sensível ao sobe e desce da bolsa, ele passou a buscar proteção contra a inflação depois que os preços já tinham subido e essas aplicações mostrado valorizações expressivas. No ano, o fundo de previdência líder em retorno é o Icatu Seg Inflação, com ganho de 19,58% até novembro. Segundo Prates, a carteira tem títulos públicos atrelados ao IGP-M (com variação de 10,56% em 11 meses), as NTN-C, que deixaram de ser emitidas pelo governo.

Ainda no ranking dos dez fundos mais rentáveis, destaque para outro fundo da casa, o Icatu Seg IPCA, com retorno de 15,36%. Nesse caso, como o próprio nome sugere, prevalecem aplicações indexadas ao IPCA, por meio das NTN-Bs. A Icatu conta ainda com mais um fundo entre os dez mais, só que composto, com até 49% em ações. A carteira, batizada de IP-Value Hedge, é uma parceria com a tradicional gestora independente de ações IP. O fundo acumula retorno de 12,57% até novembro.

Vale destacar que a queda da bolsa só prejudica parcela das aplicações desses fundos, uma vez que a fatia de ações em previdência é limitada a 49%. De acordo com o levantamento da NetQuant, enquanto o Ibovespa registrava perda de 1,29% no ano até novembro e o IBrX, queda de 2,88%, as carteiras com até 15% em bolsa tiveram retorno de 5,69%; as com até 30% de renda variável, ganho de 4,92%; e as com até 49% em ações, mais 5,13%. Já as carteiras de renda fixa e os multimercados sem renda variável marcaram rentabilidade de 7,56% e 7,32%, respectivamente, no mesmo período.

Num horizonte mais longo, de 24 meses até novembro, o estudo mostra desempenho superior dos fundos compostos. Enquanto as carteiras com até 49% em ações acumularam ganho de 38,66% no período, os fundos de renda fixa e multimercados sem renda variável tiveram retorno ao redor de 18%. Para o presidente da Comissão de Investimentos da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), Marcos Suryan, essa visão, muitas vezes equivocada do investidor, de olhar apenas o retorno no curto prazo, só vai mudar com um trabalho educacional de longo prazo de todo o setor.

Em novembro, o setor de previdência aberta que reúne fundos PGBL e VGBL alcançou patrimônio de R$ 174,8 bilhões, crescimento de 24,21% em 12 meses, aponta estudo da NetQuant. Desse total, as carteiras sem renda variável reúnem 75% dos ativos. Os 25% restantes, que equivalem aos fundos compostos, eram 23,5% um ano antes.

Para 2011, a previdência privada aberta deve manter o ritmo de crescimento notado nos últimos anos. A principal alavanca vem do cenário macroeconômico, que tem favorecido o aumento da poupança no país. Na visão de Suryan, que também é diretor-gerente da Bradesco Vida e Previdência, a redução do nível de pobreza nos últimos anos resultou na ascensão de mais de 30 milhões de brasileiros às classes A, B e C, que se tornaram potenciais consumidores de previdência. "Esse cenário aumentou a capacidade de poupar dessas pessoas, o que deve se refletir na previdência", diz.

Estudo da Brasilprevcom dados da FGV mostra que a participação da classe C subiu de 42,36% em 2003 para 53,03% no ano passado. Já a renda nacional disponível bruta, que era de R$ 1.150 em 2000, deve encerrar o ano em R$ 3.533. Para 2014, a Consultoria Data Popular projeta R$ 5.021.