Título: Estrangeiro foca ação no câmbio e medidas do BC
Autor: Bittencourt, Angela
Fonte: Valor Econômico, 04/02/2011, Finanças, p. C3

O investidor estrangeiro está de olho na mobilização do governo para conter a apreciação do real, na perspectiva de crescimento do Brasil e na evolução de alguns setores negociados na BM&FBovespa, a partir do impacto das medidas macroprudenciais adotadas pelo Banco Central como aditivo à política de juros para frear a inflação. Isso vale para os investidores de renda variável e renda fixa que seguem mantendo forte interesse em ativos financeiros do país. A incerteza com as consequências do aumento do compulsório bancário e, principalmente, do ritmo do crédito após o BC praticamente dobrar o requerimento de capital das instituições sobre o financiamento de mais longo prazo às pessoas físicas já impõe cautela entre investidores que vislumbram algum desaquecimento da atividade e do desempenho de importantes segmentos de negócios na bolsa, especialmente bancos e consumo alavancado que inclui veículos e imóveis.

"Tivemos dois anos de forte fluxo de capital de investidores para os mercados emergentes e também para o Brasil. O cenário positivo de longo prazo para o Brasil não mudou, mas em curto prazo poderemos assistir à rotação tática dos investidores para outros mercados que estão se recuperando e, nesse cenário, dúvidas sobre medidas do BC e receio de aumento da alíquota do IOF para conter apreciação do real não ajudam", avalia Frederico Sampaio, diretor de investimentos e responsável pelas operações de renda variável da Franklin Templeton Investimentos do Brasil que alerta para a mudança do cenário atual ante outubro de 2009, quando o governo elevou a alíquota do IOF para 2% para aplicações de estrangeiros. "Quando foi lançado o IOF de 2% sobre a renda variável, chegamos a ter receio de perder investimentos, mas isso não ocorreu, inclusive, porque o investidor em bolsa mira o longo prazo. Mas IOF de 6% ou mais faria muita diferença porque outros mercados estão competitivos."

Marco Aurélio Freire, chefe da renda fixa na Templeton Brasil, reconhece que o investidor estrangeiro gosta do Brasil, mas explica que muitos desses investidores resistem a operações com derivativos que poderiam minimizar o efeito da tributação das aplicações com o IOF. "Os japoneses estão nesse grupo. É um caso clássico de investidor conservador e que já comprou muita renda fixa no Brasil e vem trazendo menos dinheiro. Percebemos, sim, que o IOF tem tido efeito sobre US$ 15 bilhões do total de aproximadamente US$ 100 bilhões que chegam ao Brasil para aplicações anualmente. O IOF de 2% teve efeito temporário. Mas a alíquota de 6%, ou a possibilidade de chegar a 8% como se comenta em mercado, tem caráter mais permanente."

Apesar da repercussão do IOF no fluxo de investimento estrangeiro no Brasil, os executivos não veem a tributação alterando a tendência de apreciação do real. "Mas a tributação mudou o ritmo de apreciação. O Brasil deixou a liderança do ranking entre outras moedas", comenta Sampaio que não acredita que o governo, na sua batalha contra valorização do real, estará focado na renda variável porque o Brasil precisará de recursos de longo prazo para financiar pesados investimentos nos próximos anos. Além disso, explica Sampaio, os estrangeiros adquirem de 70% a 80% das emissões primárias de ações que, neste ano, são estimadas em cerca de US$ 30 bilhões. "O efeito colateral de medidas como essa sobre investimentos em bolsa é reduzir os investimentos na produção necessários para aumentar o produto potencial do país no longo prazo", afirma.

Freire alerta também para os efeitos macroeconômicos de iniciativas para conter a apreciação da moeda. "O impacto do câmbio na inflação não é desprezível. E, assistimos a isso em 2008, quando o câmbio foi fundamental para compensar a pressão das commodities. Agora, as indicações são de que o governo, aí também o BC, precisará fazer escolhas. Quer crescimento de 6% ao ano? Inflação menor? Câmbio sob controle? Não vai ser fácil conseguir tudo isso de uma vez só."