Título: Desconfiança geral
Autor: Braga, Gustavo Henrique
Fonte: Correio Braziliense, 03/08/2010, Economia, p. 12

Pesquisa internacional revela que 62% dos brasileiros acreditam que não teriam atendimento de qualidade e a preço acessível se um familiar adoecesse. Brasil é o 8º mais pessimista entre 22 países

» Apróxima quinta-feira será o Dia Nacional da Saúde.

Porém, há pouco para se comemorar. Uma pesquisa elaborada pelo instituto Ipsos, em parceria com a Reuters, revela que 62% dos brasileiros desconfiam que teriam dificuldade para conseguir serviços de assistência de saúde com qualidade a preço acessível, caso um membro da família ficasse doente.

Quando considerada a média de 22 países pesquisados, o temor cai, atingindo 52% dos entrevistados.

O resultado veio para reafirmar o cenário de insatisfação com o setor no país. Pelo décimo ano consecutivo, as queixas referentes aos planos de saúde lideram o ranking de reclamações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

Os itens mais questionados são negativa de cobertura, reajustes abusivos e má prestação do serviço. Com relação ao preço, a própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é alvo de ações movidas pelo Idec e pelo Ministério Público, cobrando mais transparência quanto aos critérios adotados para definir os aumentos anuais. Apesar de autorizados pela agência reguladora, os reajustes pela forma como são determinados atualmente são abusivos. Não há transparência e são adotados de forma unilateral, com prejuízo para o consumidor, criticou Juliana Ferreira, advogada do Idec.

A pesquisa, com mais de 23 mil entrevistados, mostra que japoneses (85%), húngaros (83%), russos (71%) e sul-coreanos (71%) são os mais inclinados a indicar que seria difícil para um membro muito doente da família conseguir serviços de assistência médica de qualidade a um preço acessível. Na outra ponta, os cidadãos que vivem na Suécia (75%), na Bélgica (70%), no Canadá (69%) e na Holanda (69%) são os mais inclinados a indicar que seria fácil conseguilo. Dos pessimistas, 55% são mulheres e 33% têm menos de 35 anos. Com relação à renda, 56% estão na base da pirâmide social.

Para poucos Informada sobre a pesquisa pela reportagem, logo após marcar uma consulta para o filho Diego Souza, 27 anos, a dona de casa Vera Lúcia de Souza, 63, não se surpreendeu com o resultado.

Quando a pessoa tem dinheiro, tudo fica mais fácil, não é verdade?, brincou. Contudo, Vera se considera uma privilegiada, já que o convênio que usa é subsidiado pelo emprego do marido.

Já o estudante Diego Oliveira Barbosa, 22 anos, viveu na prática as dificuldades impostas por um sistema de saúde caótico.

Quem não tem como bancar um plano de saúde sempre passa por apuros em casos de necessidade médica. Quando precisei fazer uma cirurgia, passei seis meses na fila do SUS até desistir e pagar milhares de reais do próprio bolso em um hospital parti

cular. Não tive escolha, desabafou.

Para Juliana, do Idec, um dos principais problemas hoje é a omissão da ANS quanto à regulamentação dos planos antigos, aqueles cujo contrato foi assinado antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.656/98. A omissão, segundo ela, atinge também os planos coletivos.

O corretor de imóveis Francisco Damázio Filho, 48 anos, conta com seguro-saúde, mas reconhece que o gasto para obter um tratamento adequado é elevadíssimo.

É inviável pagar uma internação em UTI com recursos do próprio bolso. A impressão que tenho é que o pré-requisito para conseguir atendimento pelo SUS é estar morrendo. Então, o jeito é arcar com o plano, lamentou.

Fiscalização A fim de criar regras claras para o processo de fiscalização quanto à atuação das operadoras de planos de saúde, a ANS publicou, na última quinta-feira, a Resolução Normativa nº 223, que dispõe sobre o programa Olho Vivo. A norma reorganiza a agência para intensificar a fiscalização sobre as 39 maiores operadoras de planos de saúde médicohospitalares e odontológicas do país, que juntas atendem a 50% do total de beneficiários da saúde suplementar. Segundo o órgão regulador, o projeto pode ser definido como o conjunto de ações para adequar as operadoras à legislação que regula o setor de saúde suplementar.