Título: Pactual paga R$ 450 milhões a Silvio Santos
Autor: Adachi, Vanessa
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2011, Eu & Investimentos, p. D3

"Qual é a música?", perguntava, em tom de comemoração, o banqueiro André Esteves na noite de ontem depois de selar a compra do controle do banco PanAmericano. O empresário e apresentador Silvio Santos, que deu fama à frase ao repeti-la incansavelmente em um de seus programas dominicais no SBT, também tinha motivos para comemorar, apesar de ter dado adeus, na noite de ontem, à vida de banqueiro ao entregar o controle da instituição ao BTG Pactual, do jovem Esteves, que tem praticamente a metade de seus 80 anos de idade. Silvio Santos mostrou-se um negociador hábil e tenaz, irritou muita gente, mas no fim conseguiu o que parecia um milagre: saiu da operação sem o banco, mas também sem dívidas com o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) e com todas as demais empresas do seu grupo completamente liberadas. Até mesmo a exigência de que desse garantias para futuras contingências do banco Silvio Santos conseguiu derrubar ao mostrar-se irredutível.

Para assumir o controle do PanAmericano, especializado em financiamento de veículos, o BTG Pactual pagará R$ 450 milhões ao empresário num prazo de até 17 anos. Sobre esse valor correrão juros equivalentes a 110% do CDI. O BTG poderá quitar a dívida quando quiser, dentro desse prazo. No entanto, segundo apurou o Valor, a cifra total paga ao final do período não poderá ultrapassar R$ 3,8 bilhões. O BTG assume 37,64% do capital total do PanAmericano, sendo 51% do capital votante e 21,97% do preferencial.

Mas a conta para o BTG não é tão simples. O banco se comprometeu com o Banco Central a colocar dinheiro para suportar as operações da instituição adquirida. A cifra acertada poderia rondar os R$ 3 bilhões.

O sócio do BTG José Luiz Acar Pedro, até o ano passado vice-presidente do Bradesco, vai presidir o PanAmericano, que terá atuação independente do Pactual. Acar participou das negociações para a compra da instituição desde o início.

O Valor apurou que o Fundo Garantidor de Créditos vai injetar outro R$ 1,3 bilhão para entregar o banco saneado ao BTG - essa cifra se soma aos R$ 2,5 bilhões já injetados em novembro, que seriam corrigidos pelo IGP-M com prazo de dez anos. No total, são R$ 3,8 bilhões que saem do caixa do FGC para o PanAmericano.

Pela engenharia montada, Silvio Santos conseguiu quitar essa dívida com o FGC apresentando ao fundo o recebível de 17 anos dos mesmos R$ 3,8 bilhões que tem contra o BTG Pactual. O BTG, na prática, passa a dever ao fundo garantidor.

Mas a conta parece não fechar, porque os R$ 3,8 bilhões são desembolsados pelo FGC no presente, enquanto o recebível do BTG tem valor presente de apenas R$ 450 milhões. Por esse raciocínio, o FGC parece estar pagando a maior parte do rombo. A dúvida fica no ar, já que o fundo não esclareceu o acordo.

Além do valor a ser pago ao empresário, o BTG terá que fazer uma oferta de compra das ações dos minoritário (OPA), que têm direito de "tag along". O valor a ser pago por ação será de R$ 4,89, embutindo prêmio de 14,8% sobre o valor dos papéis em bolsa ontem. A Caixa Econômica Federal, que renovou o acordo de acionistas, não venderá suas ações na oferta aos minoritários. Os controladores se comprometerão a manter o capital do PanAmericano aberto por pelo menos um ano.

O BTG Pactual substituirá o grupo Silvio Santos no acordo de acionistas pré-existente com a Caixa. O BTG será o acionista majoritário, mas o acordo garante direitos à Caixa que se aproximam de um compartilhamento do controle. As duas instituições deverão apoiar financeiramente o PanAmericano, com compra de recebíveis de crédito e financiamento no interbancário.

Até ontem, ainda não havia uma data definida para a divulgação do aguardado balanço do terceiro trimestre da instituição.

Silvio Santos chegou à sede do BTG depois das 18 horas para acertar os últimos detalhes e às 20h30 os contratos eram impressos para dar início à assinatura. A notícia de que Silvio Santos havia se dirigido à sede do BTG, na avenida Faria Lima, em São Paulo, levou à portaria do elegante edifício um grande número de jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas, que aguardaram a sua saída. Ao deixar o prédio, Silvio Santos declarou que, após vender o banco, não tem mais dívidas com o FGC, de quem tomou R$ 2,5 bilhões emprestados no ano passado.

Entre a proposta encaminhada pelo BTG, na quinta-feira, conforme revelado pelo Valor, e o desfecho do acordo, passaram-se apenas quatro dias de intensas negociações. Os maiores bancos do país estiveram envolvidos no processo. A Caixa Econômica Federal porque detém 36,56% do capital total do PanAmericano e 49% das ações com direito a voto, além do acordo de acionistas. O investimento foi costurado no fim de 2009, na esteira dos efeitos da crise financeira de 2008. Quando a Caixa concordou em pagar R$ 740 milhões por um terço do capital do banco, não fazia ideia do rombo ali existente. As auditorias feitas na época não revelaram problemas e Silvio Santos embolsou a cifra, além de manter o controle da instituição na ocasião.

Além da Caixa, entretanto, Bradesco, Banco do Brasil e Itaú envolveram-se na condição de maiores cotistas do FGC, que já havia injetado R$ 2,5 bilhões na instituição e que acabou aprovando um novo empréstimo bilionário para viabilizar o resgate do banco e a transferência do controle. Esses grandes bancos de varejo tinham uma exposição bilionária ao PanAmericano porque eram grandes compradores de carteiras de crédito da instituição e, portanto, provedores de "funding". De certo modo, eram os maiores credores do banco e poderiam ter perdas expressivas em caso de quebra.

Na sexta-feira, Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do Bradesco, Lázaro de Mello Brandão, presidente do conselho de administração do Bradesco, e Roberto Setubal, controlador e presidente do Itaú, foram pessoalmente à sede do FGC, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, para discutir o novo resgate do PanAmericano, em encontro de cerca de duas horas e meia.

A saída de Silvio Santos da posição de controlador do PanAmericano foi uma exigência do Banco Central depois da descoberta do segundo rombo de quase R$ 1,5 bilhão, que se somou aos R$ 2,5 bilhões anteriores. A autoridade monetária monitorou o desenrolar das negociações e exerceu pressão sobre os bancos, o FGC e o empresário para um desfecho favorável.