Título: Balança comercial precisa mais que câmbio favorável
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 10/01/2011, Opinião, p. A10

Os resultados da balança comercial em 2010 certamente influenciaram a decisão do Banco Central (BC) de desestimular as crescentes apostas que os bancos vêm fazendo na apreciação do real. Desde abril, os bancos vinham empilhando posições vendidas de dólar, que terminaram o ano no patamar recorde de US$ 16,8 bilhões. Essas operações revelam, na prática, a expectativa de valorização ainda maior do real. Virou um bom negócio captar dólares no exterior, financiados a juros praticamente negativos, e trazer a moeda para o Brasil com a certeza de que o Banco Central vai aspirar todo o excedente para evitar desvalorização ainda maior da moeda americana. O BC chegou a comprar US$ 41,4 bilhões em intervenções diretas no mercado no ano passado, adquirindo inclusive a moeda do caixa dos bancos. A ação do BC para conter a queda do dólar, paradoxalmente, alimenta as apostas dos bancos, que agora foram inibidas com o recolhimento compulsório que passou a ser aplicado às posições vendidas.

A frenética ação do Banco Central no câmbio não impediu o enfraquecimento do dólar, que é consequência não só da ação deliberada dos Estados Unidos de aumentarem a liquidez de seus mercados para reativar a economia, mas também da política doméstica de juros altos.

O impacto dessa combinação de fatores foi fatal para balança comercial brasileira em 2010. Apesar de as exportações terem crescido 31,4% para o recorde de US$ 201,9 bilhões, as importações aumentaram muito mais, 41,6%, para US$ 181,6 bilhões, animadas pelo dólar baixo e pela demanda aquecida. O saldo final ficou em US$ 20,3 bilhões, 20% inferior ao de 2009 e o menor em oito anos.

Os números poderiam ter sido mais negativos. No início do ano, esperava-se que as exportações ficassem em US$ 180 bilhões, o que teria provocado o primeiro déficit da balança comercial em dez anos. O resultado só não foi pior por causa dos ganhos dos termos de troca que é a relação entre os preços dos produtos exportados e o dos importados.

Mas isso não é necessariamente motivo de orgulho. O Brasil está ganhando com os termos de troca de sua balança não porque está exportando produtos sofisticados, com alto grau de tecnologia embutida, mas sim porque as commodities, que estão dominando a pauta de exportações, estão com os preços em forte alta, dada a demanda dos mercados emergentes como a China.

O superávit comercial inesperado de dezembro, por exemplo, foi em boa parte resultado da elevação de preços de importantes produtos exportados. O principal foi o minério de ferro, que representou 17% do valor total embarcado no mês. O preço do minério de ferro subiu 142,2% em comparação com dezembro de 2009. Também subiram café em grão (37,7%) e açúcar em bruto (25,9%).

No ano passado, o Brasil exportou mais commodities do que manufaturados, pela primeira vez desde 1978. As vendas externas de produtos básicos cresceram 44,7% e somaram US$ 90 bilhões, representando 44,6% das exportações totais, acima dos 40,5% de 2009. Já os embarques de manufaturados cresceram 17,7% para US$ 79,6 bilhões, e ficaram com uma fatia de 39,4% das exportações, inferior aos 44% do ano anterior.

A mudança no mix das exportações é resultado do enfraquecimento econômico dos parceiros tradicionais do Brasil, como Estados Unidos e União Europeia, e do crescimento da importância dos novos participantes do mercado, notadamente os asiáticos. A China assumiu o posto de um dos mais importantes parceiros do Brasil, com 15,2% das exportações e 14,1% das importações.

Já do lado das importações, tiveram destaque o crescimento das compras de bens de capital (38%), item que inclui veículos e máquinas; mas também bens de consumo duráveis (59%), como automóveis (55,6%).

No entanto, como disse o colunista do Valor, Alexandre Schwartsman, na coluna publicada quinta-feira, a melhoria dos termos de troca proporcionada pelos preços das commodities não é eterna e tende a se reverter. Além disso, não é desejável se acostumar com um padrão de exportações dependente eminentemente de produtos básicos, com baixo valor agregado e reduzida geração de emprego e renda.

Para reequilibrar a balança comercial, certamente serão necessárias mais do que medidas prudenciais para mudar o jogo do câmbio. O governo precisa avançar também na melhoria da infraestrutura e na desoneração da atividade industrial.