Título: Equipe de Anastasia consolida base de Aécio
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 30/12/2010, Política, p. A8

Dificilmente haverá outro governador que represente a continuidade como o mineiro Antonio Augusto Junho Anastasia (PSDB), que anunciou na quarta-feira, apenas 48 horas antes da posse no segundo mandato, o seu novo secretariado. Anastasia manteve na secretaria de Governo o ex-deputado Danilo de Castro e no Servas, sigla que designa a entidade de governo com tarefas assistenciais , a jornalista Andrea Neves Cunha, irmã do ex-governador e senador eleito Aécio Neves (PSDB-MG). Castro e Andrea, junto com Anastasia, foram os três pilares que sustentaram Aécio ao longo de seus dois mandatos. Apesar de não ser uma incumbência formal do Servas, a irmã do ex-governador na prática comanda a estratégia de comunicação do governo mineiro. O secretariado anunciado demonstra o empenho em consolidar a base de Aécio entre os partidos oposicionistas no plano federal e reforçar as pontes com o PSB e o PDT, que o apoiam na base estadual. Esses dois partidos dobraram de uma para duas secretarias o espaço dentro da administração. O deputado estadual Wander Borges, até este ano presidente regional do PSB, ganhou a Secretaria de Desenvolvimento Social e a educadora Ana Lucia Gazzola, ligada ao PSB, irá assumir a Secretaria Estadual de Educação. A presidência mineira do PSB vai para o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, um ex-secretário estadual de Aécio que elegeu-se em aliança com o PT. Há uma ofensiva tucana para que Lacerda rompa a parceria com os petistas. O PDT manteve a área de Assuntos Fundiários com seu presidente regional, Manoel Dias, e recebeu a nova Secretaria Estadual do Trabalho, a ser comandada pelo deputado estadual Carlos Pimenta. A participação pedetista no governo foi diretamente negociada pelo governador com o ministro do Trabalho Carlos Lupi.

Os presidentes regionais do DEM e do PSDB, respectivamente os deputados federais Carlos Melles e Nárcio Rodrigues, foram contemplados com Transportes e Ciência e Tecnologia. O senador eleito Itamar Franco (PPS-MG) manteve a sua fatia no poder com a permanência do coronel Djalma Moraes na presidência da Cemige o partido ainda recebeu a secretaria de Gestão Metropolitana, a ser ocupada pelo deputado federal Alexandre Silveira. Anastasia surpreendeu ao nomear a ex-ministra do Trabalho e da Indústria e Comércio, Dorothea Werneck para o Desenvolvimento Econômico. O atual secretário, Sérgio Barroso, irá coordenar as atividades relacionadas à Copa do Mundo.

Ao não estabelecer uma linha divisória com seu antecessor, o professor de direito, solteiro , 49 anos, fica com a tarefa de ser o grande esteio de Aécio na política nacional, em uma conjuntura de maior força dentro de Minas, mas com cenário de antagonismo no plano nacional. Para se firmar como presidenciável em 2014, Aécio dependerá não apenas da manutenção da base política e eleitoral dos tucanos em Minas , mas de afirmar-se como líder oposicionista, o que pode dificultar parcerias do governo federal com Anastasia.

Anastasia já era, de fato e de direito, o gerente da máquina estatal desde o início do governo de Aécio. Era a ele que os secretários estaduais se reportavam ante dilemas administrativos. O então governador conferiu formalmente esta delegação a Anastasia ainda em 2003, quando o nomeou secretário de Planejamento e coordenador do programa de reforma administrativa apelidado de "choque de gestão". Quando foi necessário levar a reforma para a área policial, integrando estruturas, Anastasia assumiu a Segurança, rebatizada como "Defesa Social". No segundo mandato, já vice-governador, conduziu nova reforma que recebeu o nome "Estado de resultados".

Em oito anos, Anastasia demonstrou habilidade em conciliar negociações com o funcionalismo e a oposição e a manutenção do ajuste do Estado mineiro. As resistências em Minas foram desarmadas a ponto de boa parte da oposição, inclusive do PT, votar a favor das medidas de ajuste propostas no primeiro mandato de Aécio. "Ele soube exercer a tradição mineira de conciliar sem abrir mão de certos parâmetros, que nunca foi compreendida pelos paulistas", comentou Paulo Paiva, presidente do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), que por dez anos foi o superior hierárquico de Anastasia. O atual governador foi seu braço direito quando Paiva tornou-se secretário de Planejamento no governo Hélio Garcia (1991-1994), acompanhando-o quando se tornou ministro do Trabalho de Fernando Henrique Cardoso. Paiva não irá permanecer à frente da instituição.

"No Ministério ele ajudou a montar um Conselho de Relações do Trabalho e conseguiu, sem romper diálogos, estabelecer uma coisa difícil como a desindexação dos salários. Pergunte ao Luiz Marinho e ao Vicentinho", disse Paiva, referindo-se aos políticos petistas de São Paulo que à época comandavam o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e a Central Única dos Trabalhadores.

Apesar da habilidade na costura de apoios às propostas de governo reconhecida também por adversários, Anastasia entrou no debate nacional de forma polêmica logo depois ser reeleito no primeiro turno: avaliou com simpatia a recriação da CPMF para financiar a Saúde. A tese é cara a governadores da base de apoio da presidente eleita Dilma Rousseff, como o governador pernambucano Eduardo Campos (PSB), mas foi recebida com frieza por tucanos como Geraldo Alckmin (SP) e Beto Richa (PR), o que deixou Anastasia isolado dentro do partido.

O governador construiu uma imagem de tecnocrata ligado ao PSDB desde 1988, quando tornou-se assessor parlamentar do deputado estadual Bonifácio Mourão, um dos relatores da Constituição mineira, redigida logo após a Assembleia Nacional Constituinte. Paulo Paiva à época fazia o lobby do setor universitário por vinculação de verbas na Constituição para Ciência e Tecnologia. "Fiquei espantado com a capacidade dele de formular saídas legais para os problemas. Conhecia tudo de regimento e Constituição", afirmou.

Anastasia é o primeiro governador mineiro, desde Clóvis Salgado (1955-1956), o vice que assumiu o governo quando Juscelino Kubitschek se desincompatibilizou para disputar a Presidência, egresso do meio acadêmico. Conseguiu a cadeira de professor na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ainda que tenha se dedicado pouco ao ramo. Iniciou o mestrado em 1984 e só defendeu a tese sobre o regime jurídico único em 1990. Suas energias estiveram voltadas à administração pública desde 1983, quando ingressou na Fundação João Pinheiro.