Título: Paraguai usa custo baixo para atrair indústria
Autor: Lima, Marli
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2011, Especial, p. A12

Pela Ponte da Amizade, que liga o Brasil ao Paraguai, passam mais do que sacoleiros e turistas carregados com mercadorias trazidas da Ásia e compradas no comércio de Ciudad Del Este. Por ela trafegam produtos feitos no país vizinho e importados por empresas brasileiras, como bermudas e camisetas que levam a marca Adidas e a etiqueta "hecho en Paraguay". Passam também cortinas, que são vendidas em lojas de decoração e em varejistas, como as Pernambucanas, além de outros artigos fabricados por empresários, que encontraram parceiros e vantagens fiscais para produzir do outro lado da fronteira.

Pela mesma via vão circular, em 2012, caminhões carregados com frangos da Globoaves, maior produtora de pintinhos e ovos da América Latina, que tem projeto de construção de fábrica de ração e frigorífico para abate de 160 mil aves por dia no município paraguaio de Santa Rita, distante 70 quilômetros da ponte.

"O Paraguai é o país mais competitivo para investimentos na América", diz Marcos Bertoli, gerente de negócios internacionais da Globoaves. Segundo ele, um quilo de frango produzido no Paraguai e exportado para o Oriente Médio pelo porto de Paranaguá custa de 20% a 28% menos que um quilo de frango produzido em Cascavel (PR), onde fica a sede da empresa.

Menos impostos, menor custo de energia e mão de obra jovem são algumas das vantagens apresentadas por representantes do governo paraguaio para conquistar investimentos. Entre os atrativos oferecidos está a Ley de Maquila, modelo baseado em experiência mexicana, que permite importação de matéria-prima com isenção de impostos, desde que os produtos sejam destinados à exportação.

De acordo com Raquel Ramirez, secretária-executiva do Conselho Nacional da Indústria Maquiladora de Exportação (Cnime), há 49 maquiladoras no Paraguai, sendo 10 com participação de investidores brasileiros. "Mais do que descobrindo o Paraguai, as empresas estão confiando no país", diz ela, que usa uma pulseira com as cores da bandeira e tem como meta atrair ao menos dez indústrias por ano, de vários países. O objetivo foi atingido nos últimos três anos, e hoje há cinco negociações avançadas. Raquel conta que a decisão de investimento dos empresários estrangeiros costuma levar 18 meses.

A proximidade torna o Brasil o grande alvo do processo de industrialização paraguaia, segundo Oscar Stark, diretor da Rede de Investimentos e Exportações (Rediex), do Ministério de Indústria e Comércio do Paraguai. Ele visitou o Brasil quatro vezes em 2010 e planeja voltar em 2011, ano em que espera finalizar projetos em andamento.

"O Brasil é o país que temos que focar?", conta ele, que fala do interesse de pequenos e médios empresários pelo Paraguai, e também de gigantes mundiais, como a Rio Tinto Alcan, que negocia com o governo a instalação de uma unidade naquele país, no que tende a ser o maior investimento privado de sua história, orçado em US$ 2,9 bilhões.

Pelas ruas de municípios paraguaios, é comum encontrar postos da Petrobras e agências do Banco Itaú, empresas brasileiras que, segundo relatos de moradores, levaram qualidade de instalação e atendimento e forçaram mudanças nos concorrentes locais.

As indústrias ficam mais escondidas. Há três anos, as bermudas e camisetas da Vantex Paraguay, que tem 142 empregados e sócios e importadores brasileiros, saem de barracões que abrigaram o refeitório e o teatro de operários que ajudaram a construir a usina de Itaipu, nos anos 80. Do lado de fora não há placas de identificação. Do lado de dentro, homens e mulheres cortam e costuram peças com a marca Adidas, usando tecidos trazidos do exterior.

Os barracões ficam em Hernandárias, cidade vizinha a Ciudad Del Este. Lá, a capacidade é para confeccionar 35 mil peças por mês. Como não há espaço para ampliação no local, um novo investimento está programado para aumentar a produção. A Vantex espera que a demanda cresça com a Olimpíada e a Copa do Mundo. Além disso, a empresa quer estar pronta para a possibilidade de receber encomendas de outras marcas.

Lilian Almeida, coordenadora de importação e exportação, mostra a etiqueta em três idiomas - "made in Paraguay", "produzido no Paraguai" e "hecho en Paraguay" - e fala com empolgação das mudanças que tem visto no seu país. "Estamos vivendo uma fase de transição na área industrial", afirma ela, que tem 36 anos e, aos 19, trabalhava como caixa em uma loja de tecidos em Ciudad Del Este.

Para o empresário brasileiro Alexandre Bazzan, que vive no Paraguai há dois anos, a industrialização do país ainda vai demorar algum tempo. Ele está satisfeito com os resultados que tem obtido na Cortinerias del Paraguay, onde emprega 200 pessoas e faz 100 mil cortinas por mês - eram 60 mil no ano passado. Sua maior compradora é a Bella Janela, de Blumenau (SC), que tem três fábricas e 5 mil clientes no Brasil.

"O custo é menor e vale a pena", afirma Bazzan, que ocupa quatro galpões do Parque Mercosur, em Ciudad Del Este. O próprio local é um sinal de mudanças: ele foi criado inicialmente para servir de depósito para mercadorias importadas pelo comércio local, que atende os sacoleiros brasileiros. O empresário está com projeto de ampliação em outro terreno e planeja dobrar o tamanho da equipe ainda em 2011. "Mais de 80% deles estavam desempregados", conta, sobre o pessoal que agora veste seu uniforme.

Além da Maquila, há a lei 60/90, de importação de bens de capital livres de impostos, que vai beneficiar a Globoaves. A empresa é aguardada com ansiedade pelos moradores de Santa Rita - uma localidade com sotaque brasileiro, pois 65% da população de 16 mil habitantes veio do país. Uma área de 180 mil metros quadrados já está reservada para as instalações em um parque industrial em implantação, onde antes havia plantação de soja.

O prefeito, Concepción Rodriguez, já pensa em dar mais espaço para as indústrias. "Temos confiança na atração de empresas", explica ele, que oferece terreno subsidiado e busca autorização federal para oferecer incentivos locais para exportadores. "Tenho muita esperança de ver esse país crescer. Ele merece", diz Humberto Arges, brasileiro que vive há 30 anos no Paraguai, é apaixonado pelo país e presta consultoria para empresas que querem produzir nele. Ele atuou no processo de instalação da Globoaves, que aguarda financiamento do BNDES para começar a obra.