Título: TAP reabre onda de privatização aérea
Autor: Komatsu, Alberto; Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2011, Empresas, p. B4

A venda de uma fatia da portuguesa TAP ao setor privado, prevista para começar até fim de março, reabre a temporada de privatizações no setor aéreo - uma tendência que deve ser mantida nos próximos anos, segundo especialistas e a Associação Internacional do Transporte Aéreo (Iata, em inglês).

Os governos ainda controlam 155 companhias aéreas no mundo, ou 26% das 775 listadas pela Iata. Mas se depender da União Europeia (UE), o grupo das estatais vai encolher ainda mais, para poupar os contribuintes de pagar por empresas deficitárias.

"Dessas 155 companhias, a TAP é a mais significativa", afirma o consultor aeronáutico Paulo Bittencourt Sampaio. Na terça-feira, em entrevista ao Valor, o presidente da TAP, o brasileiro Fernando Pinto, indicou que a Qatar Airways teria demonstrado interesse em adquirir uma participação na TAP, que é 100% do governo de Portugal. Segundo a imprensa portuguesa, a fatia seria de 40% e mais dois interessados estariam no páreo, a International Airlines Group (IAG, fusão da British com a Iberia) e a alemã Lufthansa.

O peso do setor privado no setor aéreo é grande. As 25 maiores companhias do mundo respondem por cerca de 40% da capacidade global de transporte em aviões. Dessa fatia, 80% são operadas por aéreas privadas, segundo a Boeing. Levantamento feito pela fabricante de aviões, a pedido do Valor, mostra que as aéreas estatais são, em geral, de pequeno porte.

Amélia Torres, porta-voz do departamento de Concorrência nos 27 países membros da União Européia, confirma que a tendência é cada vez mais a de os Estados venderem uma parte ou o controle acionário em companhias aéreas.

Nos anos 1990, lembra ela, muitas companhias se beneficiaram regularmente dos subsídios do Estado. Como não obtinham lucros e acumulavam perdas, os governos entravam para evitar a quebra, distorcendo a concorrência.

Agora, observa Amélia, além do controle estatal na TAP, resta uma pequena fatia do governo italiano na Alitalia, que em 2008 foi absorvida pela fusão Air France-KLM. Entre exemplos recentes de companhias que perderam ou tiveram a influência estatal diluída, ela lembra da Austrian Airlines, vendida para a Lufthansa, além fusão entre Iberia e Bristish Airlines. Outras tomaram o mesmo rumo.

Na América do Sul, segundo dados informados pela Boeing, têm algum nível de controle ou influência governamental as seguintes empresas: Aerolíneas Argentinas, Boliviana de Aviación, Pluna, Suriname Airways, Conviasa e Sol Líneas Aéreas.

No Brasil, a última estatal do setor aéreo foi a falida Vasp. A companhia, fundada em novembro de 1933 por um grupo de empresários paulistas, foi estatizada dois anos depois. Em 1990, no governo estadual paulista de Orestes Quércia e presidência de Fernando Collor, a Vasp foi vendida para o empresário Wagner Canhedo por US$ 45 milhões.

Além do movimento de privatização, corre paralela a tendência de fusões entre companhias, como a da IAG (British e Iberia) e a da Latam Airlines, que reúne a chilena LAN e a brasileira TAM, para citar exemplos mais recentes. Nesse cenário, o foco da Comissão Europeia agora, diz Amélia, é evitar uma concentração excessiva no setor, especialmente entre empresas de um mesmo país.

Na semana passada, em Bruxelas, a Comissão Europeia (o braço executivo da União Europeia), interditou pela segunda vez desde 2004 a fusão entre duas companhias da região. Dessa vez foram as gregas Aegean Airlines e Olympic Air. A Comissão alegou que essa fusão resultaria na formação de um quase monopólio no setor aéreo da Grécia. Em 2007, a Comissão já havia barrado a o projeto de compra da irlandesa Air Lingus pela compatriota Ryanair. Em seis anos, a Comissão analisou 11 concentrações e numerosas alianças aéreas.

No caso da Latam, a aprovação da fusão entre LAN e TAM está sendo analisada por órgãos reguladores. No Brasil, o aval terá de ser dado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). No dia 19, as duas empresas anunciaram a assinatura de dois contratos definitivos para a negociação. A expectativa é a de a Latam decolar daqui a nove meses, no máximo.

"A aviação será uma indústria consolidada com uma dúzia de marcas globais, apoiadas por competidores regionais e de segmentos específicos", disse o presidente da Iata, Giovanni Bisignani, em recente discurso sobre como estará o mercado de aviação em 2050.

Em um relatório especial da Iata sobre consolidação aérea, o presidente da americana US Airways, Doug Parker, diz que "uma indústria fragmentada significa custos maiores, tornando o lucro difícil de aparecer e colocando empregos em risco".

Ainda conforme esse relatório, em 2009, as 10 maiores companhias aéreas da Iata respondiam por 25% do mercado global, em termos de passageiros transportados. Na indústria farmacêutica, acrescenta o estudo, apenas quatro grupos dominam o setor com percentual similar ao do transporte aéreo.