Título: As batalhas diárias do BC no mercado de câmbio
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2011, Opinião, p. A12
O governo Dilma não está conseguindo conter a apreciação do real como não o conseguiu o de Lula. Sob o comando de Alexandre Tombini, o Banco Central (BC) do novo governo tentou colocar em segundo plano a estratégia praticada ativamente nos últimos meses do governo Lula de comprar dólares no mercado à vista para tentar sustentar a moeda americana e lançou mão de novos instrumentos, o desestímulo às apostas na valorização do real e a venda dos swaps cambiais reversos. Nos últimos dias, teve que jogar a toalha e voltou a comprar dólares agressivamente. Mas o esforço está dando poucos resultados, como foi no governo anterior.
No ano passado, o BC chegou a comprar US$ 41 bilhões, absorvendo todo o superávit de US$ 24 bilhões registrado no fluxo cambial e muito mais. Ainda assim, o dólar caiu 4,4% e a inflação ficou em 5,91%, bem acima do centro da meta de 4,5%.
Ao invés de elevar o dólar, as compras, na verdade, estimulam os bancos a fazer "carry trade", operação em que captam dólares a juros baratos no mercado externo para vendê-los ao BC, aplicando os reais obtidos no mercado brasileiro, a taxas bem maiores. Por isso, os bancos aumentaram as posições vendidas em dólar, apostando na queda da moeda.
Só quase no fim do governo Lula, em outubro, é que o governo aumentou o IOF nos investimentos estrangeiros em renda fixa para 6%. Mas o IOF não desestimulou o "carry trade". Um dos motivos é que o dinheiro continua farto e barato no mercado externo. Outro é que o retorno é compensador, e aumentou depois da elevação da taxa básica (Selic). Não é por outro motivo que empresas brasileiras já captaram US$ 10,3 bilhões neste início de ano no mercado internacional.
Diante da ineficiência das compras de dólares para segurar as cotações, o Banco Central de Dilma colocou essa estratégia em segundo plano e, já na primeira semana do ano, instituiu um compulsório de 60% sobre as apostas dos bancos na queda do dólar. A nova regra deve reduzir as posições vendidas em cerca de US$ 7 bilhões, de US$ 16,8 bilhões do fim de 2010 para US$ 10 bilhões. Mas enquadramento é gradual e o prazo vai até 4 de abril, o que atenua o impacto da medida.
Ao desfazer a posição vendida à vista, os bancos também têm que desmontar o hedge de contratos comprados no mercado futuro. Para evitar que isso pressionasse o mercado, o BC passou a vender swaps cambiais reversos, contratos em que troca a remuneração da Selic pela correção cambial. Em pouco mais de uma semana, US$ 3 bilhões foram vendidos em swaps cambiais reversos.
No entanto, imaginação é o que não falta no mercado financeiro, que já vislumbrou oportunidades de ganho duplo na operação, com o juro e a variação cambial, desde que o real se aprecie. Por isso, as vendas de swap têm causado apenas uma elevação passageira do dólar, para balizar o preço dos negócios, assim que a operação é anunciada. A cotação não se sustenta e cai logo depois.
O novo governo teve então que voltar atrás e retomar as compras agressivas de dólar. Enquanto na primeira quinzena do mês comprou US$ 2,291 bilhões, menos da metade dos dólares que entraram no país no período, nos dois últimos dias tentou raspar o mercado e ainda vendeu swaps cambiais reversos. O esforço foi vão. O dólar pouco se mexeu e está apenas 0,4% acima do patamar do fim de 2010. Desde que o IOF foi elevado, em outubro, o real subiu 1,8% frente ao dólar.
As compras de dólares engordaram as reservas internacionais e ajudaram o país a enfrentar a crise internacional. As reservas já rondam os US$ 300 bilhões, bem mais do que os US$ 200 bilhões de quando a crise aportou na costa brasileira. Mas têm um custo fiscal elevado, representado pela diferença entre o retorno obtido com a aplicação das reservas no exterior e o juro pago nos títulos públicos vendidos para enxugar a expansão causada pela compra da moeda americana. O governo Dilma tentou reduzir esse custo fiscal ao diminuir as intervenções no mercado de câmbio à vista. No entanto, o swap cambial reverso também tem um custo fiscal elevado, como detalhou o colunista Márcio Garcia (Valor 14, 15 e 16/1).
Tudo indica que o capital externo continuará investindo no Brasil, o que trará maior apreciação cambial e debilitará os instrumentos de intervenção. O risco é o governo se apegar aos entulhos regulatórios. Se existe uma saída para atenuá-la, ela passa pela redução dos juros e o ajuste fiscal.