Título: Analistas veem real mais fraco
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 12/01/2011, Finanças, p. C10

Já não são poucos os analistas que consideram que o governo vai vencer a batalha e segurar uma valorização do real neste ano. O Bank of America Merrill Lynchchega mesmo a apostar no dólar a R$ 1,85 no fim de 2011. Isso seria uma desvalorização nominal da moeda brasileira de 8,8% em relação à cotação de fechamento de ontem, de R$ 1,687. O J.P. Morganaposta em R$ 1,80 e o Itaú BBA, em R$ 1,77. No Boletim Focus, que reúne a posição do mercado, as expectativas são, na mediana, de R$ 1,75. A maioria dos especialistas ouvidos pelo Valoravalia que a tendência seria de continuidade da valorização do real, em um cenário base que não inclui uma moratória de dívida na Europa, nem explícita nem disfarçada por meio de uma troca de títulos com alongamento de prazos. Na visão desses analistas, a atuação do governo brasileiro, no entanto, será incessante, e vai segurar a cotação da moeda brasileira.

"O governo agora diz explicitamente que quer influir na cotação do câmbio, o que não fazia antes", diz Darwin Dib, economista do Itaú BBA. "No governo Lula, o discurso era de que a atuação visava apenas reduzir a volatilidade no câmbio", lembra.

O governo Dilma deixou a porta aberta para compras de dólar no mercado futuro a serem feitas pelo Fundo Soberano, para mais aumentos de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) no câmbio sobre investimentos de renda fixa e para mais medidas inovadoras, como o depósito compulsório sobre as posições vendidas em câmbio no mercado à vista dos bancos recentemente adotada. "Há uma queda de braços em andamento e o governo, pelo menos no curto prazo, não dará tréguas", diz Marcelo Carvalho, economista-chefe no BNP Paribas.

Ele acredita, no entanto, que a atuação do governo vai impactar mais a tendência de curto prazo e que o dólar pode voltar a bater em R$ 1,60 neste ano. "O déficit em conta corrente vai atingir 3,5% do Produto Interno Bruto, na comparação com os 2,4% de 2010, mais ele será amplamente financiado pelo ingresso de recursos na conta de capital", diz. Carvalho lembra que os países ricos devem continuar com suas políticas monetárias expansionistas, sem enxugar liquidez do mercado ou subir taxas de juros durante 2011. "Isso gera uma liquidez ampla que deverá vir para o mercado brasileiro", afirma.

Na visão de Octavio de Barros, diretor do departamento de economia do Bradesco, há três fatores determinantes que pressionam por uma valorização do real. O primeiro, segundo ele, é a tendência de alta nos preços das commodities durante este ano e a correlação positiva entre esses e a cotação do real. Ele lembra que apesar da desaceleração no China, há alta de preços nas commodities metálicas e agrícolas, ainda mais com o seca na Austrália e a crise na Argentina.

"Quando um país cresce, sua moeda se fortalece e o Brasil vai ter crescimento econômico robusto em 2011, embora o diferencial entre esse crescimento aqui e nos países ricos seja reduzido em relação ao ano passado", continua ele. Para Octavio de Barros, a alta esperada nos juros básicos Selic e o impacto dessas expectativas no diferencial entre os juros internos e externos são fatores adicionais a pressionar por uma valorização do real.

Hoje, considerando-se o diferencial entre os juros dos contratos de "swap" - troca de juros pós-fixados por prefixados - de vencimento em um ano no Brasil e a Libor (taxa interbancária de Londres) de mesmo prazo o diferencial está perto do recorde dos últimos três anos, de 12,85% em 24 de outubro de 2008.

O Bradesco, no entanto, aposta em um câmbio de R$ 1,70, pois acredita que a Fazenda fará o necessário para impedir a apreciação para abaixo desse nível de forma sistemática. "As ações do governo falam por si", afirma ele. Para Octavio de Barros, o compulsório sobre a posição vendida dos bancos é neutro para a cotação do real, pois implica compra no mercado à vista, mas venda no futuro. Mas a intenção era depreciar o câmbio e isso acaba pesando. "Se o FSB realmente utilizar o derivativo ele poderá evitar a apreciação", afirma.

Segundo Octavio de Barros, os termos de troca favoráveis ao Brasil levaram o banco a prever um superávit comercial maior em 2011 e ajudaram a rever para baixo a projeção de déficit em conta corrente, de 3,5% do PIB no final do ano para 3%. O investimento externo direto de US$ 45 bilhões vai financiar dois terços desse déficit, acredita ele.

Para o Bradesco, o resultado de um fluxo forte de moedas ao país será um crescimento das reservas internacionais para US$ 320 bilhões, na comparação com os pouco mais de US$ 288 bilhões do final do ano passado. O crescimento das reservas, de pouco mais de US$ 22 bilhões, será menor do que os mais de US$ 49 bilhões no ano passado, no entanto. De uma forma geral, os bancos ouvidos pelo Valorapostam em aumento menor das reservas, com exceção do BofA, que acredita em estabilidade.

Dib lembra que as projeções do mercado, na verdade, apontam para uma estabilidade para o câmbio real, ou seja, descontada a inflação. Ele fez os cálculos - considerando-se a inflação no Brasil de 5,6% neste ano e a inflação externa de 2%, uma valorização nominal de 3,6% como a projetada pelo Boletim Focus na verdade representa nenhuma alteração na taxa de câmbio real. Para ele, o real já não se valorizaria com força neste ano mesmo sem a atuação do governo.