Título: Não vou ser copiloto de Dilma, diz presidente
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2010, Politica, p. A8

Dilma Rousseff será a candidata de Lula nas eleições presidenciais de 2014. "Eu trabalho com a ideia fixa de que a nossa companheira Dilma será outra vez candidata a presidente da República do Brasil. É justo e é legítimo que quem está no exercício do mandato e está fazendo um bom governo continue", disse ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no último café da manhã com os jornalistas que fazem a cobertura do palácio do Planalto. A presidente eleita só não será candidata à reeleição, segundo ele, se não quiser. E nessa eventual nova campanha, prometeu o presidente, "eu não vou ser copiloto da Dilma". Lula contou que durante uma solenidade de entrega de um prêmio, há poucos dias, o debate corrente era a sucessão de 2014. Algo que ele classificou como um desatino. "Você nem deu posse ainda [para a Dilma] e já está pensando em 2014! Quem está no governo precisa trabalhar com muito carinho para evitar que isso seja a tônica do mandato. Isso interessa a quem? Isso interessa a quem quer concorrer contra a Dilma", disse.

Lula considera que o Brasil tem todas as condições de prosseguir na rota do crescimento econômico e avalia que a presidente eleita está apta a ser condutora deste processo. Ele acha, inclusive, que a tarefa de Dilma será mais fácil do que foi a sua 2003. "Era novidade lidar com a imprensa, era novidade lidar com os ministros, era novidade conhecer o Palácio".

Hoje, ressalta, Dilma tem familiaridade com tudo isso e "conhece bem o conjunto da obra que está sendo feita no Brasil, os programas, os atores, os governadores, os principais prefeitos de capitais e boa parte dos ministros, que já estavam trabalhando com ela própria". Sobre as críticas feitas aos ministros escolhidos por Dilma, Lula brincou: "Presidente da República é como técnico de futebol, você convoca quem tem."

Lula evitou comentar a possibilidade de um aumento de juros na reunião do Copom de janeiro, a primeira que ocorrerá sob o governo de Dilma Rousseff, tendo Alexandre Tombini à frente do comando do Banco Central. "A dosagem do remédio dá quem tiver autoridade para cuidar do paciente", disse o presidente, tocando num tema que sempre foi problemático nos oito anos do seu governo, Mas acrescentou: "Eu não vou ficar nem como aqueles monetaristas, que acham que tem que aumentar juro a toda hora, e nem como aqueles que ficam na Fiesp dizendo: tem que baixar o juro!"

Lula afirmou que sempre se preocupou com a inflação, mas não demonstrou receio com as projeções mostrando uma inflação de 5,3% para 2011. "Se a meta é 4,5%, e você pode dois para mais e dois para menos, qual é o problema? Estamos na meta."

Lula também defendeu o salário mínimo de R$ 540 aprovado pelo Congresso Nacional. Disse que, se o reajuste deste ano contempla apenas a inflação, pela regra de correção encaminhada pelo Executivo ao Congresso em 2012 o reajuste será de 8% do PIB mais 5% da inflação. "A regra não pode valer apenas quando ganhamos com ela", justificou.

O presidente afirmou que pretende passar por um processo de "desencarne da Presidência da República". Segundo Lula, se ele deixar a Presidência e continuar imediatamente pensando em política, não será bom nem para ele nem para quem vai sucedê-lo. A ideia é "voltar aos poucos para normalidade e depois retomar minha atividade política, dentro e fora do PT".

Embora não tenha dado detalhes do projeto, Lula confirmou que pretende construir um memorial para mostrar sua trajetória. Ao afirmar que tem uma vida política longa, que passa pela construção do movimento sindical, das centrais sindicais, de um partido político até chegar às diversas eleições para as quais concorreu, Lula disse que ele é fruto de um longo processo de transformação da sociedade, que começou com as rebeliões estudantis da década de 60. "Eu sou resultado de uma sociedade em processo de efervescência."

O presidente afirmou que sentirá falta das amizades que fez durante o período em que foi presidente e não da piscina ou do helicóptero, como disse Fernando Henrique Cardoso em 2002. Lula, aliás, afirmou que não terá problemas em reencontrar o tucano quando deixar o Planalto, embora ache ser difícil repetir a mesma frase dita durante a posse oito anos atrás: "Você deixa aqui um amigo. Eu vou respeitá-lo e espero que a recíproca seja verdadeira."

Lula defendeu a regulação da mídia, ao afirmar que "a mídia brasileira precisa parar de achar que não pode ser criticada. Ela se dá ao luxo de criticar todo mundo, mas quando se critica a mídia, ela acha que é censura", atacou o presidente.