Título: Alta do juro: presente da China no Natal de 2010
Autor: Campos, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2010, Finanças, p. C2

A inflação preocupa e o crescimento do crédito em alguns setores é avaliado como bolha. O mercado começa a discutir a necessidade de uma elevação na taxa de juros, mas o Banco Central responde com medidas prudenciais, como restrição de crédito e aumento na taxa de depósitos compulsórios (fatia dos recursos que os bancos não podem emprestar).

Com isso, a expectativa de alta da taxa básica cai um pouco, mas de forma um tanto inesperada a autoridade monetária sobe os juros.

Não, não estamos falando do BC brasileiro, mas sim do BC chinês, que deu 0,25 ponto percentual de aperto monetário como presente de Natal para os investidores globais. O roteiro dos dois BCs diverge, apenas, no seu último ato, que por aqui deve se concretizar em janeiro de 2011.

Tal movimento da autoridade monetária chinesa acaba trazendo mais dúvidas do que certezas. Primeira, esse ajuste é suficiente ou mais aumentos estão por vir? Segunda, qual será o impacto disso na demanda chinesa e como isso pode afetar não só o crescimento do país, mas de outras nações que vinham tirando proveito da voraz demanda chinesa por commodities e outros produtos?

O fato é que em poucas semanas parece ter acontecido uma reavaliação no modo de conduta dentro do próprio BC chinês, que primeiramente parecia priorizar o controle da inflação e do crédito sem querer sacrificar o crescimento.

Agora, a resposta mudou para a tradicional alta de juros. Vale lembrar que a taxa já tinha sido apertada em outubro e que nesse meio tempo o BC tinha reajustado os compulsórios.

A ação do BC da China pode ser vista como uma reação às consequências das decisões recentes do Federal Reserve (Fed), banco central, americano, que luta para combater a deflação, deixar o dólar "barato" e, assim, estimular a retomada da economia dos Estados Unidos (receita que parece estar dando algum resultado, por ora).

Um dos reflexos mais visíveis das injeções de liquidez do Fed (juros zero e compra de US$ 600 bilhões em títulos do Tesouro) é a firme valorização das commodities, que bateu não só na economia chinesa, mas é algo que está em pauta também no mercado doméstico. Ainda na China, esse excesso de capital, estimula a formação de bolhas no mercado de crédito e, consequentemente, no segmento imobiliário.

Dispondo de tais premissas, vemos que o cenário fica cada vez mais complexo.

Temos o Fed fazendo tudo a seu alcance para reativar a economia dos EUA. No entanto, essas ações americanas estão causando uma disparada no preço dos insumos, que se manifesta em inflação de forma quase que imediata nos mercados emergentes.

Como o custo econômico, político e social da inflação nesses mercados é muito elevado, os BCs estão entrando em ação.

A questão é que a consequência direta dessa resposta ao atual modelo de recuperação dos EUA pode resultar em enfraquecimento da demanda justamente nos mercados que não apodreceram com a crise de 2008 e apresentavam consumo suficiente para sustentar o seu crescimento e de outros países ao redor do mundo.

Resta saber em que ponto se dará o equilíbrio dessas duas forças conflitantes.

Mudando o foco para o mercado local: o pregão de segunda-feira foi de pouca oscilação e baixo volume no câmbio e nos juros futuros.

Pela ordem, a moeda americana fechou o dia praticamente estável a R$ 1,690. Nas mesas, o que se percebe são operações de remessas de lucros e dividendos.

Já nos juros, a curva futura conservou o formato que ganhou na semana passada, depois que o Relatório de Inflação trouxe consigo a ideia de que em janeiro a Selic deixará de valer 10,75% ao ano.