Título: Ano de ouro dos fundos
Autor: Monteiro, Luciana
Fonte: Valor Econômico, 06/01/2011, Investimentos, p. D1

Pode-se dizer que 2010 foi um ano de ouro para o setor de fundos de investimento. O segmento encerrou o período com captação líquida (aportes menos resgates) recorde de R$ 105,912 bilhões, o que significa um crescimento de 15,42% em relação ao ingresso de 2009, que já havia sido recorde. No ano passado, o total captado foi de R$ 91,759 bilhões. Os dados são da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Mesmo os resgates líquidos de R$ 14,840 bilhões em dezembro não foram suficientes para tirar o brilho do setor. Aliás, com exceção de novembro e dezembro, os fundos tiveram um ano de captação, com dez meses seguidos de aplicações superando os resgates. Com isso, o setor encerrou o ano com patrimônio de R$ 1,614 trilhão.

O setor de fundos brasileiro se consolida como o maior da América Latina e o sexto maior do mundo, Luiz Macahyba, superintendente da Anbima. "A indústria de fundos brasileira tem um papel relevante em termos de volume e de capacidade de influenciar todo esse setor latino-americano."

Os dados mostram ainda que os bons ventos também sopraram no que se refere ao crescimento no número de contas dos investidores. No ano passado, foram abertas 500 mil contas em fundos. No início de 2010, por exemplo, eram 10,2 milhões, passando a 10,7 milhões. Vale lembrar que um investidor pode ter aplicações em várias carteiras.

O bom ano registrado para as aberturas de capital (IPOs, na sigla em inglês) trouxe um novo gás para o setor de fundos, ressalta o consultor de investimentos Marcelo D"Agosto, autor do livro "Como escolher o melhor fundo de investimento." "Os recursos captados nos IPOs foram para o caixa das empresas ou para o bolso dos sócios, e grande parte disso foi aplicada em fundos", diz.

Não por acaso, os números mostram que o segmento corporate foi um dos que mais evoluíram, passando de um patrimônio de R$ 570,1 bilhões em dezembro de 2009 para R$ 651,8 bilhões em outubro de 2010 (último dado disponível). Isso representa uma expansão de 14,3%. O varejo, por sua vez, cresceu menos: de R$ 282,1 bilhões no fim de 2009 para R$ 291,7 bilhões em outubro - variação de apenas 3%. Já a alta renda (private) foi a que mais cresceu, de R$ 190,8 bilhões para R$ 221,1 bilhões - alta de 15,86%.

O setor de fundos teve um ano excepcional, principalmente quando se leva em conta que o investidor tinha outras alternativas bastante interessantes para aplicar, afirma Alexandre Póvoa, presidente da Modal Asset Management. Ele cita o caso dos Depósitos a Prazo com Garantia Especial (DPGEs), que garantiam até R$ 20 milhões ao aplicador se o banco quebrasse. "Até o rombo do Banco Panamericano, em novembro, os investidores viam esse tipo de aplicação como algo com risco baixíssimo", diz. Os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), isentos de imposto de renda, também atraíram muitos aplicadores.

As carteiras oferecidas aos investidores estrangeiros (offshore) contribuíram bastante para elevar o patrimônio do setor de fundos. No fim de 2009, essas aplicações somavam R$ 48,0 bilhões distribuídos entre 88 portfólios. Já em outubro do ano passado eram R$ 60,5 bilhões em 94 fundos.

A categoria com maior captação no ano passado foi a de fundos de renda fixa - que podem aplicar em papéis prefixados -, com ingresso de R$ 38,431 bilhões, embora essas carteiras tenham encerrado dezembro com resgates líquidos de R$ 3,155 bilhões.

Em seguida, ficaram os multimercados, com R$ 27,511 bilhões, mesmo com as saídas de R$ 1,459 bilhão no último mês do ano. Vale ressaltar que, nesse caso, os dados estariam distorcidos por conta de fundos multimercados criados exclusivamente para a gestão de parte de recursos que a Petrobrasteria captado na oferta pública.

Apesar da forte atração de recursos em multimercados, as carteiras da categoria tiveram rentabilidades muito díspares, ressalta Póvoa, da Modal. "Foi um ano bastante difícil para os gestores de recursos", diz. "Se os fundamentos da economia brasileira eram bons, havia muitas dúvidas com o desempenho dos Estados Unidos, Europa, e mesmo a China alternou momentos bons e maus."

Segundo a Anbima, os multimercados que seguem uma estratégia específica de gestão encerraram 2010 com rentabilidade média de 12,86%. O retorno está acima dos 9,75% do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI, o juro interbancário que serve de referencial para as aplicações mais conservadoras). Já os multimercados trading - que adotam posições direcionais, mas em que o gestor busca capturar os movimentos de curto e médio prazos constantemente - apresentaram retorno médio de 9,42%.

Ganhou dinheiro quem fez giros curtos nas carteiras e montou posições menores com os ativos dada a alta volatilidade no ano passado, diz Póvoa. O executivo lembra que, em 2010, a bolsa terminou o ano praticamente no zero a zero e o dólar foi e voltou várias vezes. Só a renda fixa teve uma tendência um pouco mais clara, afirma o executivo.

Nesse cenário, chama a atenção a captação líquida apresentada pelos fundos de ações. No ano passado, a categoria registrou ingresso de R$ 8,086 bilhões, mesmo com a alta modesta de 1,04% do Índice Bovespa. Já em 2009, apesar do retorno de 82,66% do indicador, os fundos de ações atraíram só R$ 805,42 milhões.

O mesmo comportamento pode ser visto entre os fundos de "small caps" (ações de empresas com menor liquidez). Essas carteiras fecharam o ano com rentabilidade média de 18,37%, mas a captação foi de apenas R$ 149,62 milhões. "O retorno dessas carteiras é um indicador do amadurecimento do setor de fundos brasileiro, pois mostra a capacidade de o investidor conseguir capturar boas oportunidades no mercado."

A única categoria a encerrar o período com resgates foi a dos fundos DI, com saídas de R$ 10,095 bilhões, dos quais R$ 4,179 bilhões somente em dezembro.