Título: Após 41 atuações, o que quer o BC no câmbio?
Autor: Campos, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2011, Finanças, p. C2

O regime de câmbio no Brasil é flutuante, mas janeiro ficou para traz com 41 intervenções do Banco Central (BC) no mercado. Foram 34 leilões à vista, 4 operações de swap cambial reverso e 3 compras na novíssima modalidade a termo.

Ao tomar conhecimento desses números, algum desavisado logo imagina grande alteração de preço. No entanto, não foi isso que se observou. O dólar comercial fechou o mês valendo R$ 1,674, o que representa uma leve valorização de 0,48% sobre o R$ 1,666 que marcou o encerramento de 2010

Se objetivo de tamanho esforço era preço, tal meta não foi atingida. Pode-se dizer, por outro lado, que o BC não quer mesmo um real mais fraco, mas sim suavizar ou mesmo conter uma queda no preço do dólar. Ou ainda usar o seguinte argumento: se o BC não tivesse atuado, o dólar poderia estar ainda mais baixo.

Ontem, o mercado teve contato com as compras a termo. Operação bastante semelhante ao mercado futuro. A diferença está na liquidação. No termo a liquidação é física (há entrega de moeda no prazo estipulado), enquanto no futuro a liquidação é apenas financeira.

As operações a termo não tiveram impacto direto sobre o preço, já que o dólar começou a segunda-feira em baixa e assim terminou o pregão, mas levaram algumas dúvidas: o BC quer se antecipar a algum fluxo? Esse foi apenas um teste para avaliar a aceitação a tal ferramenta? Qual o volume movimentado em cada um dos três leilões?

Deixando isso de lado e olhando além do pragmatismo da medida, há quem enxergue uma tentativa, ainda tímida, de se alterar o local de formação de preço do dólar, e uma forma de baratear o custo das intervenções/aquisição de reservas.

Começando pelos custos, o diretor da NGO Corretora, Sidnei Moura Nehme, aponta que ao fazer as compras a termo o Banco Central não tem um desencaixe "imediato", pois não precisa emitir títulos para entregar reais e depois fazer operações para esterilizar essa moeda entregue aos bancos em troca de dólares.

Já os bancos conseguem o que querem, pois a operação a termo embute uma taxa de juros, que na visão do especialista, deve se aproximar ao cupom cambial (DDI - juro em dólar). Com isso, perdem atratividade as operações até então em voga que consistiam em tomar linhas externas, vender dólares ao BC, levantar reais e, depois, aplicar em cupom cambial.

"O banco não precisa mais buscar dólares. A moeda já está aqui. Ele compra no à vista e vende o termo. Com isso, o banco traz para o mercado físico uma operação que tinha amarração final no mercado futuro", avalia.

Toda essa engenharia depende, claro, da taxa embutida nas operações e é aqui que as atuações com swap cambial reverso se misturam ao termo, pois os swaps influem na taxa do cupom, que podem ser atrativas ou não ao termo ou à manutenção da estratégia de captar dólares e entregar ao BC.

Partindo da premissa que essa atuação a termo, desde que constante e com prazos cada vez mais longos, se firme, Nehme vê uma crescimento do volume de operações no mercado físico em detrimento ao futuro.

O especialista vai além e enxerga tal decisão do BC como um prenúncio de maior liberação para empresas e outros participantes fazerem operações a termo no mercado físico. O que, por ora, não é permitido e acaba empurrando os agentes para o futuro, que é onde está concentrada a liquidez e a formação da taxa de câmbio.

"Isso traria para o mercado físico operações típicas de mercado físico, que envolvem entrada de moeda. Isso seria um aperfeiçoamento do modelo", conclui.

Com outro enfoque, o economista e professor da PUC-Rio, André Cabus Klotzle, acredita que ao acentuar e lançar novas medidas o BC tenta evitar um derretimento do dólar e, ao mesmo tempo, buscar consonância com a sociedade e com o Ministério da Fazenda de que tem um "arsenal" de medidas para frear a alta do real.

Na verdade, diz Klotzle, o BC vem utilizando de forma comedida e gradualista seu arsenal, com o intuito de manter o dólar no atual patamar, ao redor de R$ 1,67. Se cair muito abaixo disso, o BC intensifica sua atuação. Caso se aproxime de R$ 1,70, reduz o poder de fogo.

Tal banda imaginaria existe, segundo o professor, pois há um benefício cambial para a inflação que o BC não pode desprezar. Especialmente no momento em que as expectativas de IPCA para 2011 se aproximam de 6% e para 2012 já estão beirando os 5%.

"O atual patamar parece ser um consenso de taxa "apropriada" para combater a inflação e evitar críticas mais duras de falta de ação para evitar uma apreciação mais forte do real", diz.